Título: Eletrobrás pretende repetir o sucesso da Petrobras no exterior
Autor: Cláudia Schüffner
Fonte: Valor Econômico, 15/03/2006, Empresas &, p. B9

Energia Estatal federal estuda alterações na lei de 1961 que proíbe sua atuação fora do território brasileiro

O presidente da Eletrobrás, Aloisio Vasconcellos, está apostando quase todas as suas fichas na internacionalização da estatal, embora a lei que criou a empresa não permita atuação no exterior. Por isso aguarda a modificação no texto da lei 3.890, de 25 de abril de 1961, onde são listadas as atribuições da Eletrobrás com o grifo "no território brasileiro". "Nós temos um pênalti a nosso favor para bater, mas existe uma lei que não permite. Depois (de mudada a lei) haverá uma transição. Depois, quando chegar a hora da Eletrobrás Internacional vamos marcar um belo gol", diz Vasconcellos, que prevê a criação da empresa em julho. O executivo explica que a idéia inicial não é fazer grandes investimentos como, por exemplo, em aquisições, mas sim vender sua experiência e conhecimentos em engenharia e montagem de grandes obras. Os investimentos ficariam por conta das empresas brasileiras com quem pode fechar parceiras. A iniciativa parece uma reação da companhia à perda gradual de seus domínios na última década, com a transferência da operação para o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e o planejamento para a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Entre os projetos onde a Eletrobrás já recebeu sondagens para parcerias, mencionadas pelo presidente, estão a coordenação de uma usina no rio Lempa, em El Salvador; uma linha de transmissão da hidrelétrica argentina El Chocón até o Chile; e uma termoelétrica na Bolívia. Vasconcellos explica que os recursos para os investimentos no exterior devem vir, em grande parte, dos governos que fizeram consultas e das empresas brasileiras dos setores de construção, engenharia e montagem, todas interessadas em parcerias com a estatal. O executivo lembra ainda que os negócios externos da companhia devem alavancar a internacionalização de outros produtos brasileiros, como turbinas, geradores, transformadores e tubulações. Todos com possibilidade de serem exportados com créditos do Finame, linha do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para financiamento de máquinas e equipamentos. "A hipótese da internacionalização é boa e avança. E depois que começar a trabalhar no exterior, numa etapa seqüencial, brevemente, vamos criar a empresa Eletrobrás Internacional, nos moldes da nossa co-irmã Petrobras", afirma o presidente da estatal elétrica. Mas ele ressalta em seguida que primeiro será necessário ganhar liberdade para atuar e a partir daí, com o tempo, criar o braço internacional. E nessa fase inicial, explica, a Eletrobrás pretende usar instalações e escritórios do Ministério das Relações Exteriores e da Petrobras no exterior. A intenção de partir para a internacionalização é vista com alguma dúvida no mercado, onde é conhecida a necessidade de caixa do grupo para arcar com novos investimentos no Brasil. Um exemplo são as usinas compradas por Furnas no leilão de energia em dezembro, cujo financiamento de 100% pelo BNDES ainda depende de liberação, por meio de uma ata, do Conselho Monetário Nacional (CMN), como admitiu o presidente da holding. O entrave, nesse caso, é o limite de empréstimos do banco para empresas estatais. Vasconcellos mostra confiança mesmo quando questionado sobre a capacidade de fazer investimentos externos da companhia. Ele lembra que as empresas do grupo - Furnas, Eletronorte, Chesf, Eletronuclear, Eletrosul e a também gaúcha Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE) - programam investimentos da ordem de R$ 5 bilhões em 2006. No ano passado, algumas não conseguiram executar o orçamento, que somava R$ 4 bilhões. A migração das ADRs para o nível 2 na bolsa de Nova York, prevista para junho, é uma das medidas listadas por Vasconcellos para a Eletrobrás "ganhar massa empresarial financeira" e visibilidade internacional que pode viabilizar captações no mercado internacional. Para isso já existe um grupo com mais de 100 técnicos preparando as informações para a adequação à Lei Sarbanes-Oxley. No campo doméstico, o grupo Eletrobrás está pronto para disputar o segundo leilão de energia nova, dia 12 de junho, repetindo a fórmula de parcerias minoritárias (de até 49%) com grupos privados. Vasconcellos admite interesse não apenas nas usinas Mauá, Dardanellos, Cambuci e Barra do Pomba como também nas hidrelétricas Jirau e Santo Antônio que compõem o chamado complexo do rio Madeira. "As duas usinas do Madeira são hoje o nosso doce de coco", diz mineiramente, adiantando que além da Odebrecht já houve manifestação de interesse de outros parceiros privados. Depois de comprar participação da Vale do Rio Doce em Foz do Chapecó, a Eletrobrás negocia a entrada em outras duas hidrelétricas já com licença ambiental: Serra do Facão e Salto Pilão. Com tantos projetos em carteira, Vasconcellos negou que a Eletrobrás esteja no consórcio Energia Rio, liderado pelo empresário Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, para compra da Light. Com isso descartou os rumores sobre a adesão da estatal a esse grupo, junto com os fundos Previ, Petros e Valia. Já sobre as denúncias de "empreguismo" na Lightpar publicadas pela "Folha de S. Paulo", a Eletrobrás informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que a empresa já teve sua estrutura reformulada, com a redução dos funcionários de 28 para 13 que têm a incumbência de acompanhar ações judiciais e os contratos de aluguel de fibras óticas. Ainda segundo a assessoria, também são empregados onze assessores de fora do quadro permanente com salário total da ordem de R$ 110 mil. Segundo a estatal, "nesse momento não é conveniente a incorporação da Lightpar". O objetivo, segundo fonte da empresa, é evitar incorporar ao balanço dívidas de aproximadamente R$ 600 milhões.