Título: Na crista da onda
Autor: Adriana Cotias
Fonte: Valor Econômico, 15/03/2006, EU &, p. D1

Investidor estrangeiro impulsiona os setores dependentes de crédito na bolsa

Eletroeletrônicos, construção, energia elétrica, comércio e bancos têm sido os setores de melhor desempenho na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Segundo levantamento da Economática para o Valor, as ações pertencentes a esses ramos apresentam valorização média de 30% neste ano até o dia 10, em comparação aos 10,3% do Índice Bovespa (Ibovespa), principal termômetro do mercado acionário brasileiro. Os ativos foram puxados principalmente pelo fluxo externo, o mesmo capital que provocou estragos na bolsa nos últimos dias, mas que, ao que tudo indica, ainda mantém certo apetite pelos emergentes. Tem sido o olhar estrangeiro sobre o Brasil que vem beneficiando papéis ligados a atividades comumente alavancadas pelo crédito, como varejo, construção civil e bens de consumo. Embora a conjuntura, que inclui juros e risco declinantes, siga favorecendo negócios dependentes da oferta de recursos bancários, a avaliação é de que a recente disparada desses setores na bolsa, já descontado o tombo recente, possa ter levado as ações a preços excessivos. Daqui para frente, a percepção é de que empresas com capacidade operacional para ganhar valor no tempo é que vão merecer um pouco mais de atenção. Para o estrategista de Renda Variável do BNP Paribas, Eduardo Miziara, há oportunidades em petróleo, mineração, petroquímica e ainda em bancos. "Os estrangeiros compraram a idéia de que o Brasil terá um crescimento sustentável nos próximos cinco anos e direcionaram o mercado para setores que vão bem quando há o aumento do consumo interno", diz. "Mas a história nos mostra que há um grau de incerteza grande em apostar muito no futuro, pois o país viveu as suas fases de 'stop and go' e, no longo prazo, são as ações de empresas que têm crescimento para mostrar que trazem bons resultados." Na sua lista de recomendações está, por exemplo, Petrobras, que tem apresentado crescimento contínuo na produção e com os preços do petróleo num nível rentável. A Vale do Rio Doce é outra eleita, principalmente após a depreciação recente na bolsa. Embora haja dúvidas sobre o percentual a ser usado no reajuste anual de contratos, a mineradora tem encomendas firmes pelos próximos 10 anos e se beneficia da forte demanda da China e da Índia. Na área petroquímica, Miziara sugere, para uma aposta de curto e médio prazo, Copesul e Braskem, ações muito castigadas pela escalada das cotações do petróleo e que ficaram baratas. O setor elétrico, depois de ganhar, na média, 30,2% neste ano ainda é uma boa opção, segundo o chefe de análise da Link Corretora, Marcos Elias. "Como há a previsão de que pode faltar energia em 2007, 2008, há a necessidade de construir novas geradoras, que precisarão ser remuneradas com aumento de tarifas", diz. A Merrill Lynch, em relatório distribuído no dia 7, elevou o preço alvo de Cemig, CPFL, Eletropaulo e AES Tietê. Para os analistas Frank McGann e Felipe Real, o novo modelo regulatório reduziu os riscos do setor no Brasil e aumentou o potencial de ganhos das empresas, especialmente para as geradoras. O chefe de análise da Coinvalores, Marco Aurélio Barbosa, ainda cita que pesa a favor das elétricas o câmbio valorizado, já que algumas empresas compram compulsoriamente a energia de Itaipu, cotada em dólar, e também têm parte do endividamento em moeda estrangeira. "Além disso, a queda do juro impulsiona a atividade econômica e a demanda por energia", diz. Já no setor de varejo, Barbosa considera que a maioria das ações já está muito bem avaliada na bolsa. Mas ele mantém indicação de compra para Lojas Renner, que tem investido na expansão da rede e pode ganhar fatias no comércio de vestuário. "As cinco maiores do varejo têxtil detêm só 8% do mercado e há uma tendência à concentração entre as grandes redes." No setor bancário, o analista Daniel Doll Lemos, da Socopa, sugere a compra de Banco do Brasil, Itaúsa e Unibanco e indica a manutenção de Bradesco. "O crédito continuará sendo a principal fonte de crescimento e novas associações com o varejo não podem ser descartadas", diz. Os riscos, cita, são um possível incremento da inadimplência. Como os bancos são conservadores nesse campo, haveria o aumento das provisões para créditos de liquidação duvidosa, com algum impacto nos lucros. E em pleno ano eleitoral, setores ligados à infra-estrutura, em geral fomentados por gastos públicos, também tendem a dar bons frutos, avalia Elias, da Link. No seu mapa de recomendações estão Gerdau e Randon. E nas áreas privilegiadas pelo consumo estão Guararapes, Alpargatas e Localiza. A área de construção civil, por sua vez, que subiu 38% só neste ano, foi claramente influenciado pelos lançamentos de ações, com a estréia da Gafisa e da Company e pelo aumento de capital da Rossi.