Título: Empresários temem "vitória" da proposta da Fazenda
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2006, Brasil, p. A3

Os empresários brasileiros estão preocupados com os sinais de que o governo prepara uma abertura unilateral da economia ao invés de optar por uma redução negociada das tarifas de importação na Rodada Doha. Em conversas recentes com o setor industrial, funcionários do Ministério da Fazenda defenderam que uma medida como esta contribuiria para conter a valorização excessiva do real e aumentaria a competitividade da economia. Esses impactos macroeconômicos - detalhados pela equipe econômica - seriam muitos pequenos no caso de uma abertura negociada pelo país na Organização Mundial de Comércio (OMC), pois esta pode demorar 10 anos para ser implementada. De acordo com lideranças do setor empresarial, o Ministério da Fazenda defende que a queda das tarifas estimulará a importação, o que aumentaria o fluxo de dólares que sai do país e reduziria a pressão sobre o câmbio. O real valorizado preocupa o governo porque estaria desestimulando as empresas a investir no país. "Quem paga a conta do câmbio? O setor financeiro com a queda dos juros? Ou o setor produtivo com o corte das tarifas?", questiona Roberto Giannetti da Fonseca, diretor de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Ele defende que a valorização excessiva do câmbio é provocada pelos juros altos, que atraem capitais especulativos. Já as importações não aumentariam por conta do fraco crescimento da economia e pelo aumento da carga tributária sobre as compras externas após a mudança nas regras do PIS e da Cofins. Durante reunião realizada na Fiesp na última sexta-feira, técnicos da Fazenda defenderam que a queda das tarifas pode ajudar a desvalorizar o real. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também argumentou que a queda das tarifas auxiliaria a conter a alta do câmbio durante encontro com lideranças industriais em Recife. "Explicamos ao presidente que os exportadores já estão em dificuldade e a redução de tarifas vai prejudicar ainda mais o setor industrial", afirmou Rodrigo de Rocha Loures, presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep). "A Fazenda está pedindo um cheque em branco", diz o diretor-executivo do Institutos de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida. Ele, que também esteve no encontro na Fiesp, diz que o governo não especificou qual seria o tamanho do corte das tarifas, nem qual seria o período concedido ao setor industrial para se adaptar. Gomes de Almeida diz que a Fazenda "vende ilusão", pois o corte das tarifas pode não contribuir para incentivar as importações. Ele diz que a intensiva valorização do real nos últimos dois anos não conseguiu estimular as compras externas, dado o fraco crescimento da economia. "A proposta é inoportuna, já que queremos avançar na Rodada Doha. Não deveríamos nos antecipar ao mundo mais uma vez", diz Osvaldo Douat, presidente da Coalizão Empresarial Brasileira (CEB), coordenada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Ele se refere à abertura comercial do início dos anos 90. "Não faz sentido que, em um momento como esse, o governo opte por um movimento unilateral. Perdemos margem de manobra nas negociações", concorda Cláudio Vaz, presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp). O presidente do Institutos de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), Marcos Jank, explica que as negociações da OMC ocorrem com base nas tarifas consolidadas pelos países junto ao órgão e não nas tarifas efetivamente aplicadas. Portanto, um corte nas tarifas aplicadas do Brasil não mudaria o parâmetro da negociação. "Mas é um claro sinal de que existe espaço para cortar as tarifas consolidadas. Por isso, acredito que o Brasil deve negociar queda de tarifas na Rodada", afirma. O Icone auxiliou na preparação do seminário realizado na Fiesp. Jank diz que a proposta era discutir a redução das tarifas no âmbito da Rodada Doha.