Título: Perfil político de Alckmin ainda é uma incógnita
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2006, Opinião, p. A12

O primeiro capítulo da história da eleição para a Presidência foi concluído ontem, com a indicação do governador paulista, Geraldo Alckmin, como candidato do PSDB - a convenção partidária será uma formalidade - para disputar o Planalto contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Alckmin deixou para trás o tucano favorito nas pesquisas de opinião, o prefeito José Serra, e terá contra si um adversário com a popularidade revigorada, em ascensão, e que detém a máquina federal nas mãos. Será necessário muito mais que determinação para que Alckmin vença. Até outubro, porém, tudo pode acontecer e o jogo eleitoral está ainda muito longe de uma definição. Apoiado por boa fatia do empresariado paulista, Alckmin ainda é uma incógnita. Fundador do PSDB, ele não faz parte do grupo que reúne os tucanos mais influentes, como Fernando Henrique, José Serra ou Tasso Jereissati. Curiosamente, só conseguiu sagrar-se candidato contra Serra movendo-se com habilidade em uma máquina partidária sabidamente informe e dominada por caciques que a priori não o apoiavam. Igualmente, a equipe mais próxima do governador atua discretamente com competência nos bastidores. À luz do dia, seu matiz político é indefinido. A eficaz gestão de Alckmin no Estado é um trunfo, mas é insuficiente para criar uma marca distintiva. O governador deu continuidade à política de austeridade fiscal de seu tutor, Mário Covas, e abriu um bom espaço para os investimentos que, no entanto, demoraram a se materializar. Ele deu início às Parcerias Público-Privadas, que são iniciativa do governo federal, e foi um dos que mais se empenharam em reduzir a carga tributária para as empresas, comprovando, acertadamente, que as receitas do Estado só teriam a ganhar com isso. Mostrou-se um administrador competente, algo que deve alardear em sua campanha, mas cujo apelo eleitoral é sabidamente restrito. O governador é praticamente um desconhecido para o eleitor comum dos demais Estados. Nada disso é obstáculo intransponível, em um país em que a vitória de "azarões" é mais regra que exceção. É possível supor que Alckmin procurará recompor a unidade do partido, após ter dado na prática um xeque-mate no jogo fechado do triunvirato tucano, que prometera a Serra uma sagração garantida e sem consultas. Não é uma tarefa fácil. Por outro lado, não será um grande transtorno arrastar o PFL para uma dobradinha na chapa presidencial. Alckmin é um político experiente, articulado e pode surpreender quem se aferra a sua imagem de líder pouco carismático. Ao longo da campanha ele também terá de se desfazer das impressões deixadas por sua escolha como candidato tucano mais fraco nas pesquisas - a de que o PSDB "jogou a toalha" e desistiu de disputar a sério a Presidência. Alckmin já insinuou que vai "morar" no Nordeste, um eleitorado que dificilmente arrebatará de Lula. Ele cativa a classe média e alta paulista, que nunca morreram de amores por Lula e que se afastaram dele após o escândalo do mensalão que achincalhou o PT, mas terá de ir além e disputar os rincões e o eleitorado pobre, sem o qual não passará no teste das urnas. O grande desafio de Alckmin, que seria o de qualquer candidato tucano, é apresentar uma plataforma eleitoral que claramente seja percebida como diferente da do atual governo. O presidente Lula termina seus quatro anos de mandato deixando a economia em melhor forma do que a que recebeu após oito anos de gestão tucana - em grande parte, por seguir as receitas do PSDB. Alckmin acredita no poder das reformas para o desenvolvimento, tese que Lula também defende. A bandeira da ética, que já empunhou, pode lhe render alguns pontos, mas provavelmente não muitos. Apesar do mensalão, a popularidade de Lula está em alta. E o slogan de "gerente eficaz" tem validade limitada na falta de um programa forte. Asseverar que faria melhor o que Lula está fazendo pode ser pouco cativante para o eleitorado quando a economia está crescendo. Há tempo de sobra para que esses buracos na estratégia tucana sejam preenchidos e Alckmin construa uma via eleitoral viável. Serra era um adversário mais que conhecido de Lula e Alckmin, político de reconhecidas virtudes, é o imponderável. Embora não seja o tucano mais forte nas pesquisas, ele é um candidato bastante competitivo.