Título: Em um dígito, juro real está adiante do BC
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2006, Finanças, p. C2

O juro real projetado para os próximos 12 meses caiu ontem a um dígito. A taxa nominal do swap de 360 dias recuou ontem de 14,90% para 14,85%. Descontado o IPCA de 4,42% estimado para o mesmo período pela pesquisa Focus do Banco Central, o contrato embute juro real de 9,99%. Trata-se do primeiro juro real abaixo de 10% desde os 9,95% do dia 19 de julho de 2004. De lá até anteontem, durante 19 meses, a taxa acima da inflação superou 10%. O menor juro real do governo Lula, de 8,55%, foi registrado no dia 13 de janeiro de 2004. Taxas de um dígito em 2004 foram determinantes para a expansão de quase 5% contabilizada pelo PIB naquele ano. O mercado monetário não esperou a divulgação, hoje cedo, da ata da última reunião do Copom para derrubar o juro para um ano. Para analistas, a trajetória firme de queda dos juros longos negociados no mercado futuro da BM&F exerce pressão para que o BC intensifique a flexibilização monetária. Na opinião do diretor da NGO Câmbio, Sidney Nehme, o mercado está indo mais rápido que o Copom. "A queda do juro real para a casa de um dígito será, sem dúvida, um fato indutor do apressamento de cortes por parte do Comitê", diz o corretor. A baixa do swap 360 foi muito intensa. A taxa - piso referencial para o custo do crédito, portanto, essencial para a retomada da economia - tombou de 16,40% para 14,90% do início do ano para cá, ou seja, em apenas 50 dias úteis. Mas o Copom tem o poder de elevar esse juro real se julgar que o declínio tem sido exagerado e potencialmente perigoso para a inflação. Basta endurecer o tom das costumeiras advertências postas nas atas do Copom. Se, ao contrário, a opção for por abrandar o texto, sinalizando a ampliação para um ponto percentual do tamanho do corte da Selic, o mercado irá buscar juros reais ainda mais baixos. As condições macroeconômicas internas e externas se mostram favoráveis ao aprofundamento do ciclo de baixa.

Taxa acima da inflação para um ano cai a 9,99%

O IGP-10 relativo a março, divulgado ontem pela FGV-RJ, apurou deflação de 0,03%, quando havia constatado inflação de 0,17% em fevereiro. A inflação, apesar dos estímulos vindos da expansão dos gastos públicos, está amordaçada pelo câmbio valorizado. O dólar experimentou ontem sua quinta queda consecutiva. A moeda fechou cotada a R$ 2,1220, em retrocesso de 0,18%. O declínio só não é mais acentuado porque os bancos estão mantendo posições compradas. Como o fluxo cambial se sustenta fortemente positivo - em março, até o dia 10, a conta comercial exibiu superávit de US$ 1,98 bilhão e a financeira de US$ 1,42 bilhão - as instituições absorvem o excesso de dólares já que o BC desacelerou suas intervenções cambiais. Ele limita-se a fazer um discreto leilão de compra de moeda às 15h30, apenas para aparar excessos de liquidez. Ontem, ele aceitou 12 propostas, pelo preço de R$ 2, 1240. Os bancos sustentam posições compradas em dólar, o que exerce um bloqueio natural a preços mais baixos do que R$ 2,10, também por dois outros fatores. Apesar da calmaria dos últimos dias, o mercado externo persiste volátil e contraditório. Mesmo com os juros dos treasuries de 10 anos tendo avançado de 4,69% para 4,75%, as bolsas de Wall Street fecharam com boas altas. O Dow Jones subiu 0,52% e o Nasdaq, 0,69%. O segundo fator é doméstico. O discurso que o candidato do PSDB à presidência, Geraldo Alckmin, começou a adotar para reverter as pesquisas amplamente favoráveis a Lula - de oposição à atual política econômica - pode trazer ruídos políticos aos mercados. Os analistas temem que, se a retórica contra o câmbio baixo e o juro alto conseguir inverter o quadro eleitoral, Lula será tentado a mudar já alguns postulados básicos da economia. E é obrigação dos tesoureiros estar preparados para isso. O declínio dos juros não se restringiu ao swap 360 dias. No pregão de DI futuro, a posição mais negociada (R$ 19,63 bilhões), para a virada do semestre, caiu de 15,80% para 15,74%. O CDI previsto para a virada do ano recuou de 15,01% para 14,96%.