Título: Fretes marítimos caem até 30%
Autor: Vanessa Jurgenfeld e Paulo Henrique de Sousa
Fonte: Valor Econômico, 17/03/2006, Empresas &, p. B1

Logística Exportações do país reduziram e armadores dispõem de maior oferta de navios

A maior oferta de navios e o menor volume de exportação estão derrubando os preços dos fretes marítimos entre o Brasil e outros países. Neste início de ano, período de vencimento de boa parte dos contratos, os preços caíram entre 20% e 30%. "Na nossa empresa, todos os contratos com armadores foram reajustados para baixo", diz Csele Braga, diretora comercial da Interseas, empresa de assessoria em comércio exterior de Florianópolis que atende a setores exportadores como o de carnes e o têxtil. "Existe uma guerra saudável neste momento entre os armadores", afirma a executiva. Ela destaca que os preços dos embarques para a China, de onde o Brasil importou muitos produtos, por exemplo, caíram 40% nos últimos meses. E para o porto de Roterdã, cerca de 30%. O cenário é bem diferente daquele de 2004. No auge das exportações, quando havia muito mais procura do que oferta de espaço em navios, os preços subiram rapidamente. Como havia muito mais exportação do que importação, os armadores cobravam até para trazer contêineres vazios para a exportação. O aumento das importações acaba trazendo mais navios ao país. O diretor da Allink (empresa de agenciamento de frete marítimo), André Gobersztejn, resume o que está acontecendo: simplesmente a oferta de serviços de frete aumentou muito desde a segunda metade de 2005, quando ficaram prontos os grandes navios que os armadores começaram a construir quando a demanda estava alta, entre 2003 e 2004. E ele estima que os preços dos fretes devem cair ainda mais 15% até o fim deste ano. A Allink faz a intermediação entre os armadores e os exportadores, principalmente aqueles que têm um volume não muito grande de carga. A empresa faz o trabalho de "consolidação" de pequenas cargas de vários clientes, conseguindo um preço melhor com os armadores do que se o exportador negociasse diretamente com o armador. "Estou recebendo ligações de armadores que nunca tinham ligado antes em busca de um ou dois contêineres", informa. Segundo ele, isso é um sinal claro de que as grandes companhias de navegação estão brigando por participação de mercado, o que reduz ainda mais o valor do frete. "Todo mundo está neste momento olhando onde pode cortar custos. Hoje, na maior parte das rotas existe excesso de espaço", explica Julian Thomas, diretor-superintendente da Aliança Hamburg Süd, um dos maiores armadores que atuam no país. Segundo ele, a ociosidade era de 10% nos navios, em 2005, e passou para 15% neste início de ano. E as previsões para setores exportadores não são nada boas, como o do complexo da carne, que hoje sofre com o real forte e começa a sentir o impacto do menor consumo de frango na Europa por causa da gripe aviária. Segundo o gerente de logística corporativa da Eliane, de Santa Catarina, uma das maiores indústrias cerâmicas do país, Waldir Cardoso, os fretes com saída dos portos catarinenses caíram entre 20% e 30% na comparação 2006 com 2004, tanto para Europa quanto para os Estados Unidos. "Essa queda é fundamental para recompor as margens nas exportações. Mas só com ela não é possível recompor tudo", destaca. Em São João Baptista, pólo calçadista em Santa Catarina, a oferta dos armadores ficou maior. Segundo o diretor-executivo do Sinca (sindicato das indústrias), Rosenildo de Amorim, os armadores estão ligando para as empresas como antes nunca fizeram. "Mas, mesmo com as ofertas, não temos como aumentar tanto o volume por conta do câmbio", acrescenta. A redução dos preços dos fretes não chega a entusiasmar as indústrias exportadoras, porque perdem com a valorização do real frente ao dólar. Além disso, outros custos de exportação, como os fretes aéreos, despachantes aduaneiros e taxas portuárias, continuam os mesmos. Lauri Volpi, agente de exportação que atua no setor moveleiro, faz uma outra ponderação. Segundo ele, a maior parte dos custos do frete é paga muitas vezes pelo importador do produto, e ele é que acaba beneficiado. "O importador até pode compensar o frete mais barato com um aumento de compras, ou melhor, aceitar um preço mais alto, mas isso acontece raramente." Mas houve ganhos, sem dúvida. As empresas não pagam mais para trazer contêiner vazio de outros países e o tempo de entrega das mercadorias foi reduzido, já que os portos não estão congestionados. Com isso, cai também o custo de armazenagem. A Kavo, indústria catarinense de equipamentos odontológicos, ainda não viu a redução de preços, mas diz que há uma sinalização de queda no mercado. Uma entrega para o México, por exemplo, que demorava em média 45 dias, passou a ser feita em 35 dias. "Muitos navios que iam para o México deixavam de parar em alguns portos porque estavam cheios, gerando atrasos em entregas", explica o presidente da Kavo, Luciano Eric Reis. Já a Eliane está entregando contêiner nos Estados Unidos em, no máximo, 20 dias. No auge do período exportador, os clientes chegavam a esperar 50 dias. Mas nem todas as indústrias sentem melhora nas operações de comércio exterior. As que exportam carnes e precisam de contêineres refrigerados praticamente não sentem redução. Isso porque o Brasil pouco importa esse tipo de produto. Como não chegam contêineres com mercadoria importada, não há excesso de oferta de espaço para as chamadas cargas "frigorificadas". O diretor de logística da Coopercentral Aurora, maior cooperativa de Santa Catarina, Luiz Temp, diz não ver melhorias e reclama da falta de compensação de custos, mesmo quando aumenta a escala de uso dos fretes.