Título: Bolívia preocupa multinacionais, o que pode favorecer a Petrobras
Autor: Cláudia Schüffner
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2006, Internacional, p. A13

Mesmo depois da soltura, sob fiança, dos principais executivos da Andina, subsidiária da Repsol na Bolívia, a impressão das empresas instaladas no país é de um momento delicado, que inibe decisões de investimentos das multinacionais numa fase crítica para o fornecimento de gás ao Brasil. As acusações de fraude tributária feitas contra a Andina também atingiram anteriormente a Chaco, que é controlada pela BP e por um grupo argentino. Longe de estar próxima de um desfecho, o panorama político ficou mais turvo depois que o procurador-geral da Bolívia, Pedro Gareca, solicitou à Corte Suprema autorização do Congresso para abrir processo contra quatro ex-presidentes: Gonzalo Sánchez de Lozada (1993-1997 e 2002-2003), Jorge Quiroga (2001-2002) e Carlos Mesa (2003-2005) e Eduardo Rodríguez (2005-2006). Gareca pede que os três primeiros sejam julgados pela assinatura de 107 contratos com 22 empresas petrolíferas estrangeiras que atuam no país. E que Rodríguez seja julgado pela devolução de 28 mísseis para que os EUA os desativassem. Esse tempero extra no caldo político boliviano preocupa as empresas interessadas em ampliar investimentos no país para elevar a oferta de gás para o Brasil, justo no momento em que a Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia Brasil (TBG) se prepara para ampliar o Gasoduto Bolívia Brasil (Gasbol). Na segunda-feira passada, a TBG iniciou o processo de consulta pública para expansão do gasoduto, que hoje tem capacidade de transportar 30 milhões de metros cúbicos de gás por dia. Esse volume é totalmente contratado pela Petrobras, que também controla o gasoduto. Com o chamado "concurso aberto", outras empresas podem investir para garantir um pedaço maior do mercado brasileiro. A expansão interessa particularmente às companhias que têm reservas de gás na Bolívia, que por sua vez dependem de pesados investimentos em desenvolvimento da produção. Até agora, as maiores interessadas eram a BG (que junto com a Shell controla a Comgás), a francesa Total e a própria Repsol. Mas no mercado a avaliação de fontes da indústria ouvidas pelo Valor é que mais uma vez a Petrobras deve sair na frente porque deve ser a única a correr o risco do investimento no atual cenário boliviano. Sem contratos válidos e sem saber o teor dos novos contratos (que serão regidos pela nova Lei de Hidrocarbonetos), essas empresas deverão ter dificuldade de fechar o negócio com a TBG. Além disso, a expectativa é que a Petrobras contrate logo até 12 milhões de metros cúbicos adicionais para se antecipar à Lei do Gás brasileira. Dois projetos tramitam no Senado (do senador Rodolfo Tourinho) e na Câmara (do governo), sendo que o de Tourinho propõe uma limitação da participação estatal na ampliação dos gasodutos existentes. As empresas interessadas em reservar espaço adicional no gasoduto têm até sexta, dia dia 24, para enviar propostas informando o volume que querem poder transportar. Com base nas informações dos interessados, a TBG fará os cálculos até determinar um volume que seja técnica e financeiramente viável, para então iniciar as obras. Dependendo do aumento de volume (de 4 milhões a 12 milhões de metros cúbicos/dia adicionais) e do trecho, as estimativas de custo da própria TBG variavam de US$ 225 milhões a US$ 985 milhões, caso a expansão seja feita somente até São Paulo. Se for estendido até o Sul esse valor deve aumentar de US$ 89 milhões a US$ 489 milhões.