Título: Palocci fica no cargo, mas oposição eleva tom das críticas
Autor: Cristiano Romero e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2006, Especial, p. A18

Congresso Ministro tem o apoio do governo e do PT para permanecer no ministério até fim do mandato

A oposição decidiu questionar o governo sobre a quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa. Informações publicadas no fim de semana pela revista "Época" mostram que o caseiro, que testemunhou semana passada contra o ministro Antonio Palocci na CPI dos Bingos, teria recebido R$ 38.860 em depósitos feitos, nos últimos três meses, em sua conta na Caixa Econômica Federal. O governo desconfia que Francenildo recebeu o dinheiro para fazer acusações a Palocci. O vazamento das informações bancárias do caseiro revoltou a oposição. O presidente do PPS, deputado Roberto Freire (PE), informou ontem que seu partido entrará com representação criminal, no Ministério Público, em Brasília, contra a quebra ilegal do sigilo bancário de Francenildo. A CPI dos Bingos exigirá, por sua vez, explicações da Caixa Econômica Federal, banco estatal que é vinculado ao Ministério da Fazenda. Senadores da oposição prometem ir hoje à tribuna interpelar o governo. "Hoje é o direito do caseiro a ser violado. Amanhã pode ser o de qualquer outro cidadão. Basta ser inimigo do governo para se tornar alvo de um Estado cujas instituições estão sendo usadas para perseguir, como ocorre em regimes ditatoriais", afirmou o deputado Roberto Freire em nota oficial. "Estamos ou não em um estado de direito? Como é que uma instituição financeira do governo, como a Caixa, e quem sabe o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), ambos subordinados ao ministro que é alvo do desmentido de Francenildo, quebram sorrateiramente o sigilo bancário de um trabalhador e repassam toda a sua movimentação bancária à imprensa? A intenção óbvia é desqualificar um homem que desmentiu o ministro Palocci. Para isso se ultrapassaram todos os limites do respeito aos direitos individuais, rasgaram as leis, desprezaram a democracia; usaram o Estado para cometer crime em prol de um ministro, de um partido." "Há meses a CPI dos Bingos tenta quebrar o sigilo bancário de Paulo Okamotto (presidente do Sebrae) e não consegue", observou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). No início de 2003, Okamotto pagou quase R$ 30 mil de uma dívida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o PT. A CPI tentou, sem sucesso, quebrar o sigilo de Okamotto, que é amigo do presidente, para saber como ele conseguiu o dinheiro. "Com que cara ficam os correntistas da Caixa depois desse vazamento de dados bancários?", indagou Virgílio. "Fazem essa devassa ilegal porque trata-se de um trabalhador humilde, que presenciou fatos que abalam, desmascaram o governo", acrescentou Freire. Na representação criminal, o PPS também exigirá explicações da Polícia Federal, que teria, segundo o partido, solicitado o cartão bancário do caseiro quando ele esteve na sede da instituição para depor. No governo, a ordem do presidente Lula é defender Palocci. O ministro permanecerá no cargo. Segundo dois ministros ouvidos pelo Valor, Palocci descartou a possibilidade de se desincompatibilizar do cargo para disputar as eleições deste ano. Pelas regras, ele teria que fazer isso até o próximo dia 31. Ao contrário do que aconteceu nas crises anteriores que o atingiram, o ministro desta vez não pediu demissão do cargo. Pela primeira vez, tem também o apoio de todo o ministério e do PT. "Se depender do presidente, enquanto as denúncias estiverem no campo pessoal, não há qualquer hipótese de Palocci deixar o ministério", assegurou o ministro da coordenação política, Jaques Wagner. O governo continua com o discurso ensaiado de que os ataques da oposição têm um viés eleitoral. "Eles estão vendo que as pesquisas nos colocam à frente. Se continuarmos assim e com as perspectiva de crescimento da economia, o que resta a eles é tumultuar. Arrumaram um jeito agora", acusou Wagner. Para o ministro, se "eles baterem três, quatro, cinco dias e Lula deixar claro que não vai mudar o ministro, vão acabar parando". "No meio dessa guerra toda, estamos nos reagrupando", celebrou ontem um ministro. "Vamos para a guerra!" Ir para a guerra, segundo esse ministro, é jogar com as supostas armas da oposição. Para o governo, o depoimento do caseiro contra Palocci foi uma "armação" feita pela oposição. Como Francenildo alegou que o dinheiro depositado em sua conta veio de seu pai, o empresário piauiense Eurípedes Silva, o governo suspeita que um político daquele Estado estaria por trás da suposta manobra. O que complica a tese do governo é que, em entrevista ao jornal "O Estado de São Paulo", a mãe do caseiro, Benta Maria dos Santos Costa, teria confirmado que Eurípedes Silva é pai de seu filho e que ele teria depositado o dinheiro por ter fechado um acordo, reconhecendo a paternidade e, assim, evitando sofrer uma ação judicial. "É uma guerra. Não vai parar. A oposição não vai recuar. Eles querem nos tirar do poder à tapa, mas ninguém ganha eleição só jogando lama", disse um ministro.