Título: Reação moderada ao ruído político
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2006, Finanças, p. C2

Quase ninguém no mercado financeiro irá comemorar uma eventual demissão do ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Mas ninguém se surpreenderá. A sua permanência não é tida mais como imprescindível para a preservação dos postulados conservadores da atual política econômica. Não desagradam os dois nomes mais cogitados para sucedê-lo, o do secretário-executivo da Fazenda, Murilo Portugal, e o do secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. Imagina-se que, com Levy, a dinâmica do processo de queda do juro poderá ser acelerada. Mas a intensificação do recuo da Selic não provocará descontentamento, nem fuga de capital externo. O dólar subiria, o que não seria ruim para os bancos, já que iniciaram a segunda quinzena de março carregando posições compradas de US$ 2,5 bilhões. O mercado já está bem preparado para a substituição do ministro. Mas a crença é de que Lula irá mantê-lo lá enquanto for possível. O motivo é político: sem Palocci, Lula perde o último escudo contra denúncias. Passará a ser o alvo único das baterias da oposição. A análise predominante nas tesourarias de bancos é a de que o Planalto precisa garantir a permanência de Palocci no Ministério para que não perca as imunidades relativas ao cargo. A perda das prerrogativas legais poderá estimular ações retaliatórias. O que Lula menos precisa nesse momento são cenas policiais constrangedoras tendo Palocci como protagonista. Os tesoureiros trabalham com dois cenários. Se Palocci continuar, sua posição ficará cada vez mais enfraquecida. Suas aparições públicas, sem discursos e articulações políticas não terão mais a força de antigamente. Com a fragilização de Palocci, crescerão o poder e a ortodoxia do Banco Central. Ele será a âncora da travessia para um novo governo e um novo ministro da Fazenda. Se Palocci cair, o BC tende a se enfraquecer. O novo ministro buscará sobressair-se para garantir a sua presença num eventual segundo mandato de Lula. Em nenhuma hipótese - nem em uma improvável indicação do senador Aloizio Mercadante para a Fazenda -, há qualquer preocupação com a possibilidade de adoção de medidas heterodoxas.

Após seis quedas, dólar sobe a R$ 2,1260

A piora registrada por todos os segmentos do mercado financeiro na sexta-feira foi muito leve. O dólar interrompeu uma seqüência de seis quedas e fechou em alta de 0,75%, a R$ 2,1260, nada capaz de caracterizar uma turbulência. No mercado futuro de juros da BM&F subiram apenas os contratos longos. Instituições cobriram posições prefixadas de maior risco. O contrato para a virada do ano avançou de 15% para 15,04%. O swap de 360 dias subiu de 14,85% para 14,90%. Com esta alta nominal, o juro real volta a ser de dois dígitos. Ele subiu de 9,99% para 10,04%. O risco-país parou de cair, estável a 225 pontos-base. E a Bovespa, ignorando as valorizações em Nova York, desvalorizou-se 0,28%, para 38.049 pontos. A componente mais intrigante da blindagem erguida pelos bancos contra o tiroteio eleitoral é o acúmulo de posições compradas em dólar. Para uma economia cujo juro real projetado ainda roda a 10% ao ano e cuja balança cambial exibe fortes superávits é uma contradição técnica um caixa excessivamente "comprado" em dólar. As instituições zeraram as pesadas posições vendidas ao longo de fevereiro. Fecharam janeiro com megaposição vendida de US$ 4,7 bilhões. Mas começaram março com caixa comprado de US$ 200 milhões. E foram ampliando a posição ao longo da primeira quinzena do mês até chegar a US$ 2,5 bilhões. Qual a razão? A justificativa técnica foi o tremor internacional desencadeado pela percepção de que o risco mundial irá se elevar progressivamente com o reaperto monetário do G3 (EUA, Europa, Japão). Mas, na semana passada, esse fator perdeu força. Os números mais recentes sobre a economia americana promoveram um relaxamento das tensões. Ela cresce moderadamente e sem provocar inflação. O Federal Reserve (Fed) pode assumir sem remorso uma conduta branda. Mesmo assim, os bancos domésticos continuaram absorvendo moeda, numa troca de papéis com o BC. Por força do constrangimento fiscal, o BC desacelerou radicalmente suas intervenções cambiais. Já ativo em dólar interna e externamente, o BC, após assumir posição comprada em US$ 23 bilhões no mercado futuro por meio dos contratos de swap reverso, não vende esse tipo de papel há nove pregões. E as compras diretas são pequenas. Na primeira quinzena do mês não passaram de US$ 1 bilhão. Enquanto isso, os bancos elevam, sem necessidade econômica aparente, suas posições de compra. Diante disso, analistas até sugerem a existência de um acordo de cavalheiros entre o BC e os bancos para não deixar o dólar cair abaixo de R$ 2,10. Improvável. A explicação é a montagem de defesas contra distúrbios político-eleitorais.