Título: País decide começar a enriquecer urânio
Autor: Ricardo Balthazar
Fonte: Valor Econômico, 25/11/2004, Brasil, p. A5

Tecnologia Governo diz ter recebido sinal verde de agência da ONU para iniciar operação da planta de Resende

O governo brasileiro anunciou ontem que vai iniciar em dezembro a operação da planta de enriquecimento de urânio que está construindo em Resende (RJ). Segundo comunicado distribuído pelos ministérios das Relações Exteriores e da Ciência e Tecnologia, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) deu o sinal verde que o governo aguardava para começar as operações. A nota informa que técnicos da agência visitaram as instalações de Resende entre terça e quinta-feira da semana passada. O governo manteve a visita em segredo, ao contrário do que ocorreu na passagem anterior dos inspetores pelo país, em outubro. A AIEA é um braço da Organização das Nações Unidas (ONU) cuja missão é zelar pelo uso pacífico da energia nuclear. Nas próximas semanas, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) vai terminar de avaliar as condições de segurança da planta para liberar o início da operação. O governo pretende realizar em dezembro os primeiros testes da planta com urânio. A visita da semana passada concluiu uma etapa importante das negociações entre o Brasil e a agência, mas não significa o fim da discussão em torno do assunto. Ainda não existe um acordo definitivo sobre a forma como serão feitas as inspeções em Resende quando as instalações finalmente começarem a enriquecer urânio. Provavelmente ainda serão necessários meses de conversas para que isso seja alcançado. De acordo com o comunicado do governo brasileiro, "a visita foi considerada plenamente bem-sucedida por ambas as partes". O porta-voz da agência, Mark Gwozdecky, indicou que isso não significa que a questão esteja resolvida. "A AIEA ainda está no processo de completar suas avaliações", afirmou à agência de notícias Bloomberg, de Viena, onde fica a sede da organização. As instalações de Resende produzem o combustível que alimenta as duas usinas nucleares de Angra dos Reis (RJ). O enriquecimento do urânio, etapa mais importante na produção do combustível, hoje é feito para o Brasil pela Urenco, uma empresa européia. Quando estiver pronta, a planta de Resende terá capacidade para atender a 57% das necessidades das usinas brasileiras. Existem atualmente 400 centrífugas de enriquecimento de urânio prontas para operar em Resende. Essas máquinas têm capacidade para produzir apenas 2% do material que as usinas de Angra dos Reis precisam. Quando a planta de Resende for concluída, o que está previsto para acontecer em 2010, haverá milhares de centrífugas operando. O que os inspetores da AIEA fizeram na semana passada foi verificar se a planta foi construída como o governo brasileiro declarou que faria, de acordo com desenhos e outras informações fornecidas pelo país. Os técnicos também conferiram as tubulações que ligam as centrífugas para ter certeza de que elas não permitem qualquer tipo de desvio. Embora os inspetores possam visitar Resende e controlar a circulação de material nuclear na planta, as autoridades brasileiras não deixam que eles vejam as centrífugas. O governo alega que precisa proteger tecnologias que adquiriu ao desenvolver as máquinas. Elas são semelhantes às existentes em outros países, mas têm inovações que o governo deseja manter longe de curiosos. A agência aceitou fazer a verificação da planta sem ver as centrífugas. Mas os inspetores ainda não decidiram se continuarão aceitando as condições do Brasil para as inspeções depois que a planta começar a enriquecer urânio. Funcionários brasileiros que participam das negociações têm procurado convencer a AIEA a deixar as coisas assim por enquanto e rever a questão quando ficarem prontos os módulos da planta que estão em obras.