Título: Indústria acelera importação de insumos
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 22/03/2006, Brasil, p. A6

Conjuntura Crescimento de 14% indica substituição de fornecedores domésticos e também ritmo maior na produção

Um fornecedor solicitou à fabricante de bens de capital Sandretto um reajuste de 14% nos preços do componente mecânico que vende para a empresa. Só que, antes mesmo de sentar na mesa de negociação, a companhia havia recebido propostas para importar o mesmo componente 25% mais barato. Com a valorização do real, situações como essa são cada vez mais comuns na negociação das empresas com seus fornecedores. O resultado é um aumento da compra de insumos no exterior. No primeiro bimestre do ano, a quantidade importada de bens intermediários (os insumos para a produção industrial) aumentou 14% em relação a igual período de 2005, conforme dados da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex). Os preços desses produtos subiram apenas 2% na mesma comparação. O ritmo de crescimento dos embarques é bastante superior ao de 2005, quando o volume de importação de bens intermediários cresceu 6% em relação a 2004. De acordo com Sérgio Vale, economista da MB Associados, o salto da importação de insumos sinaliza que a produção industrial brasileira deve crescer com mais vigor nos próximos meses e aponta o início da substituição de insumos nacionais por importados por conta da persistente valorização da moeda brasileira. "Os efeitos do câmbio começam a aparecer", diz o economista. Cálculo da MB aponta que o consumo interno de bens intermediários está crescendo em um ritmo superior ao da produção doméstica desses produtos, o que significa maior participação das importações no abastecimento do mercado brasileiro. Em janeiro, o consumo (produção mais importação menos exportação) de bens intermediários cresceu 4% em relação a janeiro de 2005. A produção interna desses itens subiu 2,9%. Já a quantidade importada cresceu 13,5%, bem acima das exportações, que seguiram avançando 7%. No ano passado, o cenário era diferente. O consumo interno de bens intermediários cresceu apenas 0,5% na comparação com 2004, apesar da produção interna ter evoluído 0,9%. Por conta do vigor da economia internacional, as exportações cresceram 7%, enquanto as importações avançaram 6%. Para Fernando Ribeiro, economista da Funcex, o salto nas importações de bens intermediários demonstra "um pouco" de substituição de insumos nacionais por importados e "muito" da retomada da atividade econômica. Ele acredita que a compra desses insumos no exterior é um bom indicador antecedente da produção industrial. Segundo o economista, a importação de bens intermediários cresce entre três e quatro vezes mais que a produção industrial. Esse cálculo indica que a produção industrial pode crescer entre 3,5% e 5% ao longo deste ano. Após subir 2,8% em 2005, a produção da indústria da transformação caiu 1,8% em janeiro. Os economistas atribuíram o mau desempenho a um ajuste de estoques. A expectativa do mercado é que a produção industrial brasileira cresça 4% este ano. Nos bens de capital e bens de consumo duráveis, produtos mais sensíveis à variação cambial, os efeitos da substituição de insumos nacionais por importados são mais intensos que nos bens intermediários. A quantidade importada de bens de capital cresceu 34% no primeiro bimestre do ano, enquanto a produção desses itens avançou 6,8% em janeiro. Nos bens de consumo duráveis, o volume importado cresceu 47,9% no bimestre e a produção aumentou 18,4% em janeiro. A fabricante de produtos têxteis Teka começará a importar uma parcela de seus insumos a partir de abril. A empresa pretende adquirir no exterior os fios que compra de terceiros, o que significa 20% do total do seu consumo. A companhia produz os 80% restantes. Todos os corantes que a Teka utiliza também serão importados. "Tomamos essa decisão quando o dólar chegou em R$ 2,20, mas deveríamos ter feito isso quando o patamar era R$ 2,30", diz Almir Biejing, diretor de exportações da companhia. Segundo ele, os insumos representam 50% dos custos de produção. A fabricante de móveis catarinense Artefama está importando madeira da Argentina, tintas da Bélgica e parafusos de Taiwan. José Franzoni, gerente financeiro e de suprimentos da companhia, conta que os parafusos fabricados em Taiwan são 50% mais baratos que os brasileiros. A companhia começou a importar uma fatia de seus insumos no ano passado. No início, a empresa buscava apenas alguns insumos especiais. Mas esse processo se transformou em uma forma de reduzir custos à medida que o real se valorizava. O percentual de insumos importados pela Artefama não chegava a 5% no início de 2005. Hoje está em 20%. De acordo com Guido Pelizzari, diretor-geral da Sandretto, a empresa também está buscando substituir insumos nacionais por importados. A empresa começou a comprar no exterior componentes hidráulicos, elétricos e mecânicos, além de alguns aços especiais, cuja produção é pequena no Brasil. A Sandretto produz injetoras plásticas, máquinas que servem para a fabricação de embalagens e outros produtos feitos de plástico. A estratégia de troca de fornecedores tomou corpo nos últimos cinco meses. "Antes só importávamos o que não era fabricado no Brasil", diz Pelizzari. O percentual de insumos importados pela Sandretto subiu de 8% para 20% no último semestre. "Essa situação está destruindo os pequenos fornecedores, que surgiram nos últimos anos", constata o empresário.