Título: STF enfrenta Congresso e mantém verticalização por 9 votos a 2
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2006, Política, p. A8

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, ontem, que os partidos políticos terão de seguir nos estados as mesmas coligações firmadas para a disputa à Presidência da República. A decisão, tomada por 9 votos a 2, deve ampliar o conflito entre o STF e o Congresso. No Congresso, as forças políticas do governo e da oposição se uniram em torno do fim da "verticalização". Foi justamente para evitar contestações judiciais, que o Congresso aprovou emenda constitucional determinando ampla liberdade para as coligações nos estados. A aprovação de emenda foi o máximo que o Congresso pôde fazer. São necessários três quintos da Câmara e do Senado para a aprovação. Mais do que isso, só convocando uma nova Assembléia Constituinte. Mas, para o STF, a emenda não foi suficiente. A maioria dos ministros concluiu que a emenda só pode valer a partir do ano que vem. Segundo eles, o Congresso deve respeitar o princípio da anualidade, pelo qual as regras que mudam o processo eleitoral só passam a valer no ano posterior ao que forem promulgadas. O objetivo é evitar alterações de última hora nas regras das eleições. "O princípio da anualidade visa exatamente a preservar a segurança do processo eleitoral, afastando qualquer alteração ao sabor das conveniências do momento", explicou o ministro Enrique Ricardo Lewandowski. A Emenda nº 52, que determinou o fim da "verticalização" foi promulgada em 8 de março passado. Logo, na visão do STF, a "verticalização" está extinta, conforme estabeleceu a emenda, mas somente a partir de 2007. Ou seja, as coligações nos estados estão liberadas apenas para as eleições de 2010. A liberalização não vale para as eleições deste ano. A decisão foi tomada num momento delicado entre o STF e o Congresso. O tribunal vem concedendo liminares para depoentes em CPIs desde o ano passado, irritando parlamentares, particularmente os da oposição. Com base numa dessas liminares, o publicitário Duda Mendonça se recusou a responder às perguntas da CPI dos Correios, na semana passada, frustrando a comissão. Ainda na semana passada, o ministro Cezar Peluso suspendeu o depoimento do caseiro Francenildo Costa, causando a ira dos parlamentares da CPI dos Bingos, que já recorreram duas vezes ao STF e, até agora, não obtiveram autorização para ouvi-lo. Durante a votação da emenda da "verticalização", alguns ministros criticaram o Congresso. Celso de Mello disse que os parlamentares podem alterar a Constituição, mas desde que respeitem as limitações que ela impõe, como o princípio da anualidade para mudanças nas regras eleitorais. "Pode alterar (a Constituição); não pode destruir", diferenciou. A ministra Ellen Gracie atacou a emenda, alegando que a medidade alterou o processo eleitoral naquilo que ele tem de mais "sensível e essencial": a competição. "O jogo possui regras e é necessário que sejam prévias, imutáveis", disse a ministra. O presidente do STF, Nelson Jobim, seguiu o mesmo raciocínio. Ele afirmou que as decisões políticas sobre as eleições deste ano começaram em outubro do ano passado. Assim, não pode haver uma mudança brusca nas regras do jogo em março, completou Jobim. "As instituições e as regras do jogo definem condutas", justificou Jobim. Apenas dois ministros foram favoráveis à emenda que pôs fim à "verticalização": Marco Aurélio Mello e Sepúlveda Pertence. "A verticalização, para mim, é um engessamento, um retrocesso", disse Marco Aurélio. Para ele, o Brasil possui, nos estados, forças políticas distintas que devem ser respeitadas. "A realidade do Acre não é a mesma de São Paulo". Pertence reconheceu que a emenda foi uma reação à decisão do Tribunal Superior Eleitoral, de um mês atrás, que manteve a "verticalização". "Que outro remédio tem o jogo democrático se não a emenda constitucional?", perguntou Pertence aos demais ministros do Supremo.