Título: Protecionismo domina a reunião de cúpula da UE
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2006, Internacional, p. A13

O confronto entre liberalismo e nacionalismo econômico deve dominar a reunião de cúpula dos líderes da União Européia, que ocorre hoje e amanhã, em Bruxelas, num ambiente de confusão. A Itália diz contar com apoio do Reino Unido e da Holanda para denunciar protecionismo em alguns países do bloco, que barraram a entrada de investidores da própria UE em seus mercados. Os sintomas são especialmente fortes no setor da energia, onde a França e a Espanha defendem estratégias nacionais para preservar suas principais companhias contra tentativas de aquisição por italianos e alemães. O clima piorou entre Paris e Roma depois que a italiana Enel teve frustrada pelo governo francês sua tentativa de comprar a Suez. No setor financeiro, o UniCredit italiano tampouco consegue expandir suas operações na Polônia, onde passaria a controlar grande parte do mercado local. A Espanha bloqueou uma tentativa de compra da Endesa pela alemã Eon. A Alemanha, um dos maiores exportadores mundiais e tradicional defensor da liberalização comercial, apóia a Comissão Européia na abertura das fronteiras. Mas também comprou briga com Bruxelas por causa da chamada "lei Volkswagen", que protege o produtor automotivo alemão de tentativas de aquisição hostil. O protecionismo envenena o ambiente da cúpula, e observadores prevêem que o premiê italiano, Silvio Berlusconi, em campanha eleitoral, se mostrará "musculoso" contra os franceses. Berlusconi está particularmente irritado pois uma tentativa italiana de proteger o setor bancário local levou à renúncia do presidente do banco central da Itália. Aos olhos dos eleitores italianos, Berlusconi aparece como aquele que não consegue proteger suas empresas nacionais. A Alemanha não se aliou aos italianos porque sabe que a principal visada é a França, sua maior aliada no bloco comunitário. O presidente da Comissão Européia, José Durão Barroso, qualificou o nacionalismo econômico de "absurdo" no que deveria ser um mercado comum. Ele vincula as reações protecionistas de alguns governos europeus a dificuldades para estimular uma economia competitiva que crie mais empregos. Insistiu que vai tentar obter apoio dos líderes para definir um mercado energético europeu, aprovar uma diretiva no setor de serviços a ser enviada ao Parlamento europeu e eliminar obstáculos que dificultam a criação de empresas. Por enquanto, a maioria dos países têm resistido a isso. "Devemos é colocar tapete vermelho para as empresas, para criação de empregos", declarou. A situação é curiosa. A UE é agressiva na Organização Mundial do Comércio (OMC), onde exige abertura ampla dos setores industrial e de serviços dos outros países. Mas, em seu próprio mercado, seus países-membros levantam barreiras entre si e contra o resto do mundo. A Itália reclama de protecionismo dentro da Europa. Mas foi o primeiro país a pressionar a Comissão Européia para frear importações chinesas e bloquear aquisições de bancos por estrangeiros. França, Espanha e Luxemburgo discutem como evitar que o gigante siderúrgico Mittal, controlado por uma família indiana, assuma o controle da Arcelor. Questionado se defendia abertura apenas entre os 25 países, Durão Barroso repetiu que a UE está pronta a liberalizar seu setor agrícola se os outros países pagarem em troca em outros setores.