Título: País já admite corte acima de 50% nas tarifas de produtos industriais
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2006, Especial, p. A16

O Brasil deu pela primeira vez indicações de que pode cortar tarifas de importação de bens industriais acima dos 50%, condicionado a reciprocidades da União Européia (UE) e dos Estados Unidos na área agrícola. O movimento foi feito na reunião ministerial do G-6 - Brasil, EUA, UE, Japão, Austrália e Índia - em Londres, há duas semanas, afirmam fontes que tiveram acesso aos resultados do encontro. Os ministros decidiram naquela ocasião que manteriam segredo sobre as conversações, aparentemente para não sofrerem pressão adicional dos vários setores econômicos. Até agora, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, tem admitido uma fórmula de corte tarifário com coeficiente 30 (quanto maior o coeficiente, menor o corte). Isso implica redução de 50% nas alíquotas consolidadas nos compromissos assumidos pelo país na OMC, mas de apenas 5% nas alíquotas realmente impostas sobre as importações - e que os desenvolvidos consideram pouco. Em Londres, Amorim teria dado o passo adiante, sugerindo que o Brasil poderia aceitar um coeficiente 25. Pelos cálculos da Fiesp, isso levaria a corte médio de 53% nas tarifas consolidadas e de 7% nas aplicadas. Baixaria as taxas sobre importações de US$ 16,5 bilhões, ou 34% das compras efetuadas no exterior. Os cálculos não levam em conta a possibilidade de excluir alguns produtos da liberalização, que continua em negociação. Segundo as fontes, Amorim não fez uma proposta, mas "um aceno sofisticado" no meio do debate, que gerou esperanças. O comissário de comércio da UE, Peter Mandelson, relatou ao Parlamento Europeu que o Brasil aceitou que "todas as partes (envolvidas nas negociações) devem ver alguns cortes reais de tarifas em produtos de seus interesses", julgando "insuficiente, mas um sinal importante". O diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Roberto Azevedo, insistiu que não houve proposta formal em Londres, e que o Brasil limitou-se a destacar dois pontos na negociação industrial: "Primeiro, os países desenvolvidos têm responsabilidade maior do que as nações em desenvolvimento ao fazer os cortes tarifários, e segundo, não se pode ter ambição em produtos industriais maior do que em agricultura", afirmou. Observadores acham que Amorim tenta, de maneira inteligente, arrancar logo ganhos em agricultura acenando com baixa de tarifa de importação - o que a Fazenda quer fazer por razões internas. Oficialmente, UE, EUA e Japão insistem numa redução tarifária mais importante no Brasil, Índia e outros emergentes. Defendem coeficiente 15, que reduziria em 65%, em média, as alíquotas consolidadas no Brasil, e derrubaria a média aplicada para cerca de 9%. Certos negociadores na Europa estimam que pode-se chegar a um compromisso em torno de formula com coeficiente 20. Isso faria baixar as alíquotas de 4.928 produtos importados pelo Brasil, abrangendo US$ 21,7 bilhões, ou 44% das importações.