Título: BID empresta mais que Bird ao país
Autor: Tatiana Bautzer e Ricardo Balthazar
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2006, Finanças, p. C1
Financiamento Externo Com menos restrições, Brasil recorre mais ao crédito da instituição
O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que já empresta mais para o Brasil do que o Banco Mundial (Bird), está reformulando sua política de crédito para aumentar a demanda dos países. O BID planeja emprestar diretamente a Estados e municípios, sem o aval da União, desde que o crédito financie empreendimentos mistos entre os setores público e privado. A instituição também quer aumentar o crédito em moeda local e para isso pretende lançar no mercado internacional um título de dez anos denominados em reais, conta o presidente do BID, Luis Alberto Moreno. A flexibilidade do BID, que não tem restrições a créditos ao setor privado, já vem fazendo a instituição regional superar o Banco Mundial em empréstimos. Em 2004, o BID destinou o total de US$ 5,8 bilhões para a região - e já se sabe que houve crescimento expressivo dessa cifra em 2005, embora os dados finais ainda não tenham sido divulgados oficialmente. Já nos 12 meses até julho de 2005, o Bird tinha direcionado US$ 5 bilhões. A International Finance Corporation (IFC), braço financeiro do Bird para o setor privado, emprestou para a região no mesmo período US$ 1,8 bilhão. E enquanto a demanda no BID continua crescendo, recentemente o diretor dos EUA no Bird, Robert Holland, reclamou durante um evento sobre financiamento de infra-estrutura na América Latina da desaceleração na demanda e concessão de crédito. O Brasil, especificamente, tem tomado bem mais recursos do BID. Segundo dados do Ministério do Planejamento, no ano passado o BID desembolsou US$ 1,4 bilhão para o Brasil, enquanto o Bird concedeu cerca de US$ 700 milhões. O Brasil reduziu a carteira com o Bird, pagando US$ 602 milhões a mais do que o desembolsado. A mudança do "mandato" do BID, com a retirada da necessidade de garantia da União e maior destaque para o setor privado, será o principal debate da reunião anual que começa na semana que vem em Belo Horizonte, segundo o presidente Moreno. A mudanças mais rápidas nas prioridades do BID em relação ao Banco Mundial refletem a influência mais direta exercida no banco regional de fomento por países em desenvolvimento - em especial o Brasil, maior acionista da instituição depois dos EUA. A possibilidade de empréstimos sem aval soberano é fundamental para financiar, por exemplo, redes de água e saneamento, controladas por Estados e municípios, afirma Moreno. Uma limitação do BID é o valor máximo dos empréstimos, hoje de US$ 200 milhões (em casos especiais, até US$ 400 milhões) ou de 10% do total do investimento. Mas essa limitação não é tão relevante se considerado que os recursos do BID são usados para "alavancar" dinheiro privado e de outras fontes. Outra novidade preparada pelo BID para ajudar o desenvolvimento de parcerias entre os setores público e privado é criar uma linha de crédito para dar liquidez ao Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas (as PPP), constituído pelo governo federal com cerca de US$ 4 bilhões em ações de empresas como Banco do Brasil, Vale do Rio Doce e Petrobras. "Temos recebido pedidos do setor privado, que teme problemas de liquidez em caso de necessidade de uso do fundo", diz o gerente do Departamento de Operações 1 do BID, Manuel Rapoport. Se o fundo precisar ser utilizado, o BID pode antecipar os recursos ao governo federal, para dar tempo para a venda das ações das empresas no mercado. Também estão em avaliação novas linhas de garantia a empréstimos do BNDES. "Temos mais voz e flexibilidade no BID para adaptar os empréstimos ao que necessitamos, à medida que nos aproximamos da classificação de 'investment grade'", afirma o diretor do Brasil no BID, Rogério Studart. O banco é um dos maiores financiadores do programa Bolsa Família do governo federal (US$ 1 bilhão). Muitos dos empréstimos inovadores iniciados com o governo brasileiro recebem boa demanda de outros governos da região, principalmente das outras duas grandes economias, México e Argentina. Nos financiamentos para o setor privado, há algumas restrições, como empresas de tabaco, bebidas ou turismo. Moreno faz questão de deixar claro que, apesar de ter disputado a presidência do BID com o candidato brasileiro, João Sayad, continua comprometido com o atendimento às necessidades do Brasil, maior acionista do banco depois dos EUA. Num café da manhã com jornalistas brasileiros ontem, na sede do banco, Moreno disse que a vice-presidência executiva hoje ocupada por Sayad continuará sendo um cargo reservado ao Brasil. O presidente do BID disse que fechará a escolha do vice-presidente no início da semana que vem, mas preferiu não confirmar diretamente o nome do secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, o preferido pelo governo brasileiro, dizendo que "há vários candidatos".