Título: Tendência do real valorizado persiste
Autor: Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2006, Finanças, p. C2

A alta de 3% no valor do dólar por três dias consecutivos não se sustentou e a moeda americana voltou a cair ontem com força, 0,96%, para R$ 2,1530. Apesar de alguns analistas acreditarem que a volatilidade maior no câmbio veio para ficar, todos são unânimes em apostar que o real deve se manter valorizado. "A tendência é de apreciação cambial, pois o fluxo favorável é muito forte", diz Nilson Teixeira, economista-chefe do Credit Suisse, que reviu sua projeção para a taxa no final do ano para R$ 2,15, com relação aos R$ 2,30 anteriores. Na média do mercado, as projeções estão em R$ 2,20. Só intervenções mais fortes do Banco Central poderiam derrubar o valor do real de forma mais sustentada. O Credit Suisse acredita que neste ano o investimento estrangeiro em carteira - renda fixa e variável - vai chegar aos US$ 16 bilhões e superar, pela primeira vez, o investimento externo direto, de US$ 15,5 bilhões. O movimento dos primeiros meses do ano já aponta nesta direção: US$ 2,372 bilhões em janeiro e fevereiro de investimento direto líquido e US$ 4 bilhões em investimento em carteira. E isso apesar da proximidade das eleições presidenciais. "A previsibilidade da economia brasileira é maior", afirma Teixeira. A redução da dívida externa e o fim da tributação para os não-residentes que investirem no mercado interno de títulos públicos estimulam a compra de papéis do Tesouro por estrangeiros no Brasil. O crescente número de empresas realizando ofertas iniciais de ações (IPOs) também atrai o investidor externo, que compra cerca de metade do capital ofertado. Só o Credit Suisse, líder no mercado de coordenação e distribuição das emissões de ações no Brasil em 2005, já fez mais de US$ 2 bilhões neste ano até agora e tem mais US$ 2 bilhões em análise. A balança comercial também continua superando expectativas, diz Teixeira. Para 2006, os analistas prevêem superávit comercial de US$ 40 bilhões, mas a diferença entre as exportações e as importações não tem caído abaixo de US$ 46 bilhões em 12 meses. O Credit Suisse prevê entradas líquidas de US$ 22,6 bilhões neste ano no câmbio, maiores do que os US$ 21,4 bilhões em 2005. Engana-se quem olha para a posição comprada em dólar dos bancos no mercado à vista, de US$ 2,317 bilhões no dia 17 de maio, e acha que isso indica uma aposta na valorização da moeda americana no curto prazo. Responsável pela mesa de câmbio de um grande banco nacional lembra que o importante é a posição líquida dos bancos, ou seja, o total de ativos e passivos em dólar, incluídos os mercados futuros e ativos no exterior. Esse experiente operador aposta que os bancos estão é com posições líquidas vendidas em dólar. As posições compradas no mercado à vista desde o início deste ano foram ampliadas por causa de mudanças nas regras do jogo: em janeiro, foi extinto o limite para essas posições, que era de US$ 6 milhões. Antes disso, o BC recolhia compulsoriamente, sem dar qualquer remuneração, tudo que excedia o limite. Agora, livres para comprar, os bancos acabaram ajudando o BC a absorver as entradas de dólares no mercado. Dos US$ 4,14 bilhões até o dia 17, o BC comprou cerca de US$ 1,83 bilhão e os bancos ficaram com os US$ 2,3 bilhões restantes, diz Sidnei Nehme, diretor-executivo da NGO Corretora. Os outros US$ 200 milhões foram carregados do mês anterior.

Investimento em carteira supera o direto

A posição dos investidores estrangeiros em contratos futuros na Bolsa de Mercadorias & Futuros continua fortemente vendida em dólar, em US$ 10,25 bilhões no dia 21, embora alguns bancos, como a Goldman Sachs, tenham recomendado a realização de lucros após ganhos de 18% desde 5 de dezembro, entre os dez maiores nas recomendações para o período. Não que a Goldman Sachs não veja espaço para maiores ganhos, "mas o ritmo da tendência pode ser mais moderado e o risco de uma reversão temporária cresceu", afirma a Goldman Sachs, segundo a "Dow Jones Newswires". Os investidores continuam a ter fortes ganhos de carregamento, ao se financiarem em dólar e aplicarem em reais. Mas, como lembra Teixeira, a volatilidade externa tem mesmo impactado o mercado brasileiro. Ontem, o dólar e os juros futuros só voltaram a cair no Brasil por causa da maior calmaria no mercado de títulos do Tesouro dos Estados Unidos. Os papéis de vencimento em dez anos tiveram seus juros reduzidos em 0,02 ponto percentual, para 4,70% ao ano. Já os títulos de dois meses ficaram com juros maiores, de 4,74%, com relação aos 4,72% de anteontem. A curva de juros nos EUA permanece invertida, portanto. Os contratos futuros de juros no Brasil projetavam taxas de 14,615% ao ano para janeiro de 2008, na comparação com os 14,696% anteontem. O risco-Brasil caiu 1,31%, para 229 pontos básicos.