Título: Para Bresser, Alckmin vai mudar orientação da política econômica
Autor: César Felício e Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 24/03/2006, Política, p. A8

O ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira está convencido de que haverá mudanças significativas na política econômica se Geraldo Alckmin for eleito presidente. Para ele, está errada a avaliação predominante no mercado financeiro de que o governador paulista dará continuidade à orientação ortodoxa que domina o país desde 1995. Bresser acredita que o Alckmin presidente daria prioridade à tentativa de desmontar a armadilha formada pela dupla juro alto e câmbio valorizado, combinação que, segundo ele, impede há vários anos o crescimento mais forte da economia. "Eu não tenho dúvida nenhuma que isso mudará mesmo num eventual segundo governo Lula. Além de ser insuportável para a economia, a ortodoxia convencional está derrotada", afirma Bresser, acreditando que chegou a vez de o que ele chama de novo desenvolvimentismo dar as cartas no país. O ex-ministro avalia que o pensamento de economistas do "grupo de São Paulo" - como ele mesmo, o ex-secretário da Fazenda paulista Yoshiaki Nakano e o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros - deve prevalecer num eventual governo Alckmin. Para ele, "O 'grupo do Rio' (que tem como expoentes economistas da PUC-Rio) fracassou totalmente" na condução da economia. Segundo Bresser, "eles estão há 11 anos no poder, desde 1995", um período em que o Brasil cresceu a um ritmo medíocre, inferior a 3% ao ano. Por isso, ele rechaça a avaliação, corrente no mercado, de que Alckmin seria uma "página em branco", em que o ex-presidente Armínio Fraga escreveria o que quisesse. "Alckmin está muito longe de ser uma página em branco, muito pelo contrário, é um homem muito competente, inteligente e capaz", responde Bresser, tecendo vários elogios ao governador paulista, que não era seu preferido entre os tucanos para disputar a presidência. Em fevereiro, ele escreveu um artigo na Folha de S. Paulo dizendo que o prefeito José Serra seria o melhor candidato do partido. Para ele, vai se definindo na sociedade um consenso de que é necessário mudar a orientação da política econômica, principalmente no que se referee ao problema do juro alto e do dólar barato - a doença que levou o Brasil a uma situação de semi-estagnação. "E Alckmin vai refletir essa mudança de consenso", afirma ele, lembrando que, em entrevistas recentes, o governador atacou fortemente o nível dos juros. E então por que o mercado acredita que Alckmin, se eleito, seguirá uma linha ortodoxa? A resposta é simples, segundo Bresser: porque essa política de juros altos e câmbio valorizado interessa ao sistema financeiro. Além disso, as posições econômicas do governador são menos claras do que as de Serra. Bresser acabou de escrever um artigo intitulado "Novo desenvolvimentismo e a ortodoxia convencional". No texto, ele diz que fracassaram na América Latina as políticas ortodoxas, preconizadas no Brasil por economistas ligados à PUC-Rio e ao Instituto de Estudos de Pesquisa Econômica da Casa das Garças. O ponto de virada seria a crise da Argentina, em 2001, que quebrou o país que na região seguiu mais fielmente os preceitos neoliberais, avalia Bresser. Ele aposta que o novo desenvolvimentismo deve substituir a ortodoxia convencional por aqui. O ex-ministro faz questão de atacar a idéia de que essa corrente de pensamento é populista e veria a questão fiscal com leniência. Ele diz que é fundamental cortar gastos públicos e ter um Estado competente, mas observa que a resolução do problema fiscal também passa pela redução dos juros. "Como se resolve a questão fiscal se o Brasil paga dejuros 8% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano?", pergunta ele. "Mas é claro que existem outras despesas para serem cortadas e eu sou inteiramente a favor disso. O novo desenvolvimentismo é fortemente ortodoxo, na falta de uma palavra melhor, em matéria fiscal". Se aí há pontos de contato com o pensamento mais liberal, há divergências consideráveis em relação ao papel do Banco Central (BC). Segundo Bresser, enquanto a ortodoxia convencional "defende apenas um mandato para o BC - o controle da inflação -, o novo desenvolvimentismo afirma serem necessários dois mandatos: inflação e emprego". Além disso, ele defende a importância de administrar a taxa de câmbio. "Nós não queremos fixar a taxa, mas administrá-la dentro de um quadro de flutuação", afirma Bresser, que aproveita para chamar de populismo cambial a estratégia da atual equipe econômica de permitir a valorização do real. Em seu texto, Bresser insiste na importância de o país adotar uma estratégia nacional de desenvolvimento, lembrando o exemplo dos países asiáticos, que não seguiram a onda neoliberal pregada pelo Tesouro americano e por organismos multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Ele acredita que o Alckmin presidente tenderá a seguir essa linha econômica. "Se ele for eleito, vai querer fazer o melhor governo, o que não significa simplesmente baixar a cabeça perante Washington, e muito menos perante a Casa das Garças", brinca ele.