Título: Quebra de sigilo leva PSDB a denunciar Palocci por crime de responsabilidade
Autor: Thiago Vitale Jayme e Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2006, Política, p. A14

O PSDB decidiu ontem pedir a destituição do ministro da Fazenda, Antonio Palocci. O deputado Alberto Goldman (PSDB-SP) apresentou, à Mesa Diretora da Câmara, denúncia por crime de responsabilidade contra o ministro. Uma das motivações foi a quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa, que testemunhou contra Palocci na CPI dos Bingos. A situação do ministro continua delicada. Caberá ao presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), decidir sobre o prosseguimento da ação contra o ministro. Ontem, ele enviou o pedido de representação à Consultoria Jurídica da Casa. Ao pedir o impeachment, Goldman recorreu à Lei 1.079/50, a mesma utilizada, em 1992, no processo que resultou no impedimento do então presidente Fernando Collor de Mello. Se a denúncia for aceita pela Mesa da Câmara, será criada uma comissão especial para investigar a responsabilidade do ministro no episódio do caseiro. Se a comissão julgar Palocci culpado, o caso irá à votação no plenário e, se aprovado, seguirá para o Supremo Tribunal Federal (STF), o foro responsável pelo julgamento de ministros de Estado. No documento protocolado ontem, o deputado Alberto Goldman argumenta que a Caixa Econômica Federal (CEF), de onde teriam vazado os dados bancários de Francenildo, está subordinada ao Ministério da Fazenda, portanto, ao ministro Palocci. "A divulgação dos dados bancários de Francenildo a partir de extrato de conta da Caixa foi ilícita, por desrespeitar as garantias constitucionais da inviolabilidade à intimidade e do sigilo de dados", disse o deputado tucano. No texto, Goldman diz que Palocci "possivelmente teria incorrido na prática de crime de responsabilidade contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais, pois teria se servido de autoridades sob a sua subordinação imediata para praticar abuso do poder". Goldman sustenta que o ministro teria cometido três crimes de responsabilidade: ele teria mentido sobre suas idas à casa dos ex-assessores de Ribeirão Preto; teria sido omisso na ação de subordinados na quebra ilegal do sigilo do caseiro; e não teria tomado providências para apurar o fato. O ministro da Fazenda, na opinião de Goldman, também mentiu à CPI dos Bingos. Quando falou aos senadores, Palocci disse que nunca esteve na mansão do Lago Sul usada por seus ex-assessores na prefeitura de Ribeirão Preto para fazer lobby em Brasília. O problema é que o caseiro Francenildo disse ter visto Palocci no local entre 10 e 20 vezes. O tucano não crê na proteção de Palocci por Aldo Rebelo, seu aliado político. "Aldo tem que mostrar sua dignidade e avaliar com isenção o caso", afirmou Goldman. Se o presidente da Câmara não acatar a denúncia, o PSDB poderá recorrer ao plenário para mudar a decisão. No governo, a ação do PSDB foi vista com surpresa, mas não mudou a estratégia idealizada pelo presidente Lula para defender o ministro. A expectativa, no Palácio do Planalto, é que, uma vez solucionado o caso da quebra do sigilo de Francenildo, a crise envolvendo Palocci perca o fôlego. Lula segue tocando sua agenda sem tratar do assunto. "O presidente está feliz, não quer falar disso e já decidiu que, se o caso disser respeito à vida pessoal do ministro, ele será mantido no cargo", revelou um assessor. "Lula quer Palocci no governo até 31 de dezembro", comentou um outro auxiliar do presidente. A situação de Palocci, no entanto, é frágil. Poucos ministros do governo acreditam que ele possa resistir ao desgaste que vem sofrendo e, principalmente, à crise da quebra ilegal do sigilo bancário de Francenildo. Nos últimos dez dias, o ministro não pôs os pés no edifício-sede do Ministério da Fazenda, dando a impressão de que já não é, de fato, o ministro da Fazenda. Em conversas com seus secretários, tem alegado que conta com o apoio do presidente. Palocci tem despachado, nos últimos dias, numa sala do terceiro andar do Palácio do Planalto, a poucos metros do gabinete do presidente. Foi lá onde recebeu ontem uma missão de técnicos do Fundo Monetário Internacional, chefiada pelo economista Charles Collyns. O encontro, que também contou com a presença do secretário-executivo Murilo Portugal, foi fechado. Hoje, Palocci viverá um teste de fogo. Ele será homenageado, em São Paulo, durante almoço de posse do Conselho de Administração da Câmara Americana de Comércio (AmCham Brasil). A homenagem estava agendada muito antes dos episódios recentes, portanto, não poderá ser vista como um ato de desagravo. A previsão é que o ministro faça um discurso durante o evento, mas evite entrevistas à imprensa. Ele deve retornar hoje mesmo a Brasília. (Colaborou Arnaldo Galvão)