Título: Ferrugem mobiliza produtores dos EUA
Autor: Alda do Amaral Rocha
Fonte: Valor Econômico, 25/11/2004, Agronegócios, p. B10

Soja USDA estima perdas entre US$ 640 milhões e US$ 1,3 bilhão no país no primeiro ano de ocorrência do fungo

A ferrugem asiática da soja, que no Brasil provocou prejuízo de US$ 1,3 bilhão na safra passada, já é a maior preocupação dos produtores dos Estados Unidos, onde a doença foi identificada este mês. E o temor não é à toa: a doença deve elevar em 15% a 20% os custos de produção nas lavouras americanas, num setor que trabalha com margens ajustadas. A elevação dos custos é a única certeza de produtores e analistas. Mas os efeitos sobre a próxima safra de soja dos EUA, que começa a ser plantada em abril, ainda são uma incógnita. Assim como o que irá ocorrer com os preços internacionais da soja. Aliás, a questão do plantio parece tabu para os americanos. De produtores a analistas, o que mais se ouve é que é "muito cedo" para afirmar se o plantio será menor na safra 2005/06 por causa da ferrugem. Até agora, foram confirmados focos da doença no Mississippi, Louisiana, Alabama, Geórgia, Flórida e Arkansas. "É muito cedo para dizer o que irá acontecer com o plantio", diz Neil Caskey, representante da Associação Americana de Soja (ASA). Ele avalia que haverá tempo para "educar os produtores" até o próximo plantio. Caskey se refere a medidas de prevenção da doença, entre elas a aplicação de fungicidas. Reconhece, porém, que a preocupação é grande, já que a ASA prevê alta de US$ 20 por acre no custo de produção de soja em função da aplicação de fungicidas. O mercado estima que hoje o custo está em US$ 100 por acre nos EUA, onde o plantio atingiu 73,99 milhões de acres no ciclo 2004/05. O fungo também preocupa o governo americano. Relatório do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) estima que no primeiro ano da epidemia no país a doença pode causar perdas entre US$ 640 milhões e US$ 1,3 bilhão.

Jay Fitzgerald, da Advance Trading, afirma que há incerteza entre os produtores sobre a ferrugem, e diz que a situação dos preços da soja no período de plantio será determinante. Mas ele não descarta que os produtores do Meio-Oeste elevem a área de milho na próxima safra, em parte devido ao fungo. "Creio que o plantio de milho crescerá de qualquer forma por conta da demanda por etanol". Nos EUA, o milho é matéria-prima para o etanol, cujo consumo é crescente. Apesar da maior demanda, a Associação Nacional dos Produtores de Milho (NCGA) evita previsões. Jon Dogget, vice-presidente de políticas públicas da associação, diz que não deve haver redução na área de milho, mas evita relacionar esse quadro à ferrugem. Ele observa, ainda, que alguns dos Estados americanos onde o fungo foi detectada, como o Mississippi, não são importantes produtores de milho. A tendência, na região, é de aumento do plantio de algodão, acrescenta Jay Fitzgerald. Renato Sayeg, da brasileira Tetras Corretora, avalia que pode haver redução na área de soja americana em 2005/06 em decorrência dos maiores custos. Ele observa que, nos EUA, a margem de lucro dos produtores é mais apertada que no Brasil devido a fatores como o preço da terra. Assim, a perspectiva de margem menor poderia afetar o ânimo do produtor. Mas, para Sayeg, o surgimento da ferrugem nos EUA não deve mudar o cenário para os preços internacionais, pelo menos até meados de 2005, já que os estoques globais são recordes (61 milhões de toneladas) e há grande oferta mundial. Em sua análise, até julho do ano que vem o mercado deve trabalhar com preços iguais ou menores que os atuais. (ver página B9). Anderson Galvão, da Céleres, avalia que, no "médio e longo prazo", os preços da soja podem aumentar em decorrência da ferrugem, se de fato, a doença provocar redução na produção americana. Tudo dependerá, no fim das contas, da velocidade de disseminação da doença nos EUA. José Tadashi, especialista em ferrugem da Embrapa, avalia que áreas mais ao norte dos EUA podem ser infectadas dependendo dos ventos. Ele observa que as condições para a disseminação da ferrugem são temperaturas médias de 24 a 27 graus e umidade por mais de 10 horas. No Brasil, a ferrugem encontrou essas condições e se espalhou por todo país. No primeira safra em que foi identificada, a 2001/02, 60% da safra foi atingida. A maior preocupação, segundo ele, é se haverá oferta suficiente de fungicidas para atender à demanda americana. A indústria de defensivos local se prepara para o novo cenário e estima que as vendas de fungicida podem alcançar US$ 2 bilhões por causa da doença.