Título: Anúncio do Tesouro reverte queda do dólar, que sobe 0,4%, para R$ 2,7550
Autor: Cristiane Perini Lucchesi e Altamiro Silva Júnior
Fonte: Valor Econômico, 25/11/2004, Finanças, p. 2

Os investidores foram tomados de surpresa ontem pela decisão do Tesouro, de tornar pública a compra de US$ 3 bilhões no mercado interno de câmbio até o final do primeiro semestre do ano que vem. Os especialistas já haviam percebido a atuação do Banco do Brasil realizando compras, mas não tinham certeza se era a pedido do Tesouro ou não. O mercado interpretou que o anúncio é uma clara sinalização de que o governo considera que o dólar está desvalorizando demais contra o real. "Parece ser apenas o primeiro passo de outros que virão", diz Júlio Ziegelmann, gestor de grandes fortunas do BankBoston. "O Banco Central, acertadamente, não tem metas para o câmbio, mas sinalizou um desconforto com o ritmo de apreciação cambial", completa Mário Mesquita, economista-chefe do ABN AMRO. Especialistas que preferiram não se identificar passaram a se perguntar se o piso para a taxa de câmbio seria R$ 2,75. O dólar, que amanheceu o dia em queda, indo a R$ 2,7320, subiu para R$ 2,7670 logo após o anúncio feito pelo Tesouro, para depois terminar o dia a R$ 2,7550, em alta de 0,40%. As declarações do presidente Lula e do ministro Furlan também foram interpretadas como sinalizações de que o governo quer o real mais fraco.

O fato é que exportadores estavam reclamando. Empresários do setor automotivo teriam falado em cancelar investimentos. Mesmo no mercado financeiro as críticas com relação à passividade do BC e do Tesouro se avolumavam. Embora o anúncio da compra tenha atuado sobre as expectativas dos investidores, os especialistas foram unânimes em afirmar que o impacto direto da atuação do Tesouro sobre as cotações do dólar tem sido pequeno, quase nulo, e vai continuar dessa forma. O ritmo da compra é de US$ 200 milhões por mês em um mercado que movimenta mais de US$ 1 bilhão por dia. "Há espaço para a compra de mais US$ 10 bilhões para ajudar as reservas", diz Ziegelmann. Mesquita sugere a recompra antecipada de dívida cambial interna. O mercado ainda se pergunta de onde virão os US$ 3 bilhões que estão faltando para pagamento da dívida externa em 2005, visto que, dos vencimentos de US$ 11 bilhões, US$ 6 bilhões virão de captações no mercado externo e US$ 3 bilhões de compras no mercado interno de câmbio. Há rumores que o Fundo Monetário Internacional e os organismos multilaterais entrariam com US$ 2 bilhões. Renata Heinnemann, economista do Pátria Banco de Negócios, comenta que a estratégia dos investidores internacionais nos últimos dias foi se posicionar contra o dólar. Uma das moedas escolhidas para isso foi o real. O mercado calcula que há uma posição de US$ 4,5 bilhões de estrangeiros vendidos em dólar e cupom cambial (juros em dólar no mercado interno) na Bolsa de Mercadorias & Futuros, recorde neste ano, segundo apurou o Valor. "Com esse movimento se generalizando, muitos investidores locais passaram a fazer o mesmo", destaca a economista. Ela acredita que, com o anúncio do Tesouro, o investidor local vai ficar mais cauteloso. Já os estrangeiros devem continuar apostando contra a moeda americana. "O anúncio do governo limita a queda do dólar", diz. "Mas por outro lado, não há muito espaço para grande apreciação da moeda", avalia. Assim, na sua visão, o principal efeito vai ser a redução da volatilidade no mercado de câmbio. Para Luiz Fernando Romano, diretor de tesouraria do Banco Brascan, o anúncio vai influenciar as cotações no médio prazo. "Como a tendência do dólar era de queda, as pessoas achavam que a moeda ia continuar caindo e, por isso, o anúncio teve impacto discreto nas cotações ontem", diz. "Agora, o mercado vai rever o preço do dólar." Romano acredita que a preocupação com o desempenho da balança comercial, com a compra de produtos supérfluos no exterior e com as reservas internacionais em níveis baixos levaram o governo a tomar a medida. Para Newton Rosa, economista-chefe da SulAmérica Investimentos, longe de querer puxar as cotações do dólar para cima, a intenção do governo é aproveitar a baixa da moeda para comprar dólar. "O Tesouro quer aproveitar esta janela de oportunidade", diz. Rosa acredita que, no curto prazo, o dólar tende a continuar em baixa. "Os números da balança comercial estão muito bons." Para dezembro, ele prevê uma pequena apreciação do dólar, com as remessas de lucros e dividendos para o exterior e o vencimento forte de dívidas das empresas.