Título: Copom sinaliza que pode aumentar a dose de juros
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Fonte: Valor Econômico, 26/11/2004, Opinião, p. A-10

São reduzidas as chances de que a taxa de juros entre novamente em um ciclo de queda. No mercado financeiro, espera-se uma inflexão a partir, no mínimo, do fim do primeiro trimestre de 2005. E, a julgar pela ata da reunião do Comitê de Política Monetária, todas as indicações são de um novo empurrão para cima, provavelmente da mesma magnitude dos anteriores, ou 0,5 ponto percentual. Na ótica do Banco Central, cuja única preocupação é levar o IPCA para a meta ajustada de 5,1% no ano que vem, os fatores que propiciaram um arrefecimento na evolução dos preços em setembro não mais se repetirão - especialmente a forte contribuição dada pela desaceleração dos preços dos alimentos in natura. Dois novos fatores vieram a tornar ainda mais difícil uma avaliação mais positiva da trajetória da inflação pelo BC. Embora não seja uma certeza, o anúncio de que o Tesouro vai comprar perto de US$ 3 bilhões no mercado até meados de 2005 pode ter o efeito positivo de interromper a excessiva valorização do real. Se o dólar se mover para cima, na fronteira daquilo que os ministros da área econômica têm em mente e que foi vocalizado pelo presidente Lula en entrevista à agência Bloomberg - algo entre R$ 2,90 e R$ 3,10 - a contribuição do câmbio para a contenção dos preços deixa de existir. Diga-se de passagem que os recuos observados na cotação não tiveram grande influência em outubro, quando os índices apontaram altas em relação a setembro. Mas novas desvalorizações, mesmo que modestas, não facilitam a obtenção da apertada meta perseguida pelo BC. Aos obstáculos à queda a curto prazo da inflação se soma o aumento dos combustíveis determinado pela Petrobras ontem, de 4,2% para a gasolina e 8% para o diesel nas refinarias. Os efeitos dos reajustes, porém, tendem a se esgotar em dois meses e contaminarão pouco os índices de 2005. A decisão de aumentar mais uma vez a taxa Selic em mais 0,5 ponto percentual se baseou na elevação de todos os núcleos do IPCA. Diante da estabilização do ritmo de produção em setembro, a ata enfatiza menos que as anteriores o risco de uma perigosa defasagem entre a demanda e a capacidade de oferta. A prospecção dos dados preliminares de outubro também não dá margens a maiores preocupações nesse sentido. "Indicadores do desempenho da indústria apontam recuo da produção fabril em outubro, considerando o ajuste sazonal. A expedição de papelão ondulado, a produção de aço bruto, o número de pedágios de caminhões pesados em rodovias e a produção de autoveículos registraram quedas no mês, considerando dados dessazonalizados", avalia o Copom. Os recuos são considerados normais dentro de uma trajetória ascendente da produção. Os vilões da ata do Copom continuam sendo os mesmos - os preços industriais, que já evoluíram 17,5% em 12 meses. Entre eles destacam-se commodities com preços balizados no mercado externo, como ferro, aço, produtos de matéria plástica, combustíveis e seus derivados, sobre cujos preços os aumentos dos juros têm baixa eficácia direta. Mesmo assim, o Copom, como já vem se tornando uma tradição, enviou um recado de que pode vir a elevar os juros com força ainda maior se houver uma "exacerbação de fatores de risco". A ata cita entre eles uma eventual deterioração dos preços internacionais do petróleo e a manutenção da "rigidez" nas expectativas de inflação. Quanto a essas expectativas, elas continuam refletindo a mesma inquietação que aflige o Banco Central e mantêm-se estáveis há três semanas em 5,9%, segundo o boletim Focus. Cresce, porém, o ceticismo de que o BC consiga manter seu foco nos 5,1% sem que para isso precise elevar os juros a um nível muito superior ao atual. Os motivos são simples. Os preços monitorados são geralmente corrigidos pelo IGP ou IGP-M, que fecharão 2004 com evolução entre 11% e 12%. Como o seu peso no IPCA é de 29,1%, há uma herança inflacionária para 2005 de 3,49%, que obrigará os preços livres a se conterem na apertada camisa de força de 1,6% de variação anual - algo claramente inatingível sem que a economia sofra um esfriamento de razoáveis proporções. É neste sentido que a ameaça do Copom, de doses maiores de juros, faz sentido, embora a perspectiva seja aterrorizante. O custo político de uma decisão dessas é imenso e, em um ano de "realizações" como o de 2005, segundo prevê o presidente Lula, a margem para que o BC siga em frente com essa receita se aproximará do zero. É provável que logo o BC busque uma acomodação dos preços compatível com o teto da meta, de 7%, o que não seria nenhum desastre e pouparia sacrifícios desnecessários ao país.