Título: Mattoso deixa governo e é indiciado pela PF
Autor: Juliano Basile e Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 28/03/2006, Política, p. A8

O presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, confirmou à Polícia Federal que repassou o extrato bancário do caseiro Francenildo Costa ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Sua revelação foi decisiva para a saída de Palocci do cargo, ao citá-lo duas vezes no depoimento. Palocci pediu afastamento do cargo quinze minutos depois de Mattoso deixar a sede da PF, às 17h30. No início da noite, Mattoso, que havia pedido demissão ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva antes de depor, comunicou oficialmente sua saída. Depois do depoimento de Mattoso, o delegado responsável pela investigação, Rodrigo Gomes Carneiro, decidiu indiciá-lo por violação de sigilo funcional. Se condenado, poderá pegar de seis meses a dois anos de detenção. Palocci também poderá ser chamado a depor. Mas, como era ministro na época da quebra do sigilo do caseiro, e tinha foro privilegiado, o seu processo poderá correr no Supremo Tribunal Federal. Com o inquérito no STF, o depoimento de Palocci só poderá ser realizado depois do parecer do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, que pode demorar até 15 dias. Apesar de ter citado Palocci, Mattoso não admitiu que partiu do então ministro da Fazenda a ordem para violar o sigilo do caseiro e também negou ter sido ele o mandante do crime. "Não fui o responsável pelo vazamento da informação e estou convicto de que nenhum empregado da Caixa deu causa à divulgação indevida", disse Mattoso, em nota oficial. A versão do presidente da Caixa à PF é que o extrato de Francenildo começou a ser analisado internamente dentro da instituição porque o caseiro movimentou valores não condizentes com os seus ganhos. O extrato mostrou ganhos de R$ 25 mil e, cabe aos bancos, segundo a versão de Mattoso, acompanhar movimentações suspeitas acima de R$ 10 mil. Essa obrigação está prevista na Lei nº 9.613. De acordo com a PF, Mattoso recebeu o extrato de Francenildo das mãos do consultor especial da presidência da Caixa, Ricardo Schumann, num jantar na noite de 16 de março passado. Logo depois do jantar, Mattoso entregou um envelope com uma cópia do extrato a Palocci. Mattoso justificou a entrega do extrato a Palocci, alegando que o ministro da Fazenda era chefe hierárquico da presidência da Caixa. Segundo a sua versão, se a Caixa verificou uma possível irregularidade com um correntista, o fato deveria ser informado ao Ministério da Fazenda para acionar o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf, órgão subordinado ao Ministério da Fazenda, responsável por investigar movimentações bancárias suspeitas). Na manhã seguinte à entrega, o Coaf recebeu ordem para investigar Francenildo. À tarde, a revista "Época" revelou em seu site a movimentação de Mattoso. Schumann também depôs à PF e confirmou que pediu à superintendente da Caixa Sueli da Silva Mascarenhas que checasse a movimentação do caseiro. Sueli pediu o extrato de Francenildo ao gerente Jeter Ribeiro de Souza. O gerente confirmou à PF que acessou o sistema interno da Caixa, imprimiu o extrato e repassou cópia do documento para Sueli. A PF sabe, portanto, qual foi o caminho do extrato dentro da Caixa. Jeter deu o extrato a Sueli, que repassou o documento a Schumann, que enviou-o a Mattoso, que entregou o extrato a Palocci. Apesar de o caminho do extrato ter sido identificado, falta descobrir quem deu a ordem para que o sigilo fosse violado. Essa informação é importante para a condução do processo contra Mattoso e de uma eventual investigação contra Palocci. Mattoso apresentou uma defesa formal, pela qual pode se livrar de eventuais condenações na Justiça. Há, porém, pontos que ainda não foram esclarecidos - um deles, é o fato de a informação não ter sido transferido diretamente entre os órgãos técnicos da Caixa e do Coaf, como sempre ocorre nesses casos, sem necessariamente o presidente do banco tomar conhecimento. Outro ponto obscuro é o fato de as apurações na Caixa terem levado sete dias. Dentro da instituição, a informação é que houve uma tentativa de Palocci de fazer Mattoso assumir sozinho a culpa - com a qual ele não concordou.