Título: Fundos nanicos
Autor: Por Daniele Camba
Fonte: Valor Econômico, 28/03/2006, EU &, p. D1

O pequeno investidor aos poucos parte para outras alternativas de aplicação para o dinheiro que hoje está maciçamente na renda fixa. O interesse da pessoa física por ações cresceu brutalmente nos últimos dois anos, juntamente com o reaquecimento do mercado de capitais. Existe uma procura crescente nas operações de lançamentos de ações e na negociação via internet - o home broker. O mesmo não acontece, porém, com os fundos de ações. Essas carteiras ainda são minúsculas dentro do total do setor de fundos no Brasil. Mas a queda da taxa de juros deve ser o elemento que faltava para que esses fundos enfim deslanchem. Os fundos de ações voltados para o varejo (excluindo fundos de pensão e os abertos de previdência) hoje somam patrimônio de R$ 25,520 bilhões, segundo levantamento do site financeiro Fortuna. Isso representa apenas 4,8% do total do setor. E o percentual praticamente não evoluiu na última década. Desde 1996, ele varia entre 2% e 5%. O pico foi de 10,9%, em julho de 1997, antes da Crise da Ásia, num momento em que a valorização da bolsa ia de vento em popa. Desde 2003, com a valorização consistente da bolsa de valores, a participação das carteiras de renda variável vem lentamente evoluindo. De qualquer forma, ainda está longe de representar uma parcela importante do segmento de fundos no Brasil. Enquanto as carteiras de renda variável patinam, a participação da pessoa física dentro do volume de negócios da bolsa só fez crescer. Neste mês, o investidor individual responde por 25,6% de todas as compras e vendas de ações na Bovespa, enquanto que, em 1994, essa fatia era de apenas 9,7%. A onda de aberturas de capital, que começou em 2004, com a estréia da Natura no pregão, contribuiu muito para o crescimento da pessoa física na bolsa e não via fundos. "As pessoas compraram ações nas operações de abertura de capital e depois resolveram continuar administrando sozinhas suas carteiras", diz o superintendente de renda variável do Itaú, Walter Mendes. O crescimento do home broker também comprova que a pessoa física tomou gosto por administrar seu dinheiro por conta própria. Apesar de partir do zero em 1999 - conseqüentemente com uma taxa de crescimento muito grande -, as operações via internet já respondem por 4,94% volume total da Bovespa e 18,44% do número de negócios. Para conquistar esse público, as corretoras oferecem pacotes com descontos na taxa de corretagem e de custódia dos papéis. O investidor, no entanto, não percebe que isso só é mais barato que a taxa de administração dos fundos de ações, que varia entre 1,5% e 4% ao ano, se girar pouco a carteira durante o ano, lembra Mendes. Se fizer apenas uma operação por mês, pagando 0,5% de corretagem, por exemplo, irá desembolsar 6% ao ano. Mais do que os custos maiores com corretagem, cuidando sozinho de suas ações o investidor perde por abrir mão de um gestor profissional que conhece muito melhor o mercado acionário, acredita Mendes. Enquanto as corretoras se esforçam para trazer as pessoas físicas para a bolsa - seja comprando ações individualmente pelo home broker, ou participando de clubes de investimento, que também cresceram muito nos últimos anos - não existe uma cultura entre os grandes bancos de oferecer fundos de ações para o varejo. Para Marcelo D'Agosto, sócio do site Fortuna, esse é o principal motivo de essas carteiras continuarem nanicas frente ao tamanho do setor de fundos no país. "O investidor responde bem quando existe uma forte campanha de venda de fundos de ações por parte dos bancos", diz D'Agosto. Para ele, a maior prova disso é a captação dos fundos de recursos próprios de Vale do Rio Doce, de Petrobras e do fundo Papéis Índice Brasil Bovespa (PIBB) - três produtos amplamente divulgados - muito superior às aplicações das demais carteiras de ações. Para se ter uma idéia, entre maio de 2005 e este mês, até o dia 23, enquanto os fundos de ações tiveram captações líquidas (aplicações menos resgates) de R$ 91 milhões, as carteiras de Petrobras e Vale captaram R$ 985 milhões e os fundos de cotas (FICs) de PIBB, mais de R$ 1 bilhão durante a segunda oferta feita pelo BNDES. Algumas mudanças tributárias recentes também estimularam o investidor a aplicar diretamente em ações e não via fundos. A primeira é a isenção de imposto de renda na venda de ações até R$ 20 mil mensais. Esse benefício ajuda em cheio o investidor que opera pequenas quantias. Os percentuais diferentes de imposto de renda - entre 22,5% e 15% em fundos de renda fixa e apenas de 15% em renda variável - também dificultam a compensação dos ganhos obtidos numa carteira com as perdas acumuladas em outra. É natural que o reaquecimento do mercado de capitais se dê primeiramente com a volta do investidor especializado, que administra sozinho suas ações, diz o diretor de renda variável e multimercado da Unibanco Asset Management (UAM), Pedro Bastos. Ele acredita que a próxima onda de aplicações trará o investidor comum, que nunca aplicou em bolsa, e que deve estrear por meio dos fundos de ações dos grandes bancos de varejo.