Título: Papéis prefixados no Brasil: uma proposta ainda atraente
Autor: Paulo Tenani
Fonte: Valor Econômico, 28/03/2006, EU &, p. D2

Os juros estão caindo no Brasil - e caindo muito rapidamente. Desde o início de novembro de 2005, quando se iniciou este último "rally" dos fundos prefixados, a taxa de um ano cedeu 2,8 pontos percentuais, para abaixo dos 14,8%, um movimento que foi seguido bem de perto por todos os outros vencimentos da curva local de juros. Com os juros em queda, o desempenho do mercado de renda fixa brasileiro foi simplesmente estrelar. No período, o índice IRF-M, um referencial para os fundos prefixados, rendeu 8,35%, muito acima do retorno de 6,77% proporcionado pelo CDI - a "proxy" brasileira para a taxa livre de risco. Ou seja, na terminologia do mercado, onde tudo é medido com relação ao CDI, o índice IRF-M rendeu generosos 123% do CDI no período - um desempenho bastante superior à sua média histórica de 105%. Mas o que esperar dos fundos prefixados nestes próximos meses? Existiria espaço para os juros caírem ainda mais e o desempenho dos prefixados, novamente, superar aquele do CDI? Estas são questões que vêm incomodando os analistas de mercado. Afinal, com os juros longos já apontando para uma taxa básica Selic em 14,5% em dezembro de 2006, e 13,8% ao fim de 2007, os prêmios, por uma perspectiva histórica, já parecem bastante magros. E, se isto não bastasse, a curva de juros local está invertida - na verdade muito invertida - de tal maneira que as taxas mais longas já estão consideravelmente abaixo das mais curtas. Neste sentido, para aqueles investidores acostumados a medir o desempenho em termos de CDI, o carregamento age na direção contrária - destruindo valor. Por exemplo, para uma aposta na taxa prefixada de um ano, agora em 15% - e, portanto, bem abaixo do CDI de 16,5% - o carregamento impõe uma perda de 1,50 ponto percentual ao ano em relação ao CDI. Ou, na terminologia de mercado, a taxa de um ano está em a 91% do CDI. Portanto, para que os fundos prefixados continuem a superar o CDI, as taxas de juros não podem ficar inalteradas. Elas, na verdade, terão de cair - e cair fortemente - para que o ganho de capital mais do que compense o carregamento negativo. E aqui cabe a questão: existe espaço para as taxas de juros caírem ainda mais? Pode ser que sim. Pelas nossas estimativas, a taxa Selic tem condições de ceder até o patamar de 10% em 2007, muito abaixo dos 13,8% esperados pelo mercado. Parece otimista não é? Mas talvez nem seja tanto assim. Afinal, o Brasil é o único dos países emergentes onde as taxas de juros domésticas ainda não caíram na proporção justificada pela queda dos "yields" - as taxas de juros em dólares da dívida externa soberana. E, como os "yields" brasileiros já cederam 7 pontos percentuais em relação à sua média histórica, para seu nível mínimo de 6,5% ao ano, a taxa Selic poderia muito bem, por arbitragem, cair para 10% em 2007 - e ainda assim compensar todos os riscos e custos de se investir domesticamente. Os cálculos agora são simples. Com a Selic em 10% ao fim de 2007, uma aposta na taxa prefixada de um ano poderia muito bem render 2 pontos percentuais acima do CDI até o fim de 2007 - ou, na terminologia local, 115% do CDI do período. É um retorno bastante generoso, que sugere que o "rally" no mercado de prefixados, enquanto já bastante forte, chegou apenas à sua metade. Mas aqui cabe uma consideração. Desde 1996, quando inicia-se a série histórica do risco-Brasil, os "yields" da dívida externa soberana foram, em média, de 13,5% ao ano - um nível bastante elevado que impunha forte limitação sobre o quanto os juros poderiam ceder. Neste sentido, não é de surpreender que toda vez que a Selic caísse abaixo de 17,5% - e ficasse simplesmente muito barato apostar contra o real - uma bolha especulativa explodisse no mercado de câmbio. Talvez seja esta perspectiva histórica - de um Brasil pagando "yields" de 13,5% ao ano - além da crise política de 2002, que ainda afetem as projeções dos analistas de mercado, que prevêem uma Selic a 13,8% em 2007. Porém, a previsão do mercado talvez seja muito pessimista. E os prêmios embutidos na curva local de juros - muito magros por uma perspectiva histórica - talvez sejam, na verdade, bastante generosos. Afinal, com "yields" a 6,5% ao ano, a possibilidade de uma Selic a 10% em 2007 simplesmente não pode ser descartada. Ou seja, apesar do forte "rally" destes últimos meses, da deterioração do cenário político e do carregamento negativo, os fundos prefixados continuam a ser, em nossa opinião, uma aposta bastante atraente.

Paulo Tenani é estrategista do UBS Wealth Management e professor de Finanças Internacionais da Fundação Getúlio Vargas E-mail paulo.tenani@ubs.com Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.