Título: Palocci pode ser investigado pela justiça comum
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2006, Especial/ Mudança ministerial, p. A4

O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, acredita que a demissão de Antonio Palocci pode reduzir a crise política envolvendo o governo, com constantes denúncias de corrupção, mas não evitará a continuidade das investigações sobre a conduta do ex-ministro da Fazenda na quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. "Acho que ele precisa ser investigado e vai ser investigado", disse Bastos, durante evento de comemoração dos 62 anos da Polícia Federal. O ministro da Justiça declarou, ontem, que a Polícia Federal se manterá firme nas investigações sobre a conduta de Palocci no episódio do caseiro. Ele elogiou a atuação da PF que, rapidamente, iniciou a apuração do caso, ouvindo depoimentos dos funcionários da Caixa Econômica Federal que tiveram acesso à conta de Francenildo e do então presidente da instituição, Jorge Mattoso. Para Bastos, a PF deu uma aula de isenção. "A Polícia Federal se transforma cada vez mais numa polícia de Estado, que não está aí para servir o governo. Não está aí nem para perseguir nem para proteger. Trabalha em proveito do Estado brasileiro, impessoal e republicana, forte, firme, respeitadora, mas implacável nas investigações". Bastos evitou o raciocínio de que o presidente Lula saiu enfraquecido com o episódio da quebra do sigilo e as conseqüentes demissões de Palocci e de Mattoso. "O que enfraquece o candidato é ele não ter votos, não ter a confiança da população", desconversou o ministro da Justiça. No Supremo Tribunal Federal, ministros que antes acreditavam que as investigações contra Palocci subiriam diretamente ao tribunal pelo fato de ele ter foro privilegiado, disseram, ontem, reservadamente, que, com a demissão, Palocci será investigado pela Justiça comum. Os ministros explicaram que, em setembro do ano passado, o STF decidiu, por sete votos a três, que ex-detentores de cargos públicos perdem o foro privilegiado assim que deixam o cargo. Logo, a maioria dos ministros do STF entende que, a partir de ontem (data da publicação da demissão no "Diário Oficial"), Palocci deverá responder a todas as acusações que pesam contra ele (a quebra do sigilo de Francenildo e as suspeitas de desvio de dinheiro público em Ribeirão Preto) na Justiça comum. No caso de Francenildo, o ex-ministro poderá ser processado pelos crimes de prevaricação (deixar de cumprir a lei em proveito pessoal) ou condescendência criminosa (deixar que seu subordinado pratique crime). O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, encaminhou o caso de Francenildo aos procuradores Gustavo Pessanha e Livia Tinoco que atuam na 1ª instância da Justiça. Caberá a eles decidir se entram com denúncia contra Palocci. A Polícia Civil e o Ministério Público estadual esperam apenas Palocci decidir onde vai fixar residência para intimá-lo a depor. No MP, segundo o promotor do Gaerco Aroldo Costa Filho tramitam cerca de 50 inquéritos que envolvem o nome de Palocci: "Parece brincadeira, mas é verdade. Os inquéritos e vão desde contratação irregular até o projeto do Vale dos Rios". Vale dos Rios foi um projeto da segunda gestão de Palocci em Ribeirão Preto e que previa a revitalização do centro da cidade. Há registro de gastos de R$ 2 milhões, mas nada foi construído. "Estamos procurando entrar em contato para marcar os depoimentos. Com a demissão podemos investigar com mais facilidade", salientou Costa Filho. Já o delegado de Ribeirão Preto, Benedito Valencise, pretende convocar o ex-ministro "nos próximos dias". "Ele deve ser intimado e interrogado. Com base em documentos que comprovam a participação dele nos crimes também podemos indiciá-lo. Agora ele é um cidadão comum que pode ser indiciado e interrogado", garante o delegado. Palocci precisará de um habeas-corpus para comparecer a esses depoimentos sem correr o risco de ser preso. (Com agências noticiosas)