Título: Crescimento sem receita de bolo
Autor: Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2006, Finanças, p. C16

O prêmio Nobel de Economia Douglass North está no Brasil para falar sobre desenvolvimento econômico sem a tradicional "receita de bolo" que tantos economistas adoram prescrever a países de terceiro mundo. "A teoria de desenvolvimento econômico como conhecemos está errada. Não adianta aplicar uma receita única a partir de preceitos como o consenso de Washington", afirma North, ganhador do prêmio Nobel de 1993 por seu trabalho sobre a relação entre instituições e desenvolvimento. Rogerio Pallatta/ Cia de Foto/ Valor Douglass North, prêmio Nobel de Economia em 1993, critica a aplicação radical do consenso de Washington O problema, segundo o professor da Universidade de Washington, é que os economistas que prescrevem o receituário do consenso partem do pressuposto, errado, de que todos os países estão saindo do mesmo ponto. "Algumas das medidas preconizadas pelo consenso funcionariam para avançar o desenvolvimento nos Estados Unidos, mas não necessariamente produzem os mesmos efeitos em outras economias com características diferentes", disse North ao Valor por telefone, pouco antes de embarcar para uma viagem ao Brasil para participar da 47 ª Reunião Anual do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Belo Horizonte, e de eventos no Rio. North debaterá, sexta-feira, a atuação dos bancos de desenvolvimento na América Latina, com o também prêmio Nobel Joseph Stiglitz e com John Williamson, do Institute of International Finance (IIF). A assembléia do BID terá a primeira reunião plenária segunda-feira, mas, as inscrições começam hoje, assim como uma série de seminários. North diz que, em sua passagem pelo país procurará não dar conselhos ao Brasil por não conhecer em profundidade a economia, mas espera poder prover instrumentos a pesquisadores que possam estudar a fundo as mudanças institucionais que seriam necessárias no Brasil para incentivar o desenvolvimento. "O objetivo deve ser atingir o que eu chamo de uma sociedade de livre acesso, competitiva e que incentive o aumento de produtividade e a inovação. Os caminhos para chegar a isso são diferentes em cada país, porque cada economia tem um grupo de instituições próprio, herdado das circunstâncias que formaram aquele país". Também não há um mecanismo único de transformação destas instituições. Um dos principais entraves à transformação das instituições e promover o desenvolvimento, acredita North, é o privilégio conseguido por influência política de grupos que representam interesses restritos. Os grupos de interesse trocam apoio econômico a determinados grupos políticos por proteção contra a competição. "É um problema difícil de resolver, porque você se livra de um grupo com determinado privilégio e logo surge outro para ocupar o lugar". As instituições devem ser desenhadas para dar incentivos à competição e produtividade das organizações. Se as instituições recompensam a pirataria, naturalmente surgirão organizações piratas para apoderar-se dessa recompensa. Se a atividade produtiva é recompensada institucionalmente, a tendência é de florescimento de organizações produtivas. Enquanto a América Latina olha frustrada para suas taxas de crescimento pífias apesar de ter seguido boa parte do receituário de reformas econômicas, North acredita que a própria heterodoxia da China e Índia possa ser responsável pelos melhores resultados obtidos por estes países. Os bons resultados econômicos da China, acredita North, devem-se ao fato de que o país buscou soluções próprias para os problemas específicos de sua sociedade, como a grande população camponesa. Assim, as reformas econômicas adotadas não se encaixam no receituário ortodoxo. "Eles têm sido muito pragmáticos e criativos, adotando políticas para lidar com os seus problemas específicos. Mas isso não quer dizer que eles não tenham problemas sérios e grandes riscos. A corrupção está crescendo muito na China e é um problema que terá que ser enfrentado", diz North, que estudou a fundo a transição paulatina do país para uma grande plataforma de exportação mundial. "Mas já enfrentaram problemas em outros momentos e foram aprendendo com os próprios erros". Do ponto de vista puramente de condições para reforma econômica, o fato de a China viver sob uma ditadura política representa uma vantagem - os ditadores simplesmente ignoram os interesses de determinados grupos, que não têm liberdade para protestar contra perdas impostas por reformas institucionais.