Título: O fator Mantega
Autor: Adriana Cotias, Angelo Pavini, Daniele Camba e Dan
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2006, EU &, p. D1

A reação negativa dos investidores no primeiro dia após a nomeação de Guido Mantega como ministro da Fazenda já reflete a expectativa de maior volatilidade e aumento do risco dos mercados no curto prazo. Ontem, o dólar comercial avançou 1,75%, fechando a R$ 2,2090 e o Índice Bovespa recuou 2,55%. Segundo gestores, ainda são incertas as alterações da política monetária no longo prazo e a maioria recomenda cautela. "O que o ministro diz agora é retórica para acalmar os mercados. Ele deve colocar o dedo na ferida dos juros, do superávit fiscal e do câmbio. Fernando Pinto Ferreira, sócio da Global Invest O consenso é que a instabilidade deve continuar enquanto Mantega não der sinais concretos de que não mudará a política econômica. O grande temor é que o novo ministro coloque em prática uma queda mais forte dos juros, causando um aumento na inflação, e menos compromisso com o superávit fiscal. Outra preocupação dos analistas é com relação às declarações de Mantega. "Ele costuma falar o que pensa, só que agora, como ministro da Fazenda, cada vez que fizer isso o investidor estrangeiro se assusta e tira o dinheiro", diz o diretor de um banco que pediu para não ter seu nome citado. Apesar da afirmação do novo ministro em manter a política monetária, o mercado prefere esperar o discurso virar fato para acreditar. "Ainda soam claramente nos ouvidos dos analistas as fortes críticas de Mantega ao desempenho do Ministério da Fazenda", diz Newton Rosa, economista da SulAmérica. A única certeza neste momento é o aumento da volatilidade, diz Marcelo Karvelis, sócio-gestor da Claritas Investimentos. Por ora, deverão ser observadas as reações do ministro às pressões pela queda maior dos juros, que ele mesmo defendia, e a composição da equipe econômica. "No longo prazo, porém, a dúvida mais importante para o investidor é como a questão fiscal vai ser tratada pelo novo ministro, especialmente em um ano eleitoral", diz Karvelis "Não é momento para especulação de curto prazo, que pode resultar em prejuízos. A mudança pode frear o ritmo de redução do juro prefixado". Marcelo Mesquita, economista-chefe do banco UBS Um possível aumento dos gastos do governo é o principal fator de preocupação, diz Marcelo Cabral sócio da Neo Investimentos. "Por isso o investidor precisa ser mais conservador." Alguns mercados já colocaram no preço esse risco, como câmbio e juros, mas a bolsa ainda não, influenciada pelo mercado internacional positivo. Assim, pode ser o momento para o investidor reduzir posições. A mudança apresentada parece mover o governo de uma posição mais "conservadora" para um perfil mais pró-desenvolvimento, diz Karvelis, da Claritas. Para a bolsa, isso é até bom, pois haveria mais crescimento, diz. O risco é o processo não ser bem conduzido do lado fiscal, o que poderia trazer de volta a inflação e abalar o avanço contínuo da economia. "A chave de tudo é postura fiscal, não os juros", resume Karvelis. Apesar desse otimismo com a bolsa, não é momento para especulação de curto prazo, que pode resultar em prejuízos, alerta Marcelo Mesquita, economista-chefe do Banco UBS. Para ele, as mudanças podem também frear por algum tempo a redução das taxas dos títulos prefixados, que trouxe fortes retornos para fundos de renda fixa e multimercados. No entendimento de Karvelis, da Claritas, a entrada de Mantega muda a tendência de valorização contínua do real em relação ao dólar. "Mas não deverá ser uma mudança tão radical, o dólar não sobe muito além dos R$ 2,30", diz. Já o sócio da Mauá Investimentos e ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, Luiz Fernando Figueiredo, é do grupo que acredita que nada irá mudar na condução da política econômica. "Mantega veio substituir Palocci, que teve que sair por outros motivos e não por insucesso na economia, portanto, terá a missão de dar continuidade ao que estava sendo feito", diz. A reação negativa dos mercados ontem, na visão dele, é apenas uma reacomodação das posições dos investidores. Ele acredita que a bolsa deve retomar a alta e os juros e o dólar voltarão a cair, movimentos que podem criar oportunidades de compras a preços atraentes. "Estou aproveitando para comprar", diz João César Tourinho da Black River Asset Management. Ele também aposta na continuidade da política econômica, mas acredita que teremos um mês turbulento. Mas há quem diga que o risco de mudança de rota na nova política econômica é real. "O que o ministro Mantega está dizendo agora é retórica para não chocar os mercados", diz Fernando Pinto Ferreira, da Global Invest Asset Management. "Ele deverá colocar o dedo na ferida em relação ao câmbio flutuante, aos juros e aos superávit primário." Como gestor, a estratégia adotada por Ferreira é ficar no menor prazo possível. Ele acredita também que será o cenário externo que vai definir a tendência dos mercados brasileiros, especialmente dólar e bolsa. Mas lembra que o investidor estrangeiro continua investindo em países considerados problemáticos, como Argentina, Venezuela ou Nigéria. "O mercado está tateando no escuro pois ainda não está claro que a política econômica não será alterada. Por isso, o momento é de evitar risco." Newton Rosa, economista-chefe da SulAmérica