Título: PFL assume Orçamento de R$ 98 bilhões em São Paulo
Autor: César Felício e Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 31/03/2006, Política, p. A10
O PFL sai hoje da posição de coadjuvante em São Paulo para administrar um Orçamento somado de R$ 98 bilhões, do governo paulista e da prefeitura de São Paulo, com a renúncia do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e do prefeito José Serra (PSDB), sucedidos respectivamente por Claudio Lembo (PFL) e Gilberto Kassab (PFL). A fatia de Lembo é a menos atraente: dos R$ 81,29 bilhões de verbas, R$ 9 bilhões são previstos para investimentos, um número que impressiona apenas na aparência: como é ano eleitoral, Lembo está proibido de contratar qualquer obra ou serviço novo em seu curto governo de nove meses. Já Kassab, terá R$ 2,4 bilhões dos R$ 17 bilhões de Orçamento da prefeitura para investir, além de um superávit de receita de R$ 450 milhões. Como não há eleição em nível municipal, não terá qualquer restrição para gastar. O governador de São Paulo a partir de hoje é o primeiro conservador sem medo do rótulo a gerir o Estado desde 1983. Indagado há cerca de um ano sobre qual a sua principal diferença do titular, o tucano Geraldo Alckmin, o vice-governador Claudio Salvador Lembo (PFL) foi preciso: "o Alckmin tem o apoio das classes médias conservadoras, mas vem de uma linhagem e de uma história social-democrata. Sou um conservador de valores, como o povo brasileiro", disse. Lembo pertence, dentro do partido, ao mesmo grupo político do vice-prefeito paulistano, Gilberto Kassab, que deve assumir o governo municipal ainda hoje. É a mesma ala que incorporou recentemente o presidente da Associação Comercial de São Paulo, Guilherme Afif Domingos e que no passado teve o ex-prefeito paulistano Olavo Setúbal como expoente. Dentro deste grupo, é Kassab que tem o papel protagonista, graças à sua função articuladora. Trata-se de um grupo que nunca conseguiu se firmar eleitoralmente em São Paulo e, a contragosto, aliou-se preferencialmente ao malufismo nos anos 90 e ao PSDB atualmente. Oriundo do PL, Kassab ingressou no PFL em 1995, com a missão de reorganizar o partido em São Paulo depois de uma mal-sucedida tentativa de se afastar do malufismo. Foi um dos arquitetos da aliança do PFL com Maluf para apoiar a eleição de Celso Pitta em 1996 e a candidatura do próprio Maluf para governador em 1998, com total aval da direção nacional da sigla. Articulou a escolha de Lembo como vice de Alckmin em 2002. Sua desenvoltura nas máquinas partidárias manifestou-se precocemente. Em 1989, com 28 anos, Kassab atuou para levar o extinto PDC a abandonar a candidatura presidencial de Ronaldo Caiado para apoiar Afif, que concorria pelo PL. Na véspera da convenção pedecista, Kassab encontrou-se com o maior aliado de Afif no PDC, o então deputado pernambucano Severino Cavalcanti. Os dois decidiram entrar em contato por telefone com todos os convencionais do partido, logo pela manhã. Severino sugeriu que Kassab ligasse para os convencionais fazendo-se passar por Afif, a quem praticamente ninguém conhecia. Kassab aceitou prontamente. O PDC ficou com Afif. O trabalho interno não é o traço forte de Lembo, que se destacou pela lealdade aos dirigentes maiores da sigla. Em 1989, abandonado por todos, o ex-vice-presidente Aureliano Chaves foi candidato presidencial pelo PFL, obtendo apenas 1% dos votos. Lembo era o vice. Em 1978, aceitou ser candidato a senador pela Arena paulista em uma eleição perdida. No contato pessoal, o católico praticante chama atenção pela mordacidade, até com aliados. "Cesar Maia esteve no exílio com o Serra, traz daquele tempo esta coisa de atirar na pequena-burguesia pelas costas", brincou à época em que o prefeito fluminense, pré-candidato presidencial pelo PFL, apoiou Serra. A avaliação feita pela oposição petista na Câmara Municipal é que a situação financeira que Kassab terá é mais confortável do que a recebida por Serra. O prefeito contingenciou recursos no começo de seu governo, renegociou contratos e a maior parte dos investimentos só começou a ser feita no fim do ano passado. No governo municipal, a primeira dificuldade virá da área de transportes. Kassab será o portador das más notícias. O aumento da tarifa urbana de ônibus ficou para ser anunciado pelo pefelista. A área, menina dos olhos da gestão passada, teve queda em sua avaliação e empresários do setor pressionaram o governo por reajustes e repasses maiores paralisando a frota. Em só uma greve deste ano, mais de 727 mil passageiros foram prejudicados. Outras dificuldades deverão vir das pastas de Educação e Finanças. Na negociação da dívida deixada pela gestão anterior, de Marta Suplicy (PT), grandes empresários tiveram suas dívidas escalonadas até 2007 e pressionam pelo pagamento antecipado. Os professores das escolas públicas entraram em greve nesta semana e paralisaram as atividades de cerca de 50% das escolas. Nos nove meses de governo que terá à frente do Palácio dos Bandeirantes, um dos maiores desafios de Lembo será a segurança pública. Nas duas últimas semanas, foram oito rebeliões no sistema prisional. Desde o começo do ano, 30 motins comandados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC). Outro problema está na recuperação dos menores infratores. Na Fundação do Bem Estar do Menor (Febem) a polícia enfrentou duas rebeliões e no ano passado a entidade teve recorde de fugas, com média de uma rebelião por semana no primeiro semestre.