Título: Para FHC, credibilidade depende de Lula
Autor: Raymundo Costa e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 31/03/2006, Política, p. A12

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acha que "dependerá da capacidade do presidente" Luiz Inácio Lula da Silva e do novo ministro da Fazenda, Guido Mantega, manter a credibilidade da política econômica. FHC, apesar de ter apontado a menor confiança do mercado em Mantega durante palestras ontem em Washington, disse que "não quer julgar" o substituto de Antonio Palocci. "Se o presidente quiser manter a linha da política econômica ele manterá", afirmou, lembrando que a preocupação, num ano eleitoral, é com a pressão por aumento de gastos públicos. Disse que Mantega "pode criar a credibilidade com suas ações", e que não queria julgá-lo antes de ocupar o cargo. Sobre as opiniões de Luiz Carlos Mendonça de Barros, disse que ele pode julgar Mantega "porque é economista, eu não sou". Apesar do tom conciliatório na entrevista com jornalistas, Cardoso não poupou o governo Lula em suas palestras. Numa palestra em inglês no Carnegie Endowment for Peace, think tank em Washington, disse que a perda de Palocci para o governo é "duplamente ruim" pelo escândalo no qual o ministro foi envolvido, mas também porque Palocci era "o grande cara" preferido pelos mercados, enquanto Mantega não tem a mesma confiança. Disse que o episódio de quebra de sigilo do caseiro que depôs contra o ex-ministro foi "inaceitável" e demonstrou "autoritarismo". Depois, numa análise sobre a esquerda latino-americana na Organização dos Estados Americanos (OEA), Cardoso disse que a falta de reformas políticos e a exclusão social abrem espaço para populistas e "salvadores da pátria". Perguntado por um diplomata do Panamá sobre "o que se pode fazer para combater os líderes messiânicos", Cardoso respondeu: "Ah, se eu soubesse teria feito", provocando risos. O ex-presidente diferenciou os governos de esquerda da Argentina, Chile, Brasil e Uruguai dos esquerdistas andinos. Nenhum desses governos ameaça regras constitucionais nem muda a integração destes países à economia mundial. Disse estar preocupado com a situação na Venezuela e diz que o país tem uma oportunidade histórica de mudar a estrutura de sua economia com as receitas do petróleo, e se isso não for feito o governo Chávez poderá ser visto como uma perda de tempo. Disse que o governo de Evo Morales, ao optar pela nacionalização das reservas de gás, "está desperdiçando uma oportunidade de fazer uma negociação altiva sobre o uso de seus recursos" e adotando uma medida antiga que representa "olhar no retrovisor ao invés de olhar para frente".