Título: Ministério quer recuperar verbas desviadas
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 29/11/2004, Brasil, p. A-4

O governo abriu 114 processos de cobrança administrativa para recuperar mais de R$ 1 bilhão de empresas que tomaram recursos da extinta Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). A expectativa é recuperar uma parcela dessas verbas, destinadas para projetos que foram auditados e tiveram irregularidades identificadas, antes de cobrar as dívidas na Justiça. Boa parte dos casos envolve mau uso de dinheiro público. Os financiamentos e convênios assinados com a antiga Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) também estão na mira do governo. As duas superintendências foram fechadas no final de 2002, após um vendaval de escândalos de corrupção. Elas atuavam nas regiões Norte e Nordeste e faziam desembolsos em condições favoráveis para impulsionar o desenvolvimento nas respectivas regiões. As cobranças estão sendo feitas pela Unidade de Gerenciamento dos Fundos de Investimento (UGFIN). O órgão surgiu em janeiro deste ano, vinculado ao Ministério da Integração Nacional, para administrar os 941 projetos remanescentes das extintas Sudam e Sudene, todos incentivados por dois fundos de investimento: o da Amazônia (Finam) e o do Nordeste (Finor).

Os trabalhos estão mais adiantados no caso do Finam. Muitos dos projetos vinculados à Sudam já tinham sido cancelados e auditados, o que agilizou os procedimentos de recuperação dos recursos. De um total de 743 projetos herdados, apenas 42 estão em situação regular, o que permitiu a implementação e continuidade dos convênios. A unidade do Ministério da Integração Nacional cancelou outros 134 projetos e já abriu processo de cobrança administrativa para 114 deles. Somadas, essas cobranças alcançam R$ 1,050 bilhão. "O empreendedor tem ampla possibilidade de defender-se", afirma o gerente-geral da UGFIN, Antônio Balhmann. A intenção é resolver esses processos no âmbito administrativo. Existem vantagens para isso. Se houver resistência por parte dos antigos tomadores de recursos, passa-se o caso para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, que aciona a Justiça. "A regra vai ser a disputa judicial, mas há iniciativas de devolução", informa Balhmann. Há cobranças individuais altas, de até R$ 160 milhões, mas a média fica entre R$ 5 milhões e R$ 15 milhões. "Alguns empreendedores preferem acertar logo as contas e sair do sistema para não ficar numa briga judicial em que os argumentos jurídicos do governo são fortes", diz o gerente-geral. Há articulações com o departamento do Ministério da Justiça responsável pela recuperação de ativos. Se os bens do empreendedor contestado forem úteis para o governo, dá-se a opção de entrega do patrimônio, em vez de um acerto totalmente financeiro. É o caso de fazendas e galpões de depósito abandonados, que podem transformar-se em complexos esportivos e escolas públicas. Para as empresas, muitas vezes é negócio pagar rapidamente. Elas só podem obter novos financiamentos com a demonstração de certidão negativa de crédito. À medida que avançarem os cancelamentos de projetos - industriais, agropecuários, agroindustriais e de turismo -, o valor das cobranças aumentará. Balhmann estima que o total, incluindo Finam e Finor, chegará a mais de R$ 4 bilhões no fim de 2005. Há ainda 453 projetos ativos remanescentes da antiga Sudam, que devem ser analisados. A perspectiva é de que muitos sejam cancelados e entrem em cobrança administrativa. No caso da Sudene, os procedimentos são mais lentos. De um total de 198 projetos, foram cancelados 54. Outros sete receberam aval para implementação e 127 permanecem ativos - embora, desses, pelo menos 21 estejam prontos para serem cancelados. Mas a situação deve mudar no ano que vem, afirma Balhmann. Até dezembro de 2005, ele acredita que 100 projetos estarão em cobrança administrativa e 48 terão sido cancelados. Enquanto isso, continua no Congresso o projeto de lei complementar que recria Sudam e Sudene, com novos parâmetros. Enviado pelo Ministério da Integração Nacional há mais de um ano, só em agosto passado ele foi para análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O ministro Ciro Gomes já pediu ao presidente do Congresso, José Sarney (PMDB-AP), maior agilidade dos parlamentares na tramitação do projeto.