Título: Eleições e crise comprometem as votações na Câmara e no Senado
Autor: Thiago Vitale Jayme e Raquel Ulhôa
Fonte: Valor Econômico, 03/04/2006, Política, p. A8

O ano de 2006 promete ser um fracasso de votações na Câmara e no Senado. A crise política aliada ao acirramento precoce do clima eleitoral no Congresso já atrapalha os trabalhos dos plenários das duas Casas e demonstra as dificuldades de se votar matérias relevantes nos próximos meses. Depois de uma convocação extraordinária marcada pelo alto volume de propostas apreciadas, os parlamentares não conseguiram aprovar mais do que poucos projetos importantes desde a volta dos trabalhos efetivos, a partir de 15 de fevereiro. Dois fatores fundamentais atrapalham os trabalhos na Câmara. O principal é a votação dos pedidos de cassação dos deputados acusados de envolvimento com o valerioduto. O presidente da Casa, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), reservou as quartas-feiras - dia de maior quórum e o mais produtivo do plenário - para a votação dos processos de perda de mandato. Com tais votações, as sessões de quinta têm sido pouco produtivas devido ao acirramento político causado pelos julgamento dos colegas. Somado ao julgamento dos "mensaleiros", a Câmara já vive o clima eleitoral. Com a demora na votação do Orçamento de 2006, o governo baixou diversas medidas provisórias de crédito extraordinário para projetos de ministérios. A paralisação pela falta de recursos orçamentários seria uma tragédia do ponto de vista eleitoral. Desde o fim da convocação extraordinária, a Câmara teve 15 dias de sessões deliberativas, dos quais 11 estavam bloqueadas por MPs. E como a maioria das medidas provisórias enviadas pelo governo tratam de liberação de dinheiro, a oposição obstruiu os trabalhos. O líder da minoria, José Carlos Aleluia (PFL-BA), prevê um ano fraco de votações. "As crises políticas do Executivo e do Legislativo, o volume de MPs sem sentido e as eleições vão comprometer o ano no plenário", avalia. De 15 de fevereiro até a semana passada, quatro MPs foram aprovadas. Uma era a MP do Simples. As demais liberavam créditos aos ministérios dos Transportes, Agricultura e Integração. Nos próximos dias, quatro MPs trancam a pauta. Uma é de abertura de crédito de R$ 890 milhões para a construção de casas populares e demonstra o clima eleitoral do Congresso: os deputados apresentaram 624 emendas ao texto, na tentativa de garantir benefícios às bases. Além da MP do Simples, a Câmara aprovou apenas a alteração na legislação eleitoral para baratear as campanhas políticas e a Timemania (ainda não votada completamente pelos deputados). Ainda estão pendentes a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, o projeto de cotas nas universidades e a mudança na Lei de Portos Secos. A Câmara também não conseguiu aprovar o salário mínimo e o governo teve de editar uma MP. No Senado, a situação é pior: desde 22 de fevereiro, os senadores só aprovaram a indicação da ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), ao Conselho Nacional de Justiça. Oito MPs trancam a pauta. Os líderes dos partidos governistas e da oposição já tentaram fazer vários acordos para que o plenário vote e desobstrua a pauta, mas o processo é sempre interrompido por um bate-boca ou troca de acusações. "Estamos há um mês sem votar nada. Temos de contornar os problemas políticos e retomar as votações", reclamou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). O líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), faz coro: "Isso não pode continuar. A cada sessão, ocorre um pequeno incidente que passa a ser hegemônico. Vamos retirar um pouco esse tom acusatório para retomar aquilo que é a essência no Parlamento".