Título: Argentina cresce, mas ainda não recupera nível pré-crise
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 29/11/2004, Internacional, p. A-9

A expectativa da maioria dos analistas é que a Argentina encerre 2004 com um crescimento próximo a 8%, mas mesmo com esta cifra, a expansão não será suficiente para que a economia do país retorne aos níveis anteriores à recessão iniciada no final de 98. Em termos absolutos e em pesos, o PIB argentino esteve no seu nível mais alto no segundo trimestre de 1998, e a partir daí a situação do país foi afetada negativamente, primeiro pela crise russa e depois pela desvalorização do real, iniciando um ciclo depressivo que culminou na desvalorização do peso, em janeiro de 2002, e representou uma destruição de riqueza acumulada de mais de 20%. "Se comparamos o crescimento médio de 2004 com o de 1998, ainda vamos ficar 4,4% abaixo", disse o economista Esteban Medrano, da consultoria Macrovisión. Com os 8% de crescimento, o PIB argentino encerrará o ano em 282 bilhões de pesos, sendo que a queda em dólares em relação a 1998 chega a 50,1%.

Na semana passada, um pool de analistas consultados pelo Banco Central do país elevou de 7,7% para 8% a previsão de crescimento para 2004, e de 5,2% para 5,3% o prognóstico de 2005, o que seria mais do que suficiente para que a economia volte aos níveis pré-crise. Apesar do otimismo, o maior fator de ameaça a crescimento sustentável é a escassez de investimentos. As principais causas que inibem a injeção de dinheiro na produção são a persistente precariedade do crédito e a carência de definições que possam dar um horizonte de previsibilidade ao cenário macroeconômico. O maior problema é a ausência de um acordo com credores da dívida externa em default desde dezembro/ 2001. Segundo os últimos dados divulgados pelo Ministério da Economia, a proporção de investimentos em relação ao PIB estava no final do segundo trimestre em 17,1%, uma cifra considerada insuficiente. "É lógico que melhoramos em relação a 2002, quando a taxa era de 11,3%, mas calculamos que para crescer 4% de maneira sustentada o investimento teria de estar em 20% ou 21% do PIB", afirmou Medrano. A maior parte do capital investido na economia corresponde a auto-financiamento das empresas que possuem recursos próprios para financiar suas operações e ampliação da capacidade de produção. E o fluxo de capitais externos, embora esteja aumentando, continua em níveis tímidos. Para este ano, a expectativa é que entrem no país cerca de US$ 2,5 bilhões em investimentos estrangeiros diretos. O número significa uma recuperação em relação a 2003, quando ingressaram US$ 478 milhões. Mas para se ter uma idéia da redução, em 2000 a Argentina recebeu US$ 9,5 bilhões em investimentos externos diretos, e em 1999 a cifra havia sido de US$ 22 bilhões, embora neste caso o número excepcionalmente elevado foi obtido com a privatização da petroleira YPF. A indefinição do problema da dívida retarda a tomada de decisões por parte das empresas, que tendem a restringir os seus investimentos ao essencial. Decisões de prazo mais longo só deverão ser tomadas a partir de abril, quando a Argentina pretende entregar os novos bônus aos seus credores, saindo formalmente do default. Inicialmente, o governo pretendia lançar a oferta hoje, mas problemas com o Bank of New York, que desistiu de fazer a colocação dos títulos no exterior, e a demora em que os órgãos reguladores da Itália e dos EUA aprovem a proposta argentina obrigaram o governo a adiar o início da operação para 17 de janeiro. "O que aconteceu foi que a reestruturação perdeu o embalo", disse ao jornal "La Nación" o ex-subsecretário de Financiamento Miguel Kiguel. Segundo ele, antes do adiamento, anunciado semana passada, havia a sensação crescente de que a oferta argentina seria aceita. Agora, o processo pode se complicar porque os credores que optem pela via judicial para tentar receber mais do que os bônus com descontos de 75% oferecidos pela Argentina terão mais tempo para traçar estratégias legais.