Título: A contratação de brasileiros no exterior
Autor: Pedro Luiz Guidolin
Fonte: Valor Econômico, 03/04/2006, Legislação & Tributos, p. E2

As empresas estrangeiras que pretendem contratar brasileiros para trabalhar no exterior, além da burocracia usual, terão que observar as disposições da nova Portaria nº 21, de 2006, do Ministério do Trabalho e Emprego, baixada pelo atual ministro Luiz Marinho e publicada no Diário Oficial da União no dia 10 de março. De acordo com os termos da Portaria nº 21, fica delegada à Coordenação-Geral de Imigração do Ministério do Trabalho, órgão executivo do Conselho Nacional de Imigração (CNIG), a competência para autorizar a contratação, por empresa estrangeira, de brasileiros para trabalhar no exterior. A coordenação-geral de imigração é o órgão responsável por conceder autorização para trabalho aos estrangeiros que vêm ao Brasil. Esse mesmo órgão, que regula a entrada de estrangeiros, regula a saída de alguns brasileiros que vão trabalhar no exterior. A Portaria nº 21 pode trazer a idéia equivocada de que a regra ali estipulada deve ser aplicada a toda e qualquer contratação de brasileiros que venham a desempenhar suas atividades no exterior para uma empresa estrangeira. Essa premissa, porém, não é verdadeira. Uma leitura mais minuciosa dos textos da Lei nº 7.064, de 1982, e do Decreto nº 89.339, de 1984, que dispõem e regulam a contratação, por empresa estrangeira, de brasileiro para trabalhar no exterior, não deixa dúvida de que a questão envolve apenas a contratação de brasileiros em "empresas prestadoras de serviços de engenharia" (segundo o artigo 1º da Lei nº 7.064/82 e o artigo 1º do Decreto nº 89.339/84). Apesar desses instrumentos normativos serem específicos para um tipo de atividade, as regras por eles criadas merecem nossa atenção, especialmente as que se referem à solidariedade entre a empresa domiciliada no Brasil e a sociedade sediada no exterior e quanto à observação de regras do direito do trabalho brasileiro em contratos que serão executados no exterior. A solidariedade prevista na Portaria nº 21 não inova em nada a nossa legislação trabalhista - a não ser pelo fato de estar sendo abordada com base em uma portaria ministerial. O fato é que a solidariedade não se presume, mas decorre de lei - e a portaria não é lei, pelo menos não na acepção da palavra. As portarias são instrumentos normativos que regulam administrativamente a aplicação das leis.

-------------------------------------------------------------------------------- Em matéria trabalhista prevalece a lei do local onde for executado o contrato, ou seja, prestado o serviço --------------------------------------------------------------------------------

Independentemente de ser ou não lei ou um instrumento normativo convencional, o importante é esclarecer que a solidariedade entre empresas, sob o ponto de vista trabalhista, vem conceituado no parágrafo 2º do artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e portanto, não é a portaria que irá estabelecer responsabilidades de forma diversa do ali definido. Quanto à aplicação das regras do direito do trabalho nacional aos contratos dos brasileiros que forem trabalhar no exterior para empresas estrangeiras, é importante esclarecer, antes de mais nada, que em matéria trabalhista prevalece o principio da "lex loci executione", ou seja, prevalece a lei do local onde for executado o contrato, ou seja, prestado o serviço. Assim, em regra, se o brasileiro for contratado para trabalhar na Inglaterra, será a lei inglesa que deverá reger o contrato. Se for na França, será a francesa, e assim por diante. Parece, entretanto, que a portaria, seguindo o mesmo caminho da lei e do decreto que regulam a matéria, impõe como condicional à autorização para trabalho a concessão de determinados direitos previstos na nossa legislação aos brasileiros que forem trabalhar no exterior. Todo esse regramento poderia nos levar à conclusão de que o governo federal brasileiro é muito cuidadoso com os seus tutelados e que não quer ver a nossa mão-de-obra especializada servindo de mão-de-obra barata em terras estrangeiras. Porém, se fizermos uma análise minuciosa da Portaria nº 21, cruzando as disposições deste texto com as disposições da lei e do decreto, veremos claramente que a intenção ministerial é a de controlar a saída de recursos humanos (mão-de-obra especializada) a fim de evitar que uma das principais fontes de arrecadação de impostos (o trabalho assalariado) seja perdida para os nossos concorrentes. Essa forma de controle fere o direto dos brasileiros de exercerem livremente a escolha de trabalho (artigo 5º, inciso XIII da Constituição Federal), criando barreiras desnecessárias e dificultando o intercâmbio cultural e tecnológico do Brasil e de seus cidadãos com o resto do mundo.

Pedro Luiz Guidolin é advogado do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados