Título: Fecomercio propõe apenas dois tributos
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 04/04/2006, Brasil, p. A4

Reduzir e racionalizar o gasto público para depois reformar o sistema tributário brasileiro. A idéia é simples e muito conhecida. A Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio), no entanto, defende um corte radical nos gastos da máquina pública por meio da ampliação da Desvinculação Temporária de Recursos da União (DRU) de 20% para 40%, além de uma flexibilização dos limites mínimos para gastos com educação e saúde. Fabiano Cerchiari/Valor A pedido da Fecomercio, economistas da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), realizaram um estudo e apresentaram ontem em São Paulo uma proposta de reforma tributária. Reforma que, a princípio, só poderá se realizar a partir do momento em que a relação dívida/PIB caia dos atuais 57% para menos do que 30% do PIB. Ou seja, a reforma poderá ocorrer a partir do quinto ano após uma reforma da Previdência e de um choque de gestão propostos. A sugestão da Fecomercio consiste em fazer com o que o Brasil tenha apenas dois impostos: um sobre a renda e outro sobre o consumo. A reforma deveria ser feita em duas partes. Na primeira, os impostos como ICMS, IPI, ISS, Pis/Pasep, Cofins e Simples seriam substituídos por um imposto de valor agregado (IVA) com alíquota de 12%. Com isso, a guerra fiscal entre Estados estaria extinta. Na segunda parte, os alvos seriam o Imposto de Renda (IR), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e as contribuições à Previdência. Todos seriam unificados em um IR com alíquota de 17%, sem abatimento, dedução, redução ou isenção. "Podemos até discutir alíquotas diferentes, mas não abro mão da idéia da isenção", ressalta a economista da Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do estudo, Maria Helena Zockun. Para ela, é preciso que todos contribuam, mesmo que com valores muito pequenos. "A pessoa que não paga imposto direto fica excluída socialmente e acha que não tem direito de cobrar o governo por serviços básicos como educação e saúde", avalia. Para Maria Helena, esse projeto não tem nada de radical. A flexibilização do limite mínimo de gastos, por exemplo, é tida como um ponto polêmico. Ela lembra, contudo, que os gastos públicos do Brasil com saúde estão acima da média internacional, de acordo com o nível per capita do país. "Nessa área, gastamos mais do que Noruega e Reino Unido", afirma. A Previdência é outro ponto de tensão. Maria Helena ressalta que a despesa previdenciária no país chega ao mesmo nível de países que têm três vezes mais idosos. "Não tem jeito. É preciso gastar menos e melhor". Os efeitos dessa reforma tributária, de acordo com o estudo da Fipe, seriam abrangentes, beneficiando desde as famílias de baixa renda até empresários que queiram investir no setor produtivo. A Fecomercio espera que a carga tributária possa ser reduzida de 37% do PIB para 28%. Os preços dos produtos brasileiros cairiam, em média, 19%. No caso dos gastos com habitação, a variação de preços poderia ser negativa em 23,3%, já que se trocaria a atual carga de tributos indiretos (31,5%) para o IVA de 12%. A elevação da renda disponível das famílias brasileiras que ganham até dois salários mínimos ficaria entre 30% e 40%. Já para as mais ricas, que ganham acima de trinta mínimos, o aumento de renda seria de 5%. Por outro lado, a receita tributária ficaria 24% menor, o que não seria problema, uma vez que o gasto público já teria sido bastante reduzido. Se nada for feito e os gastos da União continuarem a crescer nas taxas atuais a carga tributária do Brasil pulará de 38% do PIB para 54% nos próximos vinte anos. Hoje, as despesas já estão 25% acima da média internacional. Em 1995, a despesa de consumo per capita do governo federal era de R$ 1.416. Nove anos depois, ela chegou a R$ 2.061, o que representou de crescimento anual de 3,6%. Entre 1995 e 2004, a despesa real do governo (excluindo Previdência, despesas financeiras e investimentos) aumentou a uma taxa de 5,6% ao ano e fez com que os gastos pulassem de 18% do PIB para 20,7%. A Fecomercio pretende receber sugestões que complementem a proposta e irá apresentá-la aos candidatos a cargos políticos nas eleições de outubro. "Não há muito segredo aí. Se tivermos alguém comprometido com a eficiência será possível levar essa sugestão adiante", diz Maria Helena.