Título: Brasil pede aos EUA revisão da tarifa de importação do álcool
Autor: Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 24/04/2006, Finanças, p. C8

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, usou a viagem à reunião de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (Bird) como uma oportunidade para fazer marketing internacional do álcool combustível. No encontro com o vice-conselheiro de Segurança Nacional para assuntos econômicos, Faryad Shirzad, pediu à Casa Branca que reconsidere a tarifa de importação de US$ 0,54 por galão de álcool brasileiro. Ruy Baron/Valor Guido Mantega: "O Brasil não quer produzir sozinho, queremos globalizar o álcool e difundir o consumo e produção"

No discurso ao Comitê de Desenvolvimento do Banco Mundial ontem, Mantega expôs a experiência brasileira com o álcool e defendeu o uso de bi-combustíveis como alternativa para o petróleo e que linhas de crédito criadas pelo Bird para estimular o uso de alternativas de energia "limpas" privilegiem o desenvolvimento de produção de álcool.

O Comitê de Desenvolvimento, dos ministros representados no Banco Mundial, aprovou a adoção de um mecanismo para estimular investimentos em fontes de energia "limpas". Segundo cálculos do Bird, os países em desenvolvimento investirão US$ 300 bilhões anuais nos próximos 25 anos. Os países em desenvolvimento terão que investir anualmente US$ 10 bilhões a US$ 40 bilhões para adaptar-se à legislação de combate ao aquecimento global. O Brasil está fazendo lobby para que os investimentos em álcool sejam prioritários em relação a outras fontes - como a tecnologia de carvão limpo que está sendo financiada em pesquisas nos EUA.

O momento é bom para vender o álcool como combustível alternativo nos Estados Unidos. Na sexta-feira o preço do barril do petróleo atingiu US$ 74, e Mantega apresentou o custo de US$ 20 por barril de álcool. No pronunciamento semanal no rádio, o presidente americano George Bush disse que os EUA "precisam desenvolver diversas fontes de energia renovável como o etanol, e isso ajudará no crescimento econômico, redução de preços de energia e proteção do meio ambiente" . No discurso ao Bird, Mantega lembrou que 44% da matriz energética brasileira tem origem em fontes renováveis (principalmente hidrelétrica). Disse que a participação do álcool no total da matriz energética passou de 6,8% em 1978 para 13,5% em 2004, e deve atingir 14,3% em 2010. No ano passado, explicou o ministro, o país exportou 2,58 bilhões de litros do combustível, que geraram uma receita de US$ 584 milhões. O ministro relatou o crescimento dos carros tipo "flex fuel", que em janeiro responderam por 73% das vendas. Nos EUA, Ford e GM produzem alguns modelos "flex fuel" e existe uma frota estimada em cinco milhões de veículos, mas só agora as companhias estão fazendo campanhas de marketing de sua utilização.

No fim de semana, os estados do noroeste dos EUA sofreram com problemas de abastecimento de gasolina porque muitos começaram a trocar o aditivo MTBE para a gasolina por álcool, conforme exigência da legislação energética do país. O álcool não pode ser misturado na refinaria como o MTBE, e problemas logísticos causaram falta de gasolina em diversos postos, inclusive na região da capital do país.

Na conversa com o assessor da Casa Branca, o ministro da Fazenda argumentou que cobrar a tarifa sobre importação do álcool brasileiro "é pior para os próprios EUA porque encarece o álcool do qual o país precisa". E lembrou diversas declarações do presidente George Bush citando como exemplo a experiência brasileira de uso do etanol. No discurso do Estado da União, o presidente americano chegou a ressaltar que a produção de etanol a partir de celulose e não milho era uma boa alternativa.

Segundo Mantega, a resposta do executivo americano, responsável, por exemplo, pela estratégia dos EUA nas reuniões do G-7, foi positiva. "Ele disse que concordava, disse que nós podemos repensar essa questão juntos e desenvolver novas modalidades de cooperação".

Segundo Mantega, a intenção brasileira não é tornar-se o único exportador do produto. "O Brasil não quer produzir sozinho, queremos globalizar o álcool e difundir o consumo e produção. Queremos estimular outros países, por exemplo da América Latina, a produzir álcool a partir de cana e estamos dispostos a ajudar a difundir a tecnologia". Mantega disse que o governo brasileiro está conversando com outros países latino-americanos que poderiam começar a produzir álcool para exportação.

O ministro disse que o representante da Casa Branca estava preocupado com a continuidade da política econômica depois da troca do titular do Ministério da Fazenda e queria saber se haveria alguma mudança. Mantega disse ter assegurado Shirzad de que nada mudará na política macroeconômica. Mantega reforçou o pedido do presidente Luís Inácio Lula da Silva de um encontro de chefes de estado para tentar destravar a Rodada de Doha, mas Shirzad não demonstrou muito entusiasmo. "Ele disse que não adianta simplesmente juntar os presidentes sem que haja uma proposta de consenso para avançar", disse Mantega.