Título: Indústria de papel investe em software
Autor: João Luiz Rosa e Ricardo Cesar
Fonte: Valor Econômico, 04/04/2006, Empresas &, p. B1
Como outros setores de capital intensivo, a indústria de papel e celulose investiu fortemente na implantação de softwares de gestão, entre o fim dos anos 90 e o início desta década, para organizar melhor procedimentos internos como contas a pagar e a receber, estoques etc. A maioria dessas companhias optou pelos programas da alemã SAP, a maior do mundo no fornecimento desse tipo de programa, conhecido como ERP (Enterprise Resource Planning). Agora, com novos desafios a superar - como o que o dólar fraco trouxe para as exportações -, o setor parece prestes a ingressar em um novo ciclo de investimento tecnológico. Um sinal dessa tendência é que duas companhias de software e serviços de tecnologia, a alemã IDS Scheer e o grupo Assa, da Argentina, uniram-se para criar uma empresa para atuar especificamente na indústria de papel e celulose. O nome da joint venture, em fase de licenciamento, só será anunciado nas próximas semanas, mas a companhia chega ao mercado com um contrato de US$ 500 mil já fechado com a Klabin, uma das maiores empresas da área. O projeto tem duração prevista de 12 meses e representa 25% do faturamento estimado para a nova empresa, de US$ 2 milhões neste ano. A companhia recém-formada terá sede no Brasil, com atuação focada na América Latina. No país, existem 220 empresas de papel e celulose, mas a estratégia será concentrar-se nas 15 maiores, cujo faturamento combinado é de R$ 3 bilhões, diz Roberto Wagmaister, executivo-chefe do grupo Assa. Em uma fase posterior, o objetivo é ampliar a atuação da joint venture para outros setores, mas a decisão de inicialmente concentrar-se no setor de papel e celulose deve-se a uma combinação de fatores estudados pelos sócios. "Trata-se de um setor que tem condições de investir; usa o sistema da SAP, que conhecemos bem; e tem possibilidade de melhorar seus processos", diz Francisco Piedade Amaral, diretor executivo da IDS Scheer. É esse último item - os processos - que faz a principal diferença entre os investimentos de cinco anos atrás e os atuais. No ciclo original, as empresas apressaram-se em investir nos softwares de ERP a tempo de preparar-se para o bug do milênio, uma falha de computador que ameaçava provocar o caos na virada do ano 2000. A tragédia antecipada não se cumpriu, mas diante do risco a atenção das empresas permaneceu voltado à implantação dos softwares em si. O foco era a tecnologia. "Agora, os ganhos proporcionados pelos programas estão perto do limite. Chegou a hora de mudar os processos", diz Alfredo B. de Araújo, que co-presidirá a nova empresa como representante do grupo Assa. A idéia é oferecer serviços de consultoria, além de softwares adicionais, para ajudar os clientes a revisar os processos internos e tornar todo o fluxo - e não apenas parte dele - mais eficiente. É o que no jargão da indústria ficou conhecido como BPM (sigla em inglês de administração dos processos de negócios). "Não adianta carregar o caminhão em cinco minutos e levar meia hora para emitir a nota fiscal", exemplifica Carlos Alberto Schwager, co-presidente da nova companhia pela IDS Scheer. Na Klabin, o trabalho vai começar pela revisão dos processos mais críticos, que representam 20% do total mas representam 80% em termos de retorno para a empresa, diz José Geraldo Antunes, principal executivo de TI da Klabin e presidente da Asug, a associação de usuários de SAP no Brasil. As mudanças incluem desde a entrada da ordem de venda até o recebimento da duplicata. "É preciso juntar os eixos da tecnologia e o da gestão", afirma Antunes. O objetivo é reduzir custos, tornar o negócio mais eficiente diante dos concorrentes globais. "Acredito que estamos diante de uma nova onda, que não é exclusiva da indústria de papel e celulose, mas atinge outras atividades, como metalurgia." Para a SAP, a indústria de processos - composta pelas companhias de papel e celulose e as siderúrgicas - é um dos grupos de clientes mais importantes no Brasil. Klabin, VCP, Aracruz, Suzano, Veracel, Cenibra, Bahia Sul, Vigesa, International Paper e MD Papéis são clientes da multinacional. Os outros segmentos prioritários são óleo e gás, bancos, utilities e manufatura. "Todas as variáveis da produção que garantem qualidade e custo são muito apoiadas em tecnologia da informação", afirma Luis Cesar Verdi, diretor comercial da SAP no Brasil. Na indústria de papel e celulose, há muitos tipos de negócio ocorrendo na base instalada da SAP no país. Um dos projetos em voga é a integração da cadeia de suprimentos, o que permite acompanhar eletronicamente o fluxo de pedidos para os fornecedores. Existem também projetos de gestão florestal, baseados em softwares que controlam todo o ciclo do eucalipto, desde o plantio até o corte e o transporte. Além disso, também estão ocorrendo projetos de integração dos sistemas de chão de fábrica com os programas de gestão produtiva. "O setor está longe de ser uma vertical saturada para a SAP", diz Verdi. Uma das empresas da área que passam por uma etapa de intensa reformulação tecnológica é a Votorantim Celulose e Papel (VCP). Desde 2004, a Votorantim leva a cabo o "projeto integra", que consiste na instalação de um único sistema da SAP para todas as companhias do grupo. O software deve entrar em operação no segundo semestre e vai unificar os sistemas diferentes usados pelas companhias atualmente. Ao fim do trabalho, os 1,8 mil usuários do programa de gestão da VCP serão transferidos para o novo ERP. Outra alteração significativa será substituir um centro de dados da IBM pelo da Tivit, braço de tecnologia do grupo Votorantim, também no segundo semestre. Com essas mudanças, o orçamento de TI da VCP vai encolher de R$ 133 milhões em 2005 para cerca de R$ 80 milhões neste ano. A redução deve-se ao fato de que muitas despesas serão rateadas entre as companhias do grupo, explica Renato Blanco, gerente de tecnologia da VCP.