Título: Governo deve cortar gasto com investimento
Autor: Tatiana Bautzer e Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 25/04/2006, Brasil, p. A4

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que definirá nas próximas semanas as áreas em que haverá corte de gastos para adaptação à nova Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), ainda em tramitação no Congresso. Os gastos correntes excluindo previdência terão de ser reduzidos em 0,4 ponto percentual do PIB este ano, caindo de 10,2% para 9,8%. O corte terá de ser maior em outras áreas porque as despesas previdenciárias atingirão este ano 7,9% do PIB, ante 7,6% no ano passado.

A meta de redução prevista no projeto de LDO para o total de despesas correntes, de 0,1% do PIB ao ano, vale só para 2007 em diante. Mas, excluindo os de previdência social (que continuarão a crescer no ano que vem, chegando a 8,06% do produto), o governo prevê um ajuste já este ano, em relação a 2005. "Os técnicos estão estudando as alternativas e devo tomar a decisão nas próximas semanas", disse o ministro depois de participar de um seminário em Nova York organizado pela Câmara de Comércio Brasil-EUA. Mantega disse que o governo está tentando controlar os aumentos de gastos previdenciários com aperto contra a evasão fiscal e recadastramento para expurgar fraudes, mas a tendência ainda é de crescimento.

O ministro deve voltar hoje a Brasília. Entre suas tarefas mais imediatas está a definição do tamanho do contingenciamento a ser feito sobre as dotações da lei orçamentária de 2006, aprovada na semana passada pelo Congresso, que deve atingir mais os investimentos. Um estudo da consultoria de orçamento da Câmara dos Deputados estima que o bloqueio de dotações, para assegurar o cumprimento da meta de superávit primário, pode chegar a R$ 22,4 bilhões.

O principal motivo é a discrepância entre as estimativas de receita primária feitas pelo Executivo e pelo Congresso. Em relação ao projeto original encaminhado em agosto, o Ministério da Fazenda já elevou de R$ 319,5 bilhões para R$ 320,76 bilhões a estimativa de arrecadação primária líquida para 2006. Ainda assim, o número ficou cerca de R$ 14,15 bilhões abaixo do previsto no orçamento aprovado pelo Congresso.

Além de estimar uma receita maior que a efetivamente esperada pelo governo, o Legislativo aumentou o volume autorizado de despesas. Só as dotações para investimento, que devem ser o principal alvo do contingenciamento, foram elevadas de R$ 14,3 bilhões para R$ 21,2 bilhões com as emendas parlamentares ao projeto original.

Mantega indicou que a necessidade de contingenciar gastos reduz as chances de um novo pacote de ajuda a agricultores que está sendo pedido pelo ministro Roberto Rodrigues. O ministro da Agricultura, também presente ao seminário em Nova York, disse que não tem controle sobre nenhuma das causas da crise no campo (câmbio valorizado, invasões de terras ou altas taxas de juros), mas que as consequências "caem no seu colo".

Rodrigues está pedindo aporte do Tesouro Nacional no Fundo de Catástrofes (que serviria como um fundo de resseguro para perdas de safra, atrelado ao seguro rural), além de desoneração de impostos sobre insumos agrícolas e importações de máquinas e equipamentos. Rodrigues disse esperar conseguir a aprovação da Fazenda até maio, mas Mantega foi reticente. "Já anunciamos um pacote de alívio para a agricultura, com postergação de pagamento de créditos e outras medidas financeiras no valor total de R$ 14 bilhões", disse o ministro. "Sabemos que o setor está passando por dificuldades, mas também há outras áreas que terão cortes", disse o ministro.

Mantega disse acreditar que esse será o primeiro ano eleitoral no qual o país não sofrerá crise econômica, seguindo o roteiro do ano passado, no qual o governo "esteve sob ataque" com as denúncias de corrupção, nas palavras do ministro, mas sem grandes consequências econômicas. Durante palestra a empresários, mostrou dados sobre a continuidade da queda dos spreads de risco do país depois de sua indicação para a Fazenda, em substituição a Antônio Palocci.

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse que a eventual redução do superávit de conta corrente por causa da valorização do câmbio, conforme previsão do FMI, pode provocar, no máximo, um "ajuste de preços" (alta do dólar) e novo aumento de competitividade de exportações, mas não uma nova crise. O secretário do Tesouro, Carlos Kawall, previu a elevação das reservas internacionais brasileiras de US$ 60 bilhões a US$ 65 bilhões até o fim do ano.

Meirelles participa hoje em Nova York de um seminário da agência de classificação de risco Fitch Ratings sobre a América Latina. O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, vai a Washington para reuniões no Banco Mundial (onde discutirá o álcool como alternativa ao petróleo) e com o secretário de agricultura dos EUA, Mike Johanns.