Título: Cobre vale mais do que ouro para a Phelps
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Fonte: Valor Econômico, 04/04/2006, Empresas &, p. B10

Em meio aos cactos e arbustos de Safford, no Arizona, algo mais está vicejando: empregos. Nos últimos três anos, o maior empregador da cidade, a gigante mineradora Phelps Dodge criou 300 postos de trabalho nas instalações que tem nas proximidades. Muitos mais serão criados uma vez que a companhia espera iniciar no terceiro trimestre a construção de sua primeira grande mina de cobre nos Estados Unidos em mais de 30 anos. A empresa representa um rico veio de dinheiro para Safford, uma cidadezinha com 9,6 mil almas resistentes, encravada no deserto a 265 quilômetros a sudeste de Phoenix. A construção de novas residências está em alta e novos restaurantes abriram, levando novos clientes a estabelecimentos como a Nikki's Hard Rock Beauty Shop. "Nossa Wal-Mart ficou muito grande", diz Sheldon Miller, diretor da câmara de comércio local. "É como se a economia tivesse pegado no tranco." O boom mundial dos preços das commodities está dando um novo sopro de vida a comunidades como Safford, e um empurrão ainda maior à Phelps Dodge, a maior mineradora de cobre dos Estados Unidos. Os preços do cobre subiram de 78 centavos de dólar para US$ 2,34 por libra peso nos últimos três anos, com a forte demanda da China e Índia às vezes excedendo a capacidade de produção do setor. No ano passado a Phelps Dodge lucrou US$ 1,5 bilhão sobre vendas de US$ 8,2 bilhões, depois de registrar um prejuízo de US$ 338 milhões em 2002. O preço da ação da companhia aumentou seis vezes desde então. Recentemente ela era cotada a 74 centavos de dólar. Para o diretor-executivo J. Steven Whisler, a nova prosperidade está trazendo seus próprios desafios. Funcionário da Phelps Dodge há três décadas, esse nativo de Colorado Springs, de 51 anos, já viu muitas altas e baixas no preço do cobre, e sabe a importância do planejamento para os tempos de vacas magras. Ele quadruplicou os investimentos para US$ 700 milhões ao ano, desmembrou a ação da companhia, pagou dívidas de US$ 1,7 bilhão e reservou US$ 935 milhões para cobrir os custos de aposentadoria, planos de saúde e limpeza do meio ambiente. Isso significa que o plano de pensão da companhia está hoje totalmente financiado. "Quase toda semana você pega um jornal e descobre que um ícone americano está tendo problemas para bancar suas obrigações previdenciárias", diz Whisler. "Isso cria um stress em nossos funcionários." Mesmo depois de reforçar o balanço, Whisler ainda tinha um caixa de US$ 1,9 bilhão e apenas US$ 677 milhões em dívidas no fim de 2005. Ele começou a retornar uma grande parcela do caixa para os acionistas: desde dezembro a companhia já distribuiu US$ 900 milhões, ou US$ 4,50, a título de dividendo especial. Ela pretende distribuir pelo menos outros US$ 600 milhões até o fim de 2006. Para alguns acionistas, porém, esses esforços não estão sendo suficientes. A Atticus Capital LLC, um fundo de hedge de Nova York que controla 10% das ações da companhia (metade disso na forma de opções), vem tentando fazer a companhia embarcar em um programa de recompra de ações de muitos bilhões de dólares, argumentando que as ações estão subvalorizadas. Em uma carta datada de 15 de fevereiro, os executivos da Atticus Timothy R. Barakett e David Slager disseram a Whisler que contrataram consultores de fora para considerar opções, inclusive a venda da companhia. "Uma recompra significativa de ações não é apenas a única coisa certa a fazer pelos nossos acionistas; é a maior garantia de independência que eles têm", afirma a carta. Um porta-voz da Atticus não quis comentar o assunto. Whisler respondeu com um comunicado à imprensa, classificando as exigências da Atticus de "uma aposta precipitada que pode ameaçar o futuro de nossa companhia". Entrevistado três semanas depois na sede da Phelps Dodge, no centro de Phoenix, Whisler foi menos taxativo, mas ainda se mostrou decidido a não se dobrar diante das exigências da Atticus. "Já vimos alguns ciclos e muito provavelmente veremos outros mais", disse ele. "Neste negócio, você precisa planejar e ter uma atenção aos ciclos de baixa para que possa sobreviver nos momentos difíceis." A companhia já teve mais do que sua cota de momentos difíceis. Fundada em 1834 como uma trading de Nova York, a Phelps Dodge está entre as últimas produtoras de cobre independentes, uma vez que nomes famosos de outrora, como a Anaconda e a Kennecott, foram abocanhados por concorrentes estrangeiros. A "BusinessWeek" incluiu a Phelps Dodge em uma reportagem de capa publicada em 1984 sob o título de "A Morte da Mineração". A ilustração mostrava um lingote com alças, na representação de um caixão. Foi um período do qual Whisler se lembra bem. Na época um jovem advogado que trabalhava na sede da companhia, ele passou seis meses de 1993 substituindo trabalhadores em greve da grande mina de Morenci, a cerca de 80 quilômetros a nordeste de Safford. Whisler dirigiu um caminhão basculante, trocou pneus e tirou folhas de cobre dos altos-fornos. No fim, os mineradores votaram pela supressão dos sindicatos. "Passamos um longo período tentando educar os funcionários, mostrando a eles que os preços do cobre estavam baixos, que nós estávamos perdendo dinheiro e que precisávamos fazer algumas coisas diferentes', diz Whisler. Essas coisas diferentes incluíam o emprego de novas tecnologias. Na década de 1980, a Phelps Dodge começou a substituir muitos dos altos-fornos cuspidores de fumaça que há muito tempo eram usados para refinar o cobre, por um processo de lixiviação que usa produtos químicos para extrair o minério. Whisler está investindo US$ 210 milhões em uma nova unidade de lixiviação na mina de Morenci. Ao pulverizar primeiro a rocha, dando a ela a consistência de areia, o processo permitirá à Phelps Dodge obter cobre do minério que de outra forma não teria, aumentando o tempo de vida útil da mina que já tem 125 anos. O processo foi criado na unidade de tecnologia da companhia, que tem 130 funcionários, e que também fica em Safford. "Estamos botando a mão na massa e tentando fazer dinheiro", diz o gerente-geral da unidade, Rick Gilbert. Whisler também está direcionando recursos para a ampliação de unidades. Ele está em meio a um investimento de US$ 850 milhões em uma mina no Peru que vai triplicar a produção no local, para 600 milhões de libras peso por ano até meados de 2007. No segundo semestre de 2008, Whisler espera ter a mina de US$ 550 milhões de Safford em operação. Conseguir a aprovação das autoridades estaduais e federais para a nova mina levou 12 anos de persistência e papelada. O gerente do projeto, Steven Holmes, seguiu as pegadas de seu falecido pai, que tentou desenvolver uma mina subterrânea nas colinas próximas de Safford em meados da década de 1970. O acordo atual que permitiu a mina envolveu uma controvertida troca de terras com o Bureau of Land Management, que ambientalistas e uma tribo Apache local alegaram oferecer risco ecológico e ser um mau negócio para o governo. Junto com o projeto no Peru, a mina de Safford deverá ajudar a elevar a produção anual de cobre da companhia em 20%, para 3 bilhões de libras peso até 2010. Aí reside a discussão sobre os preços do cobre e o futuro da Phelps Dodge. Os mais otimistas afirmam que a demanda contínua por cobre por parte dos mercados da construção de todas as partes do mundo, juntamente com as dificuldades que os produtores têm para aumentar a oferta, deverão manter os preços altos ou em alta nos próximos anos. Em 2003 a China superou os EUA como maior consumidor de cobre do mundo. Mas a demanda por cobre não está tão forte quanto os preços sugerem. No ano passado, sua utilização no mundo na verdade caiu 1,5%, segundo dado do International Copper Study Group, uma organização de estudos e pesquisas patrocinada pelos países produtores de cobre. O crescimento vigoroso da China, Índia e Rússia não compensou a queda da demanda nos EUA, Japão e Europa. Na Bolsa de Mercadorias de Nova York, o cobre para entrega em fevereiro de 2008 está sendo negociado a cerca de US$ 2 por libra peso, alto pelos padrões históricos, mas abaixo do preço no mercado à vista. Deste modo, Whisler está na incômoda posição de "líder de torcida" para o seu principal produto, ao mesmo tempo em que tenta moderar as expectativas. Ele já falou sobre uma "segunda era do cobre", em que mais de 4 bilhões de pessoas no mundo que não possuem água encanada e instalações elétricas em suas casas ganharão acesso a esses serviços que dependem do cobre. Ao mesmo tempo ele é cauteloso. "Há muito dinheiro financeiro nas commodities hoje em dia", diz ele. "Isso está criando expectativas? Sim. Mas até onde elas vão, eu acho que ninguém sabe." Conseguirá Whisler satisfazer Safford e Nova York? É uma delicada tentativa de se conseguir um equilíbrio para um diretor-executivo, mesmo num momento de negócios aquecidos.