Título: Tesouro acolhe perda de R$ 6,5 bi de fundos
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 04/04/2006, Agronegócios, p. B14

O Tesouro Nacional terá que absorver neste ano R$ 6,5 bilhões em prejuízos provocados por parcelas e encargos de dívidas atrasadas, originárias sobretudo da atividade rural, dos fundos constitucionais do Norte (FNO), Nordeste (FNE) e Centro-Oeste (FCO). Acumulada desde 1989, a maior parte desses débitos atrasados há mais de seis meses já começou a ser lançada pelos três fundos como prejuízo em seus balanços. O "esqueleto" terá impacto direto no superávit primário. O governo determinou aos bancos gestores a obrigação de contabilizar todas as operações de risco compartilhado entre os fundos e seus agentes financeiros, vencidas há mais de 180 dias, como prejuízo nos balanços dos fundos. O FNE já admitiu prejuízo de R$ 4,889 bilhões em seu balancetes; o FNO, outros R$ 1,308 bilhão, e o FCO, R$ 303 milhões. A "limpeza" nos balanços, iniciada por uma decisão de março de 2005, foi reforçada pela Portaria Conjunta nº 11 dos ministérios da Fazenda e da Integração Nacional, publicada em 23 de janeiro deste ano. Os resultados saíram agora. A nova regra é mais rigorosa que a anterior, que obrigava a admissão das dificuldades em receber dívidas vencidas há mais de 360 dias. O Banco do Brasil já operava assim para créditos em atraso desde 1999. Mas os bancos da Amazônia (Basa) e do Nordeste (BNB) adotavam a regra apenas em operações de risco próprio, e não no risco compartilhado e integral com os fundos. Parte desses valores pode ser recuperada, mas apenas pela normalmente complexa via judicial. "Mas é pouco provável a recuperação dessas dívidas", admite Roberto Albuquerque, diretor de Gestão dos Fundos de Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional. Defendidos como uma medida saneadora, os expurgos também afetaram o patrimônio líquido e o volume dos ativos dos fundos. No FNE, por exemplo, o recuo do patrimônio chegou a R$ 4,27 bilhões com a medida. No FNO, a queda foi de R$ 1,2 bilhão. Os ativos de ambos registraram perdas conjuntas de R$ 5,87 bilhões. "Isso aumenta os recursos disponíveis dos fundos e reduz os pagamentos de taxas de administração aos bancos", explica Albuquerque. Hoje, os fundos pagam aos bancos 3% anuais sobre seus PLs, limitado a 20% dos repasses do Tesouro Nacional. Para os bancos, argumenta Albuquerque, as novas regras resultarão em baixa perda de receita. Os bancos têm em caixa R$ 4,97 bilhões dos fundos sob a rubrica "disponível". Sobre isso, têm de pagar taxa equivalente a 95,5% da Selic como remuneração aos fundos. A carteira total de empréstimos fechou o ano passado em R$ 31,5 bilhões - R$ 18,26 bilhões no FNE, R$ 6,97 bilhões no FNO e R$ 6,28 bilhões no FCO. A inadimplência global acumulada desde 1989 está hoje em R$ 8,271 bilhões, o que corresponde a 21% de todos os recursos aplicados pelos fundos até 2005 em 601 mil contratos. A maior parte dos débitos está ligada à atividade rural, incluindo as agroindústrias. O setor responde por mais da metade dos desembolsos dos três fundos. "Só teremos uma inadimplência mais baixa em 2007, quando acabar totalmente esse processo de expurgo", afirma Albuquerque. Ele acredita que os elevados índices de calote do FNE e do FNO devem recuar a 5%, mesmo nível registrado hoje no FCO. "A exemplo do FCO, os outros fundos também terão um conselho deliberativo para aumentar ainda mais os controles sobre os empréstimos", diz Albuquerque. Os fundos constitucionais são alimentados por 3% da arrecadação dos impostos de renda (IR) e sobre produtos industrializados (IPI). De 1998 a 2005, o Tesouro repassou R$ 21,156 bilhões aos fundos criados pela Constituição de 1988. Neste ano, estão previstos repasses totais de R$ 4,29 bilhões. Os recursos são administrados pela Integração Nacional em conjunto com o Basa (FNO), BNB (FNE) e BB (FCO). Até novembro de 1998, o risco dos empréstimos era só dos fundos. Depois, os bancos passaram a bancar metade do risco, ganhando 3% ao ano, ou assumiram todo o risco para cobrar 6% de taxa de administração. Pela nova norma, os bancos poderão "devolver" os 50% do seu risco aos fundos. No fundo do Nordeste, 28,6% dos recursos aplicados no setor rural estão em atraso - são R$ 3,41 bilhões. Na região, 56% das dívidas do FNE são rurais. O fundo do Norte registra R$ 1,33 bilhão em débitos rurais atrasados - 16% dos desembolsos efetivos para o setor estão vencidos. O Centro-Oeste contabiliza 5,1% de atrasos na carteira rural, mas tem R$ 240 milhões (81% do total) em dívidas vencidas. Os empréstimos via fundos constitucionais têm crescido nos últimos anos. De 2000 a 2005, houve salto de R$ 1,55 bilhão, para R$ 6,62 bilhões. Em 2005, foram aplicados R$ 4,17 bilhões no Nordeste, R$ 976 milhões no Norte, e R$ 1,47 bilhão no Centro-Oeste.