Título: Endividado, Hospital do Câncer passa por reestruturação
Autor: Carolina Mandl
Fonte: Valor Econômico, 05/04/2006, Empresas &, p. B2

Em meados do ano passado, o Hospital do Câncer, de São Paulo, percebeu que era hora de cuidar de sua própria saúde. Com dívidas, gastos e inadimplência elevados, a Fundação Antonio Prudente - mantenedora do hospital - viu que, se não agisse rápido, poderia parar na UTI. Mas não era de um especialista em saúde que a instituição filantrópica precisava. Depois de 15 anos à frente do hospital, o médico Ricardo Brentani, presidente da fundação, percebeu que um administrador de empresas deveria cumprir essa missão. "No melhor dos casos, eu era um amador bem intencionado", afirma Brentani. Para salvar o paciente, o hospital chamou Irlau Machado, ex-presidente da Medial Saúde. O trabalho do novo diretor-executivo começou pelo endividamento. No meio do ano passado, o hospital tinha R$ 15,5 milhões em dívidas que venceriam em um ano. E outros R$ 13,6 milhões no longo prazo. "Por mês, gastávamos 13% do que recebíamos para quitar as obrigações. Quase não sobrava nada para investir na operação", diz Machado. Com a revisão dos processos de compra, das cobranças e de um enxugamento do quadro de funcionários de cerca de 5% da folha de pagamento, o hospital quitou R$ 6 milhões do endividamento e alongou o prazo do restante. Em dezembro, havia R$ 5,6 milhões vencendo em até um ano e outros R$ 18,9 milhões no longo prazo, gerando um maior alívio para a instituição. No balanço de 2005, os efeitos da reestruturação também apareceram. Com uma receita líquida de R$ 148 milhões, 25% maior em relação a 2004, e custos mais baixos, o Hospital do Câncer teve um lucro de R$ 11,8 milhões ante R$ 802 mil no ano anterior. A margem bruta subiu de 10,5% para 19,9%. Mas os números mais reluzentes não significam o fim do trabalho de Machado. Agora, com o estado de saúde mais equilibrado, o diretor tem de fazer o hospital engordar. Isso porque, por ser filantrópico, 60% dos atendimentos do Hospital do Câncer precisam ser feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Só no ano passado, o déficit com essa operação foi de R$ 5,14 milhões, para uma receita de R$ 12,8 milhões. "São os atendimentos particulares que geram recursos para a prestação do serviço público", explica Machado. Apesar de representarem menos de 40% dos pacientes tratados, os doentes particulares geram mais de 90% do faturamento. Porém, com as instalações desgastadas e o enorme número de pacientes vindos do sistema público, o Hospital do Câncer tem mais dificuldade em atrair esse tipo de "cliente" pagante. Sem uma hotelaria tão atraente, há quem prefira se internar em outros lugares, como nos hospitais Sírio Libanês, Albert Einstein e Oswaldo Cruz. Do lado operacional, no entanto, apenas o Hospital do Câncer e o Instituto Nacional do Câncer, no Rio, são considerados centros de alta complexidade em oncologia pelo Ministério da Saúde. "Tecnicamente não há do que se reclamar do Hospital do Câncer porque considero ele a melhor referência. Mas, muitas vezes, os pacientes mencionam que as instalações dele não fazem jus ao plano de saúde que pagam", afirma Caio Soares, gerente-médico da Omint, operadora de saúde voltada para o público de alta renda. Para reverter esse quadro, a instituição está investindo na reforma de todos os seus quartos. Além disso, ampliará o número de leitos dos atuais 130 para 170 até o fim do ano. Ao todo, serão destinados R$ 10 milhões às melhorias. "A qualidade do hospital não é demonstrada na imagem que as pessoas têm dele. Temos que reverter isso. Como há muito atendimento feito pelo SUS, clientes particulares chegam a pensar que ele é público", explica Machado. Para este ano, o executivo prevê um faturamento de R$ 170 milhões, principalmente por causa do maior atendimento particular.