Título: Hotel em SP vira base para vítimas de vôos cancelados
Autor: Raquel Balarin
Fonte: Valor Econômico, 06/04/2006, Últimas notícias/Empresas, p. A5

A melhor maneira de entender a agonia da Varig é dar uma passada no hotel Holliday Inn do Parque Anhembi, ao lado do Sambódromo, em São Paulo. É ali que a empresa aérea vem hospedando os passageiros de seus vôos cancelados ou com atrasos superiores a quatro horas. Não é pouca gente. Cada passageiro/hóspede tem uma história para contar. Robert, um suíço casado com uma brasileira e que vive em Cuzco, no Peru, passou maus bocados no último dia 13. O casal partiu do Rio de Janeiro com as filhas Cláudia, de dois anos, e Helena, de poucos meses, logo cedo naquela segunda-feira. A previsão era de que o vôo RG 8936 faria uma escala em São Paulo, de onde partiria às 9h50 para Lima, no Peru. Na chegada a São Paulo, porém, um dos pneus da aeronave estourou, deixando alguns passageiros em princípio de pânico. Robert e família tiveram de sair do avião e esperar outra aeronave. O vôo para Lima estava lotado. O embarque foi feito com atraso. O piloto começou a fazer as primeiras manobras para decolar, mas parou. Dentro, os passageiros já brincavam com a situação da Varig. O casal Denise e Marcus, de Lajeado (RS), sentado logo à minha frente, dizia que a companhia havia cobrado três vezes a taxa de embarque no cartão de crédito de um deles, tomando todo o limite. No meu caso, o problema parecia ser dos menores. A empresa havia apenas emitido dois cartões de embarque para a mesma poltrona, obrigando os prestativos e cansados comissários de bordo a fazer uma realocação de lugares. Após uma espera de dez minutos, o comandante avisou que havia um problema no motor e que uma equipe de terra seria chamada para fazer o conserto. Entra e sai de técnicos e, depois de uma hora, a solução: o vôo seria transferido para a meia-noite e os passageiros seriam acomodados no Holliday Inn - localizado a mais de dez quilômetros dali. As malas não seriam retiradas pelos passageiros. Apenas alguns deles - entre eles Robert, a mulher e as crianças - conseguiram pegar a bagagem.

-------------------------------------------------------------------------------- Problemas se tornaram tão constantes que o Holliday Inn já tem formulários impressos para os passageiros --------------------------------------------------------------------------------

No hotel, os passageiros do vôo de Lima se juntaram aos de Lisboa, que deveria ter partido na noite do dia anterior, e a recepcionista comentava que era provável que "o pessoal de Nova York" também fosse para lá. Os "hóspedes Varig" têm direito a três minutos de ligação telefônica (local ou internacional), consumo de água do frigobar e refeições (almoço, jantar e café da manhã) até que os velhos ônibus os levem de volta ao aeroporto. Enquanto esperávamos para fazer o check-in no hotel, os hóspedes do vôo para Lisboa eram avisados que o avião não partiria mais no fim daquela tarde e, sim, à noite. Paulo, um executivo carioca que realiza um trabalho de identificação de riscos para uma companhia mineradora no Peru, contava que não era a primeira vez que ele tinha o mesmo problema com o vôo para Lima. E seu projeto no Peru iria durar pelo menos mais três meses. "Vou começar a voar pela Taca." Os problemas com vôos da Varig se tornaram tão constantes que o Holliday Inn já tem formulários impressos para que os passageiros preencham seu nome e o número do vôo na entrada do restaurante Camauê. O café está incluído na conta da Varig, mas apenas o de garrafa térmica. O expresso é pago à parte. O vôo para Lima partiu do aeroporto de Cumbica aos 30 minutos da terça-feira, dia 14 de março (o de Lisboa ainda não havia partido). O ar-condicionado falhou, algumas poltronas não reclinavam, mas Robert e a família conseguiram chegar à capital do Peru às 3h30 (5h30 em Brasília) - quase 15 horas depois do previsto. A pequena Cláudia, exausta, dormia ao lado de seu coelho de pelúcia. O Valor tentou contato ontem com o Holliday Inn para saber qual tem sido o número médio de hóspedes da companhia aérea e como a Varig tem pago as diárias, mas a assessoria de imprensa do hotel informou que não havia um porta-voz disponível.