Título: A maquiagem do PAC
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 03/06/2010, Política, p. 2

Ao apresentar dados sobre a execução do Programa de Aceleração do Crescimento, governo enfatiza que todo o cronograma será cumprido até o fim do ano, mas confirma que algumas obras ficarão prontas apenas em 2012

O 10º Balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) apresentou números inflados, maquiados e contraditórios. Um audiovisual com tons eleitorais mostrou tudo o que deu certo em cada região. Os contratempos e atrasos foram abordados apenas na entrevista coletiva. O governo anunciou que a execução financeira atingiu R$ 464 bilhões, o que corresponde a 70% do total de recursos. Mas esse valor engloba os financiamentos a pessoa física pelo programa Minha Casa, Minha Vida e pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Sem esse dinheiro, o PAC teria execução de R$ 306 milhões, ou 60% do total. A Casa Civil também sustenta que o programa será concluído até o fim do ano, embora reconheça que apenas 27% dos recursos de habitação e saneamento (R$ 58 bilhões) estarão aplicados até lá.

O governo tenta vender a ideia de que investiu muito, mas briga com os próprios números oficiais. Do dinheiro aplicado, apenas 9% (R$ 41,8 bilhões) saíram dos cofres da União. Cerca de 55% dos recursos vieram do setor privado e da poupança voluntária dos brasileiros. Outros 33% são recursos de estatais. Na área de habitação e saneamento, por exemplo, foram anunciados investimentos contratados de R$ 208 bilhões, mas 75% disso são as verbas do SBPE (leia Para saber mais) e dos empréstimos a pessoas físicas. O dinheiro não é do governo, as obras não estão sendo executadas pelo governo e o risco não é do governo. Estavam presentes no ato os ministros das Cidades, Márcio Fortes; do Planejamento, Paulo Bernardo; da Defesa, Nelson Jobim; e o ministro interino da Fazenda, Nelson Barbosa.

A ex-ministra Dilma Rousseff, ¿mãe do PAC¿ e hoje pré-candidata a presidente da República, foi lembrada pela subchefe de Articulação e Monitoramento da Casa Civil, Miriam Bechior. ¿Eu queria reafirmar o que a ex-ministra Dilma sempre dizia¿, disse a subchefe. Em seguida, enumerou benefícios do programa que é o principal trunfo eleitoral da ex-chefe. ¿Criou empregos muito acima da média do país¿, citou. Depois, lembrou que estados, municípios e o próprio governo federal tiveram que se reestruturar para enfrentar o nível de investimentos agora existentes. O próprio setor privado teve que se readaptar, recompor equipes, para fazer os investimentos. ¿O PAC tem sido um aprendizado para todo mundo¿, concluiu.

Números teimosos Na coletiva, Bechior reafirmou que o programa estará concluído até dezembro. Mais uma vez, os números teimam em desmentir a subchefe. Ele mesma reconheceu, durante o seu longo discurso, que apenas 27% dos recursos da habitação e saneamento serão aplicados até o final do governo. Nos livretos PAC dos Estados, divulgados periodicamente pela Casa Civil, todas essas obras estão detalhadas. Lá está escrito que o dinheiro seria aplicado entre 2007 e 2010. No balanço divulgado ontem, consta que a urbanização de favelas nas represas Billings e Guarapiranga, em São Paulo, uma obra no valor de R$ 873 milhões, tem 40% da execução global hoje. A conclusão está prevista para 2012. Na urbanização da Bacia do Beberibe, com remoção de palafitas e construção de habitações populares, uma obra de R$ 527 milhões, a execução está em apenas 11%. Outra que ficará para 2012.

Bechior foi questionada sobre os atrasos em obras de grandes usinas hidroelétricas. Disse que não há atraso algum. No livreto distribuído ontem, há a promessa de investimento de R$ 5,4 bilhões na hidroelétrica de Jirau (RO) entre 2007 e 2010. Mais R$ 3,9 bilhões serão aplicados até 2013. Mas o mesmo documento diz que apenas 16% do empreendimento foram executados até agora. E a meta até agosto é executar 20% do total. Ou seja, para cumprir o que está escrito, o governo terá que executar mais R$ 3,5 bilhões na obra nos últimos quatro meses do ano.

A subchefe também afirmou que ¿é possível¿ que o trem-bala entre Rio e São Paulo fique pronto para as Olimpíadas de 2016. A obra tem orçamento de R$ 34,6 bilhões, sendo previstos investimentos de R$ 1,8 bilhão até o final deste ano. Mas o edital de licitação ainda é analisado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O livreto da Casa Civil diz que é esperada uma manifestação do tribunal até o final de junho. Assim, o leilão seria realizado no segundo semestre. As obras teriam início do período eleitoral, a dois ou três meses do fim do governo.