Título: Promessa de fechar Doha em 2010 cria problema para Lula
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 08/07/2009, Especial, p. A14

Os líderes reunidos a partir de hoje na Itália decidiram se comprometer a concluir em 2010 a Rodada Doha de liberalização comercial, o que complica o cenário político interno para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O Brasil sempre esteve à frente dos que querem completar a negociação global de abertura agrícola, industrial e de serviços, pois sabe que tem mais a ganhar do que a pagar. Mas, nas últimas semanas, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, passou a dizer que sentia "calafrios" quando ouvia sugestões de concluir Doha no ano que vem, quando o Brasil estará em plena campanha eleitoral.

Entre os principais países da negociação de Doha, só o Brasil tem eleições gerais no segundo semestre de 2010. O Reino Unido deve realizar eleições no início do próximo ano. Os EUA terão eleições legislativas em novembro de 2010, mas hoje parece muito improvável que a oposição republicana consiga ampliar sua bancada no Congresso americano (controlado pelos democratas), mesmo com negociações comerciais em andamento.

Amorim sabe que, para a negociação ser fechada na Organização Mundial do Comércio (OMC), será preciso fazer concessões, abrindo mais o mercado brasileiro para produtos manufaturados estrangeiros. E, em período eleitoral, qualquer concessão provoca desgaste, como ocorre em qualquer país.

O ministro insiste que o Brasil já pagou demais pela rodada, mas não fecha a porta para atender a demandas específicas, como por exemplo cortes de determinadas tarifas de importação de interesse dos EUA e da União Europeia (UE), dependendo da contrapartida que receber.

Mas a estratégia brasileira era de tentar arrancar avanços de Doha ainda neste ano, deixando 2010 para os aspectos jurídicos que são necessários para fechar esse tipo de compromisso.

Agora, oficialmente, o presidente Lula terá de reiterar e mesmo conclamar vitória pelo engajamento dos líderes, o primeiro concreto nos últimos tempos. O discurso brasileiro tem sido de que a recuperação da economia mundial passa pela retomada do comércio global, que está em queda livre desde o fim do ano passado.

Os líderes reunidos em Áquila vão mandar os ministros "explorarem" maneiras de acelerar a negociação. No começo de setembro, haverá uma reunião ministerial em Nova Déli, na Índia, antecedendo o encontro de cúpula do G-20 financeiro dos EUA.

Resta que, primeiro, os chefes de Estado já fixaram outras datas no passado, que acabaram não sendo respeitada. E, segundo, persistem os problemas de resistência dos países. A recusa da Argentina em flexibilizar sua área industrial pode agora acabar por não ser desagradável para o governo Lula no ano que vem.