Título: Crise esvazia-se e fica o impasse
Autor: Costa , Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 09/07/2009, Política, p. A5

Fracassou ontem negociação de líderes partidários para por um fim definitivo à crise do Senado, restaurar a autoridade de seu presidente, José Sarney, permitir a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias e a instalação da CPI da Petrobras.

As negociações serão retomadas, mas estão num impasse: PSDB e DEM só votam a LDO se a CPI for instalada, mas o PT resolveu que ainda vai tratar com outros líderes, antes decidir o que fazer. O impasse deve acabar no Supremo Tribunal Federal.

Pela atual relação de forças, o governo tem oito integrantes na CPI da Petrobras, contra três da oposição. Mas o Palácio do Planalto não quer que a comissão seja instalada. O recesso do Senado está previsto para a próxima semana, mas os senadores não podem sair de férias sem votar a LDO, lei que também interessa ao governo aprovar logo.

Em negociação com o PSDB, o PMDB se dispôs a permitir a instalação da CPI (seus integrantes já foram designados, mas não aparecem para a abertura). Em troca, os tucanos se comprometiam com a votação da LDO e a não ingressar no STF com um pedido para que o tribunal determinasse a instalação da comissão de inquérito.

O STF já mandou o presidente do Senado indicar integrantes de CPIs que não foram designados pelos líderes. Há dúvida sobre se é possível ordenar um senador a comparecer à sessão. Mas consultores do Senado avaliam ser possível o Supremo determinar a troca dos atuais integrantes por outros. Neste caso, o governo teria dificuldade para compor um grupo tão alinhado como o atual, que garantiria o controle da CPI, se esta for instalada.

Além disso, o PMDB levaria uma vantagem extra: deixou de ser refém do PT (que, enquadrado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, recuou no pedido de afastamento do presidente do Senado), ao mesmo tempo em que tornaria o PT refém na CPI da Petrobras.

A negociação não avançou: o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), disse que seu partido não estava em condições de tratar do início das investigações e pediu mais tempo para negociar com governistas. PSDB e DEM, por seu turno, avisaram que não tem LDO sem CPI e prometeram protocolar hoje mandado de segurança no STF para garantir investigação na estatal.

A oposição protestou: "A palavra empenhada não foi cumprida", declarou Álvaro Dias (PSDB-PR), autor do requerimento da CPI. "Já fizemos todos os gestos de reconciliação", disse o líder do DEM, Agripino Maia (RN). Mas a oposição se comprometeu a votar Medidas Provisórias que estão na pauta.

O PT tenta impedir o início da CPI e conta com o apoio do PMDB para não deixar que a oposição prossiga. "É importante o bloco governista estar junto nesse processo", afirmou o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), com amplo domínio sobre a CPI.

Apesar das críticas dos senadores do PSDB e do DEM, integrantes da base aliada reclamam que o PSDB pede a investigação do governo federal, mas impede apurações de supostas irregularidades no Estado de São Paulo e em Curitiba, onde são governo.

A crise no Senado está sendo tratada como um pacote só. O PT foi rápido na manobra para ganhar tempo na negociação para a instalação da CPI, mas, enquadrado por Lula - que apoia a manutenção de Sarney no cargo - recuou formalmente ontem da pressão para que o presidente do Senado se afastasse durante as investigações.

Em nota da bancada, o PT assumiu posição dúbia para agradar tanto a Lula quanto à opinião pública: senadores reiteraram pedido de afastamento de Sarney, sem pressioná-lo. Depois de reunião de mais de duas horas de toda a bancada, o PT sugere, na nota, que "num gesto de grandeza e de garantia à credibilidade das investigações", Sarney se licencie. Mas admite que "a licença é uma decisão a ser tomada pelo senador".

Na nota, os petistas negaram que foram pressionados pelo presidente a "abdicar de suas posições individuais". Dessa forma, o PT reiterou a postura de pedir o afastamento do pemedebista para garantir a lisura das investigações, mas não contrariou o presidente Lula, que defende a preservação da aliança com o PMDB para garantir a governabilidade e o aliado para a eleição presidencial, em 2010.

Os petistas reconhecem que sem pressionar Sarney dificilmente o pemedebista se licenciará. Depois de reunir-se com Sarney junto com a bancada petista, Eduardo Suplicy (PT-SP) relatou nova conversa com o pemedebista, na terça-feira, de mais de 15 minutos, na qual Sarney disse que "não é justo" que se peça o afastamento do cargo e que não aceitaria a sugestão.

A posição do PT agradou aos pemedebistas. Para o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), a decisão de pedir o afastamento, mas sem pressionar Sarney é a solução "possível" e "não muda em nada" a relação entre os dois partidos. "A nota do PT passa de gregos a troianos, por espartenses, atenienses e persas", ironizou o pemedebista, referindo-se aos comentários gerais feitos pelos petistas para o enfrentamento da crise no Legislativo, sem ataques diretos a Sarney.

A pressão pelo afastamento de Sarney da presidência do Senado diminuiu sensivelmente e lideranças do PSDB, DEM e PT já não ocupam mais a tribuna da Casa para pedir a licença do pemedebista. Ontem, até mesmo o senador Pedro Simon (PMDB-RS), um dos mais críticos a Sarney e às denúncias de mazelas na Casa, disse sentir-se também culpado pelos problemas do Senado e declarou: "Quem não tiver culpa atire a primeira pedra. Eu não tenho autoridade para atirar pedra em ninguém. Eu tenho culpa", disse, no plenário. "Acho que o que temos de fazer não é buscar culpado. O que nós temos que fazer é buscar o que fazer". Simon, entretanto, não deixou de pedir pelo afastamento de Sarney até que todas as denúncias envolvendo o presidente do Senado sejam apuradas.

Simon, junto com um grupo suprapartidário formado por senadores como José Nery (P-Sol-PA), Sérgio Guerra (PSDB-CE) e Cristovam Buarque (PDT-DF) e Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) tenta conseguir assinaturas de presidentes de partidos para pedir ao Ministério Público Federal a investigação de irregularidades na Casa. Os senadores, entretanto, não personificaram as denúncias em Sarney.