Título: Regras para as eleições de 2010 confrontam linha de ação do TSE
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 10/07/2009, Política, p. A5

A nova minirreforma eleitoral, aprovada anteontem pela Câmara dos Deputados, está na contramão das decisões recentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e deve enfrentar fortes restrições na Corte, caso o texto seja aprovado sem modificações pelo Senado.

O projeto foi apresentado para regulamentar o uso da internet nas eleições, mas possui uma série de medidas que facilitam a vida de políticos com problemas na Justiça Eleitoral e rompem com o movimento de moralização iniciado pelo TSE nos últimos anos. Técnicos do tribunal identificam pelo menos quatro itens classificados por eles como "escândalos" na minirreforma.

O primeiro está no fato de o texto aprovado na Câmara permitir que políticos declarados inelegíveis em decisões tomadas por Tribunal de Contas possam obter registro para se candidatarem. Pelas regras atuais, o político que teve suas contas rejeitadas fica inelegível por cinco anos e os cassados por oito anos. O projeto permite que eles sejam novamente candidatos utilizando-se de todos os meios permitidos para campanha eleitoral, como uso dos horários políticos na televisão e no rádio e ter seu nome mantido na urna eletrônica..

O segundo ponto polêmico é que o texto da Câmara modifica os requisitos para que o candidato consiga a certidão de quitação eleitoral. Hoje, essa certidão é necessária para que o político se candidate e, em decisões recentes, o TSE concluiu que ela só pode ser obtida com a aprovação da prestação de contas de campanhas anteriores. Pela minirreforma, basta que o candidato apresente as suas contas para receber a quitação. Se o texto passar pelo Senado, ele não vai mais ter de esperar pela aprovação das contas de campanha para ter a certidão.

"A nova lei libera o candidato da aprovação da prestação de suas contas", disse o juiz Marlon Reis, que preside a Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais, uma das 40 instituições que compõem o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). "É um escândalo", lamentou o magistrado.

O terceiro ponto polêmico do projeto de lei aprovado ontem na Câmara é que a minirreforma fixa o prazo de um ano para a Justiça Eleitoral julgar pedidos de cassação de mandato. O risco, neste ponto, é de o político protelar o julgamento com recursos à Justiça e, após um ano, ser absolvido pelo mero decurso de prazo do processo.

O quarto "escândalo" do projeto, na opinião de técnicos do TSE, é visto como um dos mais graves: a permissão de doações ocultas. Atualmente, os candidatos não podem receber dinheiro para campanha de concessionárias de serviço público. O texto da Câmara possibilita essas doações para os partidos. Com isso, os partidos podem redirecionar essas verbas para os políticos. "O projeto permite esse tipo de triangulação em que empreiteiras enviam dinheiro para partidos e eles reenviam aos candidatos", acusou Marlon Reis. "É uma tragédia", disse.

Para o juiz, a regulação do uso da internet não é o fundamental no texto da Câmara. "A questão da internet é importante, mas o projeto toca em assuntos sérios que não podem passar despercebidos". O texto também limita até o poder de o TSE editar resoluções a respeito da eleição. Ele dá 5 de março como prazo final para o tribunal regulamentar regras às eleições do ano que vem.

A expectativa é de que, se aprovada, essa nova minirreforma eleitoral seja contestada junto ao TSE e ao Supremo Tribunal Federal e, em ambos os casos, vários artigos devem ser literalmente derrubados.