Título: Texto afrouxa limites e facilita atuação de partidos e candidatos
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 10/07/2009, Política, p. A5

Sem convergência em torno de uma reforma ampla, considerada essencial ao aprimoramento dos sistemas político, eleitoral e partidário do país, os deputados conseguiram unidade para aprovar projeto de lei bem mais restrito, que beneficia partidos, facilita candidaturas, impõe limites à atuação da Justiça Eleitoral, regulamenta o uso da internet em campanhas e normatiza condutas corriqueiras - como circulação de carro de som e tamanho de faixas de propaganda -, muitas vezes fontes de conflitos judiciais.

O favorecimento a partidos e candidatos está espalhado em vários dispositivos ao longo do texto, assim como a tentativa de reduzir a atuação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na normatização do processo eleitoral. "O projeto revela a tensão do Congresso com a Justiça Eleitoral", afirma o deputado Flávio Dino (PC do B-MA), que coordenou a elaboração da proposta.

O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), sempre deixou clara a intenção de devolver o poder normativo ao Congresso. "O Legislativo deixa um vácuo e os tribunais são obrigados a preencher esse vácuo, expedindo resoluções", diz.

Com disposição de contestar a Justiça Eleitoral, os deputados buscam, com o projeto, legalizar uma prática adotada hoje - mas não incluída em lei -, que o TSE sinalizou a intenção de proibir: a possibilidade de os partidos receberem doações de pessoas físicas e jurídicas e distribuírem os recursos por diversas candidaturas. É uma forma de o doador permanecer oculto.

Também foi incluída autorização para os partidos assumir débitos de campanha não quitados até a data da apresentação de contas. Pelo projeto, se o partido responder pela dívida solidariamente, as contas do candidato não podem ser rejeitadas por causa da existência do débito. Esse procedimento era usual até as eleições de 2006, mas foi restringido pelo TSE.

Foi definida uma data final para que as resoluções baixadas pelo tribunal vigorem na eleição seguinte: 5 de março do ano eleitoral. Além disso, os deputados obrigam que a Justiça Eleitoral dê prioridade à tramitação dos pedidos de direito de resposta e das representações por propaganda irregular em rádio ou televisão. E estabelecem uma série de prazos para decisões da Justiça Eleitoral, hoje inexistentes, como para julgamento de registro de candidaturas.

Para afastar insegurança jurídica em torno de candidaturas, foi incorporada ao projeto uma jurisprudência do TSE: candidato considerado inelegível tem direito de disputar a eleição se recorrer e, ao longo da campanha, tiver seus direitos restabelecidos por instância superior. Esse candidato com registro subjudice poderá fazer campanha normalmente.

Multas eleitorais são reduzidas (o valor máximo é reduzido dos atuais R$ 50 mil para R$ 30 mil). A suspensão de novas cotas do Fundo Partidário - sanção imposta em caso de falta ou desaprovação de prestação de contas - passa a ser aplicada de forma proporcional e parcelada por até 12 meses. Hoje, a lei só fala em suspensão, sem prever abrandamento.

"Legislamos pensando no umbigo", resumiu ontem o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) sobre a proposta aprovada na noite anterior, que agora será encaminhada à votação no Senado. Para que as novas regras estejam em vigor já nas eleições de 2010, o projeto tem de estar aprovado e sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no máximo até um ano antes das eleições, que ocorrerão no dia 3 de outubro de 2010.

Assim como os deputados, os senadores têm especial interesse na regulamentação do uso da internet para propaganda eleitoral e para captação de recursos. Essa é a grande novidade do projeto, que também define quais atividades podem ser exercidas pelos candidatos antes do início da propaganda eleitoral, para que não sejam punidos. A expectativa é de aprovação no Senado, com alterações no texto - o que obrigará retorno à Câmara.

As regras do projeto para a propaganda eleitoral na internet provocaram polêmica. Os provedores de internet e as empresas de comunicação social têm que seguir as regras previstas para a mídia impressa em seu conteúdo próprio. Os candidatos não podem ter tratamento desigual. Já os debates na internet têm que seguir as normas dos debates em rádio e televisão. Essas normas receberam críticas por serem consideradas restrições ao uso da internet.

"Não existe mídia totalmente desregulamentada", justifica Dino. Segundo ele, eventuais alterações no texto, para tornar mais clara a intenção de dar "equidade" aos candidatos, podem ser feitas. Para o presidente da Câmara, os senadores também podem fazer "ajustes" para aperfeiçoar esse ponto, que considera o maior avanço do projeto. "A internet é uma ferramenta dos tempos modernos. Não podemos ignorar a sua utilização", diz.