Título: Acordo permite venda para outros países após 2023
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 27/07/2009, Brasil, p. A3

As autoridades paraguaias veem no acordo firmado entre os presidentes Fernando Lugo e Luiz Inácio Lula da Silva, no sábado, o começo da integração dos sistemas de geração de energia entre Paraguai e Brasil. Mas as demandas paraguaias e a resistência do Brasil ameaçaram o acordo, na sexta-feira, quando, irritados, os negociadores brasileiros chegaram a abandonar a mesa de negociações, na hora do almoço. "Os números não estão fechando", comentou o presidente Fernando Lugo, ao falar à imprensa após o encerramento da reunião do Mercosul, na tarde de sexta-feira.

Segundo uma autoridade próxima ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que irritou os brasileiros foi a exigência de explicitar, na declaração a ser assinada pelos presidentes, números que seriam ainda discutidos pelo grupo de trabalho formado para decidir como será feita a venda da energia no mercado livre do Brasil. Numa indicação do estado de espírito do governo Lugo, o diretor paraguaio de Itaipu, Mateo Balmelli, um dos autores da proposta da venda no mercado livre e considerado mais atento às ponderações do Brasil e empenhado no acordo, foi excluído da mesa de negociações.

O chefe dos negociadores, o vice-ministro de Relações Exteriores, Jorge Lara Castro, considerado da linha dura entre os negociadores, comemorou o acordo como a "recuperação da soberania energética" do país. "O importante é que em 2023 haverá uma abertura e não está bloqueada inclusive a possibilidade de vender (energia de Itaipu, pelo Paraguai) a terceiros países", disse Lara Castro, no sábado, após o anúncio do acordo, enquanto Lula e o ministro de Relações Exteriores brasileiro, Celso Amorim, deixavam o palácio de governo paraguaio sem atender a imprensa.

A menção à possibilidade de venda de energia de Itaipu a terceiros países, mesmo vaga e vetada antes de 2023, foi uma derrota dos negociadores brasileiros, que tentaram evitá-la e, pela primeira vez, admitem o tema em um documento oficial, de "forma histórica" segundo comemorou Lugo. Os paraguaios também tiveram de ceder ao aceitar que dependerão de aprovação do Congresso as decisões sobre mudanças na tarifa e na venda da chamada energia excedente de Itaipu (a que o Paraguai tem direito, mas, sem uso local, é vendida ao Brasil).

Já houve, no passado, correção dos valores da tarifa sem consulta ao Congresso, mas o governo brasileiro argumentou que, desta vez, as mudanças exigiam o aval parlamentar. É uma tese polêmica no Paraguai, e mesmo técnicos brasileiros admitem que haveriam fórmulas para restringir a decisão ao Executivo.

Lugo apresentou o acordo como o cumprimento de suas promessas eleitorais; e o resultado das negociações foi bem recebido por políticos paraguaios de diversas tendências. O primeiro a parabenizar o presidente foi o presidente do Congresso, Miguel Carrizosa, do partido oposicionista Pátria Querida (mas eleito com apoio de partidários de Lugo, em uma das peculiaridades da política local). Confiante na decisão do Congresso, Carrizosa aproveitou para cobrar o uso do dinheiro adicional de Itaipu em obras de infraestrutura no país. O ex-presidente paraguaio Juan Carlos Wasmosy, do partido Colorado, de oposição, também fez questão de felicitar Lugo pela negociação. Os críticos ressaltaram principalmente a incerteza provocada pela necessidade de aprovação das decisões pelo Congresso brasileiro. (SL)