Título: Petrobras admite que sucesso não chega a 100% em todo pré-sal
Autor: Schüffner , Cláudia
Fonte: Valor Econômico, 29/07/2009, Brasil, p. A13

A Petrobras reconheceu ontem que a taxa de sucesso exploratório no pré-sal não é de 100%, ao contrário do que vinha sendo dito reiteradamente pela empresa e pelo governo. Ontem, ao comentar matéria do Valor, a companhia explicou que no relatório anual enviado para o órgão regulador de mercado de capitais americano - a US Securities and Exchange Commission (SEC) - informava que sua taxa de sucesso era de 87%. O percentual se refere a 30 poços perfurados em todo o pré-sal, e não apenas na bacia de Santos, até dezembro de 2008.

A nota da estatal e outra nota curta da Agência Nacional de Petróleo (ANP) foram as únicas referências da empresa ou do setor público brasileiro às informações apresentadas pelo Valor e que tiveram como base o Banco de Dados de Exploração e Produção (BDEP) da ANP. Pelo levantamento da reportagem, nove de 28 poços perfurados foram classificados como secos ou como produtores subcomerciais de petróleo e gás.

Dos nove poços citados, a estatal e a ANP fizeram referência específica a apenas um deles, o de Corcovado-1. Em nota de três linhas, a ANP, responsável pelo banco de dados do BDEP, simplesmente informou que o banco de dados estava errado. Textualmente, ela disse que "a informação sobre o poço 6BG6P-SPS que consta no sítio do BDEP, como sendo poço seco e sem indício de petróleo, está equivocada. A informação correta (...) pode ser encontrada no sítio da ANP, na tabela Indícios de Hidrocarbonetos Constatados (...)". Na reprodução ao lado consta a informação encontrada pelo Valor no site do BDEP e que agora foi corrigida pela agência responsável pelas informações do setor de petróleo e gás do país.

Na sua nota, a Petrobras faz referência a uma taxa de sucesso na "comprovação de presença de hidrocarbonetos", o que pode ser traduzido como um sucesso do ponto de vista geológico, mas que não significa, necessariamente, um sucesso comercial. Tanto é que o Valor encontrou resultados desapontadores, com notificações de poços secos, subcomerciais ou apenas portadores de hidrocarbonetos entre os perfurados pela Petrobras no pré-sal. No jargão técnico definido pela portaria nº 76 da Agência Nacional de Petróleo (ANP) um poço portador é aquele "(...) incapaz de permitir a produção em quantidades comerciais, independentemente das facilidades de produção na área". Já o subcomercial é aquele "cuja produção de petróleo e ou gás é considerada conjunturalmente antieconômica à época de sua avaliação".

Entre os poços perfurados pela Petrobras no pré-sal e cujas informações estão disponíveis no Banco de Dados da ANP, existe pelo menos um classificado como portador (ver reprodução ao lado). Trata-se de Parati (1-BRSA-329D-RJS) que fica no bloco BM-S-10 da bacia de Santos onde a estatal é operadora tendo como sócias a BG e a portuguesa Partex. Uma perfuração em Roncador - onde a Petrobras tem um campo gigante no pós-sal - a uma profundidade de 4.964 metros informa que se trata de um "produtor subcomercial de óleo". Pela profundidade tudo indica que o objetivo da companhia era testear o pré-sal na área.

Resultado quase idêntico foi encontrado no poço Baleia Franca (6-BRSA-639-ESS), no pré-sal da bacia do Espírito Santo, onde a perfuração a uma profundidade de 4.919 metros teve como resultado que ele é "produtor subcomercial de óleo e gás". Todas essas informações são dados públicos disponíveis no BDEP, que organiza, administra, mantém e disponibiliza "todos os dados técnicos gerados pelas atividades de exploração e produção de petróleo no Brasil", segundo informa a página na internet.

A Petrobras também não deu entrevistas sobre os dados dos demais poços que constam no site do BDEP e que são identificados como de resultados pouco animadores. Na nota, a estatal informou que no pré-sal da Bacia de Santos (sem incluir a área da Bacia de Campos) a taxa de sucesso se mantém em 100% . Esta é uma referência ao resultado da perfuração de onze poços operados por ela, que incluem Tupi, Iara, Iracema, Parati, Carioca, Iguaçu, Bem-Te-Vi, Caramba, Abaré, Guará e Júpiter. A classificação deles no BDEP reflete esse sucesso exploratório. Iara (1-BRSA-618-RJS), por exemplo, consta como "descobridor de campo com óleo". É o mesmo resultado de Caramba (1-BRSA-56A), enquanto Bem-Te-Vi (1- BRSA-532A SPS) registra no resultado que se trata de "descobridor de nova jazida com óleo".

Diante da informação da ANP de que os dados sobre Corcovado ( 6-BG-6P-SPS) no BDEP estão errados, o Valor tentou, sem sucesso, conversar com diretores da agência, que passaram toda a tarde de ontem em reunião, justamente para entender como a informação de "poço seco" foi parar no site alimentado pelo agência. Nenhuma explicação foi transmitida à reportagem.

A BG reiterou, em nota, que o poço Corcovado-1 (6-BG-6P-SPS) "mostrou indícios de hidrocarbonetos", fato anunciado pela companhia dia 8 de abril de 2009. "Este resultado foi devidamente informado à ANP, conforme os procedimentos vigentes e a perfuração do poço Corcovado-2 ainda não está concluída e, portanto, não podemos comentar a respeito". Hoje a companhia inglesa fará uma teleconferência e os analistas devem pedir mais informações sobre esses resultados.

Ontem o mercado reagiu mal às informações de que a área do pré-sal pode ser menos promissora do que a expectativa, ainda que a área continue a ser considerada a maior descoberta do setor nos últimos anos. Em relatório, o Deutsche Bank afirma que as novas informações "lançam uma sombra sobre o potencial das áreas do pré-sal e portanto questiona a necessidade de mudança na regulamentação atual".

O Credit Suisse ressalta que o "fator de sucesso" no pré-sal continua bem acima da indústria e alguns poços secos são normalmente esperados. Mas o analista Emerson Leite frisa que "apesar disso, o desapontamento em relação ao BM S-22 e pontos de interrogação sobre outros poços, incluindo Corcovado, sugerem que alguma cautela é necessária e que qualquer superexpectativa deve ser, de algum modo, moderada".

Confirmando que o Brasil tem reservas promissoras, a Repsol comunicou ontem que encontrou petróleo "muito leve e gás" no poço Vampira, perfurado no BMS-48, na Bacia de Santos, há pouco menos de 200 quilômetros da costa do Estado de São Paulo e a 140 metros de profundidade, portanto, fora do pré-sal. A empresa tem como sócios Petrobras (35%), Woodside (12,5%) e Vale (12,5%).