Título: Sob ameaça do PMDB, tucanos protocolam três representações
Autor: Agostine , Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 29/07/2009, Política, p. A15

Apesar das ameaças de retaliação por parte do PMDB, o PSDB protocolou ontem três representações por suposta quebra de decoro parlamentar contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Casa. A bancada pemedebista quer transformar o ato do PSDB em crise institucional entre os partidos. Pretende submeter à Executiva Nacional a decisão de pedir abertura de processo contra o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

O líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), afirmou ao presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), em telefonema na véspera, que o gesto iria levar a Casa à "radicalização". Mesmo assim, pesou na decisão do PSDB de pedir abertura de processo disciplinar contra Sarney a expectativa de colher dividendos eleitorais em 2010. Para os tucanos, qualquer desfecho - até mesmo o arquivamento da representação - obrigará o governo a se expor na defesa de Sarney, resultando em desgaste à pré-candidatura da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) à Presidência da República.

"Se o PSDB está transformando o problema do Senado em questão partidária, o PMDB também vai levar", afirma o senador Wellington Salgado (PMDB-MG). Para o mineiro, que integra o Conselho de Ética e é dos senadores mais atuantes na defesa do PMDB, as denúncias existentes contra Virgílio são "dez vezes maiores" que os fatos que atingem o presidente do Senado. "Essa decisão (de propor representação contra o senador Sarney) partiu de alguém de dentro do PSDB que quer derrubar Virgílio da liderança. É suicídio", afirmou.

A presidente do PMDB em exercício, deputada Iris de Araújo (GO), admitiu que o assunto já está sendo discutido. Virgílio disse não temer processo. "Não só não tenho medo como vou arrasá-los", afirmou. O líder tucano foi acusado de manter funcionário fantasma em seu gabinete e ter pedido ao então diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, três mil e 300 euros para pagamento de despesas em Paris, em 2005.

A cúpula do DEM decide na terça-feira se também propõe processo por quebra de decoro contra Sarney. A proposta será do líder, José Agripino (RN). Para ele, utilizar ato secreto configura quebra de decoro. Se o DEM seguir o PSDB, estará na mira do PMDB. "O DEM é dono da primeira secretaria há muito tempo. Todos os pagamentos foram efetuados pelo DEM", lembra o pemedebista Salgado. Ele resume o clima em que a Casa se transformará: "Se o PMDB entrar na briga, vai ser o caos."

O PSDB protocolou três representações contra Sarney, nas quais afirma que a "imagem do Senado vem sendo enodoada nos últimos meses por inúmeras denúncias" envolvendo o pemedebista. Na primeira, o presidente d Senado é acusado de favorecimento ilegal da empresa de um neto, José Adriano Cordeiro Sarney, na operação de empréstimos consignados a servidores do Senado. A segunda representação trata da suposta utilização, pelo senador, de 18 atos secretos para se favorecer, direta ou indiretamente, ou beneficiar parentes.

A terceira representação pede investigação da denúncia de participação do senador no suposto desvio de recursos públicos pela fundação José Sarney. São citadas reportagens sobre suspeitas de irregularidades em transferência de recursos públicos da Petrobras para a fundação. No mesmo documento, Sarney é acusado de "faltar com a verdade" ao afirmar, em plenário, não ter responsabilidade administrativa na fundação. Para o PSDB, todos os atos configurariam quebra de decoro parlamentar.

Sarney já é alvo de uma representação do PSOL, que o acusa de quebrar o decoro parlamentar por ter sido um dos beneficiários dos atos secretos identificados pela direção do Senado ao longo dos últimos 14 anos. O partido, presidido pela ex-senadora e vereadora Heloísa Helena (Maceió), deve protocolar nova representação hoje. Dessa vez, as denúncias serão sobre omissão de propriedade à Justiça Eleitoral, desvio de recursos da fundação e de mentir ao dizer na tribuna do Senado não ter responsabilidade pela administração da fundação.

A próxima reunião do conselho está marcada para o dia 4. O presidente, Paulo Duque (PMDB-RJ), tem a prerrogativa de arquivar ou determinar abertura do processo. Sendo aberta a investigação, Sarney será notificado e, após sua defesa, um relator será sorteado. Para o PSDB, a opção por três representações em vez de uma só é estratégica: dá alguma chance de um senador da oposição ser sorteado.

Os tucanos acham que dificilmente Duque dará prosseguimento às representações. Da decisão do presidente, cabe recurso ao plenário do conselho - que foi constituído com ampla maioria de integrantes favoráveis a Sarney (10 a 5). A aposta do PSDB é que a operação de salvamento cause danos a Lula e Dilma.

Segundo tucanos, pesquisa mensal feita pelo Instituto Análise, de São Paulo, com o objetivo de orientar a atuação parlamentar da oposição, mostrou pela primeira vez pequena queda na popularidade de Lula e nas intenções de voto de Dilma. Trata-se de amostragem nacional, pouco representativa, segundo os próprios tucanos. Mas, para eles, pode sinalizar uma tendência - que seria reflexo do desgaste causado pelo apoio explícito do presidente a Sarney.