Título: Acordo polêmico com o Vaticano passa na Comissão de Relações Exteriores
Autor: Agostine , Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 13/08/2009, Especial, p. A20

A Câmara está prestes a aprovar um acordo entre o governo brasileiro e o Vaticano assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em novembro de 2008. Apesar do protesto de igrejas cristãs tradicionais, evangélicos, ateus e até mesmo entidades católicas que defendem o Estado laico, a Comissão de Relações Exteriores da Câmara aprovou ontem o texto.

O acordo segue para três comissões, mas, como corre em regime de urgência, pode ser votado no plenário imediatamente. Houve acordo entre os líderes da Casa para que o texto fosse apreciado no plenário assim que passasse pela Comissão de Relações Exteriores. O texto precisa passar pelo Senado.

O documento levou mais de um ano para ser costurado. Ele trata de assuntos jurídicos e outros temas, como ensino religioso público e casamento. Segundo a CNBB, o acordo reconhece a personalidade jurídica da Igreja Católica no país.

Deputados da bancada evangélica dizem que é difícil evitar a aprovação. "A Igreja Católica tem muita força no Congresso e toda a tramitação ocorre de forma quase secreta. Estamos indignados", disse o deputado e pastor Pedro Ribeiro (PMDB-GO), da Assembleia de Deus.

O Colégio Episcopal da Igreja Metodista opôs-se à aprovação por considerar que o acordo fere o artigo 19 da Constituição - que veda relações de dependência ou aliança entre a União e igrejas. Outras denominações citam a garantia constitucional de que não pode haver "distinção ou preferência entre brasileiros".

Entre os deputados contrários ao acordo, o principal argumento é a manutenção do Estado laico. "O Estado brasileiro é democrático e fomenta a liberdade religiosa, inclusive no que se refere ao direito de crer ou de não crer", disse Ivan Valente (PSOL-SP), que votou contra.

Segundo o presidente Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos, Daniel Sottomaior, a concordata é "um instrumento de evangelização às custas do Estado e de todos os cidadãos brasileiros". Para ele, a linguagem do texto dá impressão de que não há mudanças. Sottomaior cita o artigo sobre o casamento, que abriria espaço a que a Justiça passe a ser obrigada a aceitar sentenças de anulação matrimonial do Vaticano.

Outro artigo polêmico, levantado pelo professor da UFRJ Emerson Giumbelli, trata do ensino religioso público, e insinuaria maior pertinência d a religião católica. Para a Igreja Católica, o acordo organiza questões trabalhistas, como o vínculo empregatício de ministros ordenados - há casos de padres que, ao deixar o sacerdócio, buscam indenização. O mesmo ocorre com voluntários. Em defesa do acordo, Francisco Borba Ribeiro Neto, do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP, diz que o acordo "é até tímido, genérico demais".